Como pano de fundo para se perceber o caos que reina entre países produtores, e ainda mais entre os que têm economias grandemente dependentes das exportações de crude, como Angola, a crise económica planetária gerada pelo pandemia do novo coronavírus, desde o início de Janeiro até hoje, já retirou mais de 65 % ao valor do barril de petróleo nos principais mercados, como o Brent, em Londres, ou o WTI, em Nova Iorque.
Dos cerca de 67 USD por barril a 06 de Janeiro aos menos de 30 no início de Abril, foram três meses frenéticos em que ocorreram algumas situações jamais vistas e às quais pouca atenção se deu e se está a dar por causa da afáfama mediática com a dispersão aclerada da pandemia.
E as consequências de uma crise jamais vista, no entanto, não estão escondidas, desde logo o aumento do desemprego em todo o mundo que, por exemplo, nos Estados Unidos, estima o Nobel da Economia Paul Krugman, chegará em breve aos 20 por cento, valores que nunca foram alcançados em tão pouco tempo, nem sequer no histórico crash da bolsa em 1929, onde, apesar de em 1933 ter chegado aos 25%, demorou 4 anos a atingir essa cifra astronómica.
Mas não se ficam por aqui os recordes. No que toca ao consumo de petróleo, que ainda é, de longe, o combustível que motoriza a economia global, do consumo normal em tempos normais, que era, até aqui, entre 92 milhões de barris por dia (mbpd) e 96 mbpd, chegando a abeirar-se dos 100 mbpd nos melhores períodos, 30 mbpd, ou cerca de 30%, de acordo com a Reuters, evaporaram com esta crise pandémica iniciada na China em Dezembro de 2019.
Ora, é precisamente aqui que o problema se coloca e afunilam as soluções. Na quinta-feira, a OPEP+ esteve reunida por videoconferência para chegar a um acordo sobre que volume de produção seria cortado para estancar a sangria a que se assiste no valor do "ouro negro" e essa cifra quedou-se pelos 10 mbpd, o limite mínimo anunciado há duas semanas pelo Presidente dos EUA, Donald Trump, que tinha dito ter conseguido convencer Moscovo e Riade a cortarem entre 10 a 15 mbpd.
Ora, 10 mbpd é uma ínfima parte do que caiu relativamente à procura global, que está em 30 mbpd em apenas 3 meses, podendo chegar aos 35 mbpd nas próximas semanas, sendo evidente o escasso alcance deste acordo no convencimento dos mercados. E assim foi.
Na sexta-feira, o Brent, de Londres, onde é fixado o valor médio das exportações angolanas, caiu mais de 4%, fechando a sessão a pouco mais de 31 USD por barril, mesmo após o anúncio dos cortes de 10 mbpd pela OPEP+, com suporte "psicológico" dos Estados Unidos, especialmente no campo diplomático para acabar com a guerra de preços entre russos e sauditas que durava desde 06 de Março, com pesadas consequências no valor de mercado da matéria-prima.
Mas ainda ficou pior - só na segunda-feira se poderá saber com que consequências, se, entretanto, não mudar o equilíbrio de poderes - quando o México, um dos principais produtores "independentes" que se juntaram à OPEP, no grupo liderado pela Rússia, veio a terreiro deixar claro que a sua parte dos cortes - 400 mil bpd - não era aceitável, admitindo apenas retirar de circulação 100 mil bpd, pouco para o esforço necessário.
A título de exemplo, a parte que vai caber a Angola no âmbito deste acordo, segundo o Ministério dos Recursos Minerais, Petróleos e Gás, assim que o plano de cortes for activado, a 01 de Maio, será de cerca de 348 mil barris por dia, a partir da produção de 2018, que foi, em média, de 1,52 mbpd, que será a referência para este abatimento à produção nacional.
A redução acordada pela tutela angolana vai colocar a produção em cerca de 1, 18 mbpd, sendo que, oficialmente, a produção actual ronda os 1,4 mbpd.
Este fim de ciclo no seio da OPEP+, que esteve quase a dar início a um novo ciclo de redução na produção, do qual se esperava um volumoso aumento do preço do barril, acabou por gerar uma mão cheia de nada, podendo mesmo levar a um novo desmoronamento do sector, apesar do envolvimento do G20, grupo que agrega os 20 países mais ricos do mundo, que na sexta-feira reuniu para debater a crise, esperando-se um pronunciamento que ajudasse ao esforço da OPEP+, até porque teve como anfitrião a Arábia Saudita, mas tal não aconteceu.
No comunicado final, como relata a Reuters, ficou apenas uma demonstração de vontade em contribuir para a "estabilidade dos mercados" e que o G20 tudo vai fazer para que o sector dos petróleo vai estar "no centro do esforço para que o mundo recupere da crise gerada pela Covid-19, motorizando os momentos seguintes de crescimento".
Mas, para isso, vai ser necessário que os cortes sejam muito superiores aos actuais 10 mbpd em perspectiva para o início de Maio, o que muitos analistas não estão bem a ver como isso será possível, mesmo com a eventual e histórica adesão dos EUA a esse esforço.
Facto é que a generalidade dos analistas assumem também que todo este complexo e intrincado percurso poderá desanuviar-se de um dia para o outro assim que o mundo tiver disponível uma vacina para a Covid-19 ou um medicamento eficaz e rápido no seu tratamento.
Enquanto isso não sucede, garantido é que estes cortes de 10 mbpd pouco mais de cócegas vão fazer aos mercados, onde a procura caiu quase 30% face à procura e onde estes 10 mbpd são apenas um terço dessa desproporcionada resposta.
Na segunda-feira se saberá qual a sensibilidade dos mercados para esta situação, mas alguns analistas admitem que o barril volta a cair para baixo da fasquia dos 20 USD.