Depois de a abertura das grandes economias, como a dos EUA, alguns países europeus e antes a da China e da Índia ter servido para elevar o valor do barril de crude nos principais mercados globais de referência, essa mesma abertura está agora a exercer pressão em sentido contrário sobre a matéria-prima vendida no Brent de Londres e no WTI de Nova Iorque por estar a permitir o surgimento de novos doentes.
Em Londres, o barril de Brent, para fornecimento em Julho, que define o valor médio das exportações angolanas, abriu hoje a perder 2,10 por cento, para 29,25 USD, cerca das 09:40, baixando da fasquia dos 30 dólares onde estava há cerca de duas semanas.
E o WTI, em Nova Iorque, onde é marcado o ritmo das perdas e dos ganhos do crude consumido nos EUA, nos contratos futuros de Junho, à mesma hora estava a perder 1%, para os 25,55 USD por barril.
O problema por detrás do receio mostrado pelos mercados é justificado com a possibilidade de que o ressurgimento de novos casos em países que, aparentemente, tinham a pandemia sob controlo e avançaram para o aligeiramento das medidas de contenção, essencialmente o desconfinamento progressivo, leve esses mesmos países a retrocederem nos seus planos de reabertura das suas economias, voltando a reforçar aquilo que foram as razões para a actual crise global.
Naturalmente, como pano de fundo para a crise económica que surgiu no rasto da crise de saúde pública gerada pela Covid-19 desde que o vírus foi descoberto na cidade chinesa de Whuan, em Dezembro de 2019, está a decisão generalizada de encerrar fronteiras, fechar o comércio, suspender a produção industrial, colocar a aviação comercial no chão e os transportes marítimos em seco, com o inevitável decréscimo no consumo de energia, sendo fácil de percebê-lo com o facto de só a aviação e o sector marítimo serem responsáveis por cerca de 20% do crude consumido no mundo.
E isso foi o que provocou a histórica diminuição de mais de 30 milhões de barris por dia (mbpd) na procura, ficando exposto um excesso de oferta mundial que empurrou o valor da matéria-prima para cifras historicamente baixas, sendo os 40 dólares negativos no WTI em Abril uma marca simbólica destes tempos.
Agora é de novo esse receio que surge, substantivado pelas declarações feitas ontem no Congresso por Anthony Fauci, o conselheiro do Presidente norte-americano, Donald Trump, para a Covid-19, alertando para a possibilidade de uma reabertura extemporânea da economia nos EUA poder gerar uma grave segunda vaga pandémica na maior economia do mundo, onde a doença já matou mais de 80 mil pessoas e cerca de 1,3 milhões, num total mundial de 4,3 milhões, foram infectados
Mas este receio mostrado pelos mercados não surge do nada, é fruto de factos ocorridos na China e na Coreia do Norte, os dois países inicialmente mais afectados, e onde a Covid-19 primeiro mostrou estar a ser derrotada, mas que agora estão a observar o regresso de novos casos, levando mesmo a China a fazer em Harbin, uma cidade no norte do país, com 10 milhões de habitantes, o mesmo que fez em Janeiro em Wuhan... ninguém entra e ninguém sai.
Mas a Alemanha, a maior economia europeia, está a passar pelo mesmo, com o aligeiramento do "lockdown" a resultar num refluxo pandémico que pode levar o receio aos restantes países do velho continente.
Receio esse que está mesmo a afundar os ganhos conseguidos no final da passada semana, quando a Arábia Saudita, o maior produtor e exportador mundial, anunciou que vai, já a partir de 01 de Junho, cortar por sua livre iniciativa, e à margem dos acordos no seio da OPEP+, um 1 mbpd suplementar.
A esse anúncio seguiram-se outros do Kuwait e dos Emirados Árabes Unidos, e ainda do Kazaquistão, somando mais cerca de dois milhões de barris "queimados" na origem, elevando assim dos 10 mbpd acordados no início de Abril entre os Países Exportadores (OPEP) e a Rússia, junto na organização ad hoc OPEP+, para 12 mbpd.
Ao que se soma ainda a quebra gerada pela crise no sector alternativo dos EUA, o fracking, ou petróleo de xisto, fustigado pelos preços baixos nos mercados em comparação com o seu breakeven elevado, sendo que esta perda está a levar os Estados Unidos a deixarem de ser os maiores produtores globais, chegando mesmo a exportar crude, e a regressarem à sua condição de importadores, o que, tratando-se da maior economia planetária, tem um efeito benéfico nos mercados sob a perspectiva dos países exportadores, como é o caso de Angola.
Todavia, este processo é lento e, por ora, os EUA ainda estão a informar os mercados de que as suas reservas continuam a aumentar, embora com menos vigor que no auge da crise, em Março e Abril, o que afasta, para já, o risco de que os stocks estratégicos nos EUA cheguem ao limite da sua capacidade, como se chegou a temer nas últimas semanas.
Mas o que é dado como adquirido pela generalidade dos analistas é que este sobe e desce nos mercados do petróleo só voltará ao normal com a descoberta de uma fórmula que permita amansar a pandemia de forma sólida e segura, seja através de uma vacina, seja pelo surgimento de um tratamento eficaz com antivíricos ou outros medicamentos.