Com o reconhecimento oficial por parte da Rússia das repúblicas separatistas do Donbass, região do leste da Ucrânia, junto à fronteira da Rússia, foi dado um passo importante na escalada da tensão em que esta geografia está mergulhada, sendo que era uma das linhas vermelhas que algumas das organizações internacionais como a União Europeia ou a NATO tinham avisado que, se fosse ultrapassada, traria severas consequências à Rússia.

Em causa poderia estar, inclusive a anulação do Nord Stream 2, o gasoduto que deverá começar a fornecer gás natural oriundo dos vastos campos russos à Europa Ocidental, que está quase pronto, ou ainda impedir o uso de Moscovo do sistema financeiro SWIFT, que gere as transacções financeiras globais, o que impediria a grande maioria dos negócios de e para com a Rússia, incluindo o petróleo, pelo menos no formato actual, regulado pelos mercados oficiais.

A Rússia é o segundo maior produtor/exportador de petróleo do mundo, logo a seguir à Arábia Saudita, com quem partilha a liderança da OPEP+, a organização que desde 2017 procura equilibrar os mercados petrolíferos abrindo e fechando as torneiras em função das condições dos mercados, o que torna evidente que qualquer perturbação na sua infra-estrutura produtiva e exportadora vai gerar uma tempestade global, podendo atirar o preço do barril para valores nunca visto.

E essa é a razão principal para que o barril de Brent, nos contratos para Abril, tenha hoje, ao início da manhã, perto das 10:00, hora de Luanda, chegado aos 98,90 USD, mais 3,88% que no fecho de segunda-feira, enquanto em Nova Iorque o WTI chegada, à mesma hora, para contratos de Março, aos 96 USF, mais 5,41% que no fecho da anterior sessão, batendo igualmente um recorde histórico que remonta ao início de 2014.

Segundo alguns analistas citados pelos media especializados no sector, estes valores podem subir de forma descontrolada nas próximas horas ou dias se, como avisou antes desta acção do Presidente russo o Presidente dos EUA, Joe Biden, o mundo decidir "castigar" a Rússia incidindo sobre a sua infra-estrutura produtiva no sector dos hidrocarbonetos, que é a grande indústria exportadora do país e a sua principal, de longe, fonte de receitas.

Todavia, o mundo pula e avança e não foca aparado a ver passar sanções e o efeito das sanções sobre a Rússia pode ser diluído com a entrada no mercado de outro dos grandes exportadores mundiais de crude, o Irão, que está há vários anos sob rígidas sanções norte-americanas devido ao acordo nuclear de 2015, depois do anterior Presidente dos EUA, Donald Trump, o ter unilateralmente abandonado, reimpondo as sanções às exportações de crude sobre Teerão que tinham sido levantadas pelo seu antecessor, Barck Obama.

O Irão, segundo o próprio Presidente dos EUA, está a um passo de voltar a ver levantadas as sanções no seguimento de negociações que já duram há mais de um ano, com Teerão a comprometer-se com o cumprimento do acordo de 2015, que determina, entre outras imposições, que este país abandone o processo de criação de urânio enriquecido, que permitirá, no limite, a criação de armas nucleares.

E se isso suceder, como se prevê, nas próximas semanas, o Irão, que acaba de anunciar ao mundo uma gigantesca descoberta de reservas de crude e de gás no sul do país, pode fazer entrar no mercado global, no imediato, entre 2 e 3 milhões de barris por dia, podendo esta cifra chegar aos 5 milhões no espaço de poucos anos, ou mesmo meses, devido à sua condição de 3º maior produtor da OPEP.

A título de exemplo, em 2019 Teerão anunciou ao mundo a descoberta de um gigantesco campo de petróleo com mais de 53 mil milhões de barris, na zona do Khuzestan, a apenas 80 metros de profundidade, o que significa que, além de vasto, este campo garante não só uma extraordinária facilidade de extracção como garante um breakeven de sonho para qualquer multinacional do sector.

Este campo iraniano só fica atrás da sua estrela da companhia, o campo de Ahvaz, que contém mais de 65 mil milhões de barris prontos a ser extraídos.

No entanto, para já, esta crise que escala dia após dia para novos patamares no leste europeu, é uma garantia de preços mais elevados nos mercados internacionais, o que faz com que Angola, mesmo que o País se debata há anos com quebras sucessivas na produção, estando agora em menos de 1,1 milhões de barris por dia, mesmo abaixo da quota atribuída no contexto da OPEP, tenha um momento de relativa bonança pela frente, considerando que o crude representa, ainda, 95% das suas exportações, é responsável por 35% do PIB e garante quase 60% dos gastos de funcionamento do Estado.

A par desta realidade, a OPEP+ parece não descolar da sua política conservadora de reposição da produção no fade out pandémico da Covid-19, mantendo os 400 mil barris por dia, substancialmente menos que a recuperação da procura mundial, o que tem contribuído para elevar os preços do barril nos últimos meses.

Todavia, na reunião do cartel marcada para o início do mês, como tem sido habitual, podem ser inseridas alterações a este plano considerando a evolução da crise Rússia/Ucrânia.

Mas todos os cenários terão de ser revistos se ocorrer uma invasão da Ucrânia para além dos territórios do Donbass , como alguns analistas temem que possa suceder, porque, nesse caso, a Rússia poderia ver-se na contingência de ter bloqueados os mercados do negócio do crude, excepto as vendas directas para a China, como parece que Vladimir Putin tem substancialmente garantido com o seu homólogo Xi Jinping.

Nas próximas horas, nada parece ser suficiente para travar a chegada do barril de Brent aos 100 USD.