O risco de disrupção no fornecimento de crude e gás a partir do Médio Oriente, região que produz perto de 35% do crude consumido em todo o mundo e cerca de 31% do gás natural, é evidente se as coisas resvalarem para um conflito em larga escala.
E isso é agora mais provável que nunca, como o mostra a forma como os mercados têm vindo a integrar o risco nos gráficos, pouco a pouco, sendo que esta sexta-feira tudo parece ter ficado mais claro com o barril de Brent a disparar para os 78,47 USD logo pela manhã cedo.
Neste cenário encontram-se ainda evidências de que a resistência ao pânico tem crescido nos mercados, porque esta escalada nos gráficos do negócio da energia não tem uma ligação "umbilical" com o que se passa no terreno.
Isto, porque só cerca de três dias após o flamejante ataque com misseis balísticos hipersónicos iranianos a Israel é que os mercados se sobressaltaram repassando o risco para os preços do barril...
Ao que indicam as análises disponíveis nas agências de notícias económicas e nos sites especializados, após o ataque iraniano, mesmo este tendo demonstrado novas vulnerabilidades nas capacidades da defesa antiaérea israelita, em Telavive emerge uma imparável necessidade de recuperar o orgulho perdido com uma resposta "adequada" ao Irão.
O problema é que em Teerão, o Governo do Presidente Masoud Pezeshkian já avisou que se Israel se atrever a ripostar com ataques em solo iraniano, o Irão vai lançar sobre o Estado hebraico uma ainda mais forte vaga de misseis hipersónicos sobre os quais não há defesa possível.
E se Israel atacar o Irão, antes de atingir o seu manancial nuclear, desferirá os primeiros golpes na infra-estrutura petrolífera iraniana, que actualmente fornece perto de 3,5 milhões de barris por dia aos mercados internacionais.
Ora, se tal suceder, a forma mais fácil de Teerão se vingar, é, além de atacar os interesses norte-americanos, o aliado maior de Israel, e fornecedor sem paralelo de armamento a Telavive, no sector petrolífero da região, é interromper o Estreito de Ormuz, por onde passam perto de 20 milhões de barris por dia (mbpd) ou 30% do crude queimado diariamente e todo o mundo.
E o que os mercados sabem é que se os EUA, com o apoio do Reino Unido e da França, com vastos meios navais na região, e bases aéreas na Arábia Saudita, EAU, entre outras localizações, como Qatar e no Bahrein, não conseguiram impedir os ataques dos Houthis do Iémen aos navios que atravessam o Estreito de Bab al-Mandab, que liga o Mar Vermelho/Canal do Suez ao Oceano Índico, ainda menos poderão impedir o Irão, basta olhar para um mapa, de fechar Ormuz.
E é, especialmente por isso, que o barril de Brent, que é a referência principal para as ramas exportadas por Angola, está esta sexta-feira, 04 ,a cavalgar os gráficos dos mercados internacionais.
A ponto de perto das 11:00, hora de Luanda, ter chegado aos 78,55 USD, e a Goldman Sachs admite mesmo que se houver esse ataque israelita ao Irão o barril vai subir rapidamente mais 20 USD em cima dos preços actuais.
Segundo a Reuters, o Presidente Joe Biden terá contribuído com pelo menos 5% nesta subida de preços, depois de ter dito que os EUA estão a estudar se apoiam ou não um ataque israelita à infra-estrutura petrolífera iraniana, visto que a Casa Branca deu um rotundo "não" à possibilidade de ataque às instalações nucleares de Teerão.
Para as contas de Angola
... que é um dos produtores e exportadores que mais dependem da matéria-prima em todo o mundo, devido à escassa diversificação económica, este cenário no Médio Oriente pode indicar um acréscimo bem-vindo nas receitas petrolíferas.
Mas, para já, ter o Brent nos 78 USD, claramente acima do valor médio usado para elaborar o OGE 2024, 65 USD, eleva substancialmente a capacidade para diluir alguns dos efeitos devastadores da crise cambial e inflacionista, embora o país enfrente também o problema da persistente redução da produção diária.
Com OGE 2024 elaborado com um valor de referência médio para o barril de 65 USD, este preço alimenta algum optimismo que pode ser ainda mais robusto se o país aumentar a produção o que ficou mais fácil depois de Angola ter, em Dezembro passado, anunciado a saída de membro da OPEP, o que deixa um eventual acréscimo da produção fora dos limites impostos pelo cartel aos seus membros como forma de manter os mercados equilibrados entre oferta e procura.
O crude ainda responde por cerca de 90% das exportações angolanas, 35% do PIB nacional e 60% das receitas fiscais do país, o que faz deste sector não apenas importante mas estratégico para o Executivo.
O Governo deposita esperança, no curto e médio prazo, de conseguir o objectivo de aumentar a produção nacional, actualmente perto dos de 1,12 mbpd, gerando mais receita no sector de forma a, como, por exemplo, está a ser feito há anos em países como a Arábia Saudita ou os EAU, usar o dinheiro do petróleo para libertar a economia nacional da dependência do... petróleo.
O aumento da produção nacional não está a ser travada por falta de potencial, porque as reservas estimadas são de nove mil milhões de barris e já foi superior a 1,8 mbpd há pouco mais de uma década, o problema é claramente o desinvestimento das majors a operar no país.
Aliás, o Governo de João Lourenço tem ainda como motivo de preocupação uma continuada e prevista redução da produção de petróleo, que se estima que seja na ordem dos 20% na próxima década, estando actualmente pouco acima dos 1,1 milhões de barris por dia (mbpd), muito longe do seu máximo histórico de 1,8 mbpd em 2008.
Por detrás desta quebra, entre outros factores, o desinvestimento em toda a extensão do sector, deste a pesquisa à manutenção, quando se sabe que o offshore nacional, com os campos a funcionar, está em declínio há vários anos devido ao seu envelhecimento, ou seja, devido à sua perda de crude para extrair e as multinacionais não estão a demonstrar o interesse das últimas décadas em apostar no país.
A questão da urgente transição energética, devido às alterações climáticas, com os combustíveis fosseis a serem os maus da fita, é outro factor que está a esfumar a importância do sector petrolífero em Angola.