As primeiras notas de despedimento colectivo, sob a justificação de "motivos económicos, tecnológicos e estruturais" chegaram a casa dos visados a 30 de Dezembro, avisando a NileDutch Angola que este é um processo "definitivo e irrevogável".
A data avançada para o fim do vínculo laboral é 01 de Março, quando a NIleDutch Angola, devido ao gigantesco negócio que foi a aquisição da holandesa NileDutch pela alemã Hapag-Lloyd, há cerca de um ano, dará lugar à Hapag-Lloyd Angola.
Este processo gerou forte descontentamento entre todos os cerca de 60 trabalhadores, como pode rever aqui, tendo perto de três dezenas entre estes criado uma comissão para contestar o modelo de despedimento colectivo que a Hapag-Lloyd, através da NileDutch Angola, escolheu, considerando que a extinção da empresa "é ilegal".
Este grupo de, ainda, funcionários da empresa, prometeu não baixar os braços na defesa dos direitos que dizem ter sido obliterados nesse processo, como a redução das condições laborais, incluindo salários, na passagem da NileDutch Angola para a Hapag-Lloyd Angola, embora, tecnicamente, se trate de duas empresas distintas a operar no mesmo ramo de actividade.
Esta última, entretanto criada, vai continuar a actividade da NileDutch Angola, inclusive "nas mesmas instalações", o mesmo dono, com a mesma actividade e com, no geral, mesmos clientes, como notam os trabalhadores ao Novo Jornal.
Mas, no decurso deste processo, apesar de garantir o "escrupuloso cumprimento de todos os procedimentos legais" da Lei Geral do Trabalho, a Hapag-Lloyd, que é quem, em última instância, responde por este "plano", está a procurar retomar a actividade com vários dos anteriores funcionários mas com novos contratos, que os visados afirmam conter uma "evidente desvitalização dos (seus) direitos e condições laborais".
O mais claro, para os que começaram a receber as cartas de despedimento nas vésperas da passagem de ano, é a redução salarial e os direitos inerentes ao tempo dedicado à empresa.
Esta situação, como avançam ao Novo Jornal alguns dos visados, gera redobrada indignação porque lhes está a ser proposto, embora não a todos, que passem a exercer a mesma actividade, com as mesmas responsabilidades, após a desvitalização de direitos e condições.
Como já tinham dito antes, o Novo Jornal noticiou-o a 21 de Dezembro, os trabalhadores que não aceitam a proposta da NileDutch Angola já fizeram sair do "porto" a sua indignação em missivas enviadas à Inspecção Geral do Trabalho e à AIPEX.
Nestas são elencadas as razões da indignação dos trabalhadores, contestando alguns dos pontos que a empresa alega, incluindo nas cartas que formalizam o despedimento colectivo, como, por exemplo, os problemas económicos do país, a baixa do valor do petróleo, a crise cambial... que afectam o negócio e resultados anuais da empresa.
Num dos pontos colocados nas cartas de despedimento colectivo, a NileDutch Angola alega que, embora tenha feito todos os esforços para o evitar, não lhe restou outra alternativa que não fosse o "encerramento das operações".
Ora, os trabalhadores refutam este argumento, visto que as operações da NileDutch Angola não vão apenas ter continuidade pela Hapag-Lloyd Angola, uma consequência natural da aquisição da primeira pela segunda no que toca às respectivas "casas-mãe", como tal vai ainda acontecer nas mesmas instalações, pelo menos inicialmente.
Na vasta contestação que o representante legal dos trabalhadores expõe à Inspecção Geral do Trabalho (IGT), destaca-se a ideia aduzida pela empresa de que são dificuldades financeiras geradas pela crise económica que o país atravessa, porque esta tem "apresentado lucros milionários" ao longo dos anos.
E é ainda dito, com evidente tom acusatório, que este processo visa exclusivamente passar a actividade para outra empresa "do mesmo operador" com o "claro intuito" de prejudicar os direitos laborais dos visados de forma "obviamente ilegal".
Entre outras urgências, os trabalhadores, através do seu representante legal, pedem que a IGT averigúe junto da empresa a legalidade dos procedimentos face à lei angolana, nomeadamente a transferência do exercício para a nova empresa entretanto criada, a Hapag-Lloyd Angola.
Na missiva endereçada à Agência de Investimento Privado e Promoção das Exportações (AIPEX), o mesmo remetente sublinha que o processo de constituição da Hapag-Lloyd Angola fere o "espírito que norteia a aprovação de projectos" por esta instituição do Estado angolano.
Nomeadamente naquilo que é o alicerce mais robusto dos argumentos dos trabalhadores, que é estes acreditarem que a nova empresa "é um veículo para a substituição da ainda existente NileDutch Angola".
E, nessa movimentação entre entidades que integram a mesma entidade patronal, pelo menos no presente, "despedir e reduzir condições laborais aos actuais funcionários" sendo que "a actividade é a mesma, o local onde a mesma ocorre é o mesmo" mantendo-se inclusiva alguns dos gerentes.
Com estas notas feitas chegar à IGT e à AIPEX, os trabalhadores, contaram alguns destes ao Novo Jornal, querem "apenas" ver "respeitados os seus direitos integralmente", sendo que, segundo os trabalhadores que se organizaram e constituíram advogado para os defender, além da exposição da situação à IGT e à AIPEX, garantem que "estão já a ser tomadas todas as diligências judiciais competentes de forma a defender os direitos dos trabalhadores".
Apesar de o Novo Jornal ter pedido esclarecimentos à NileDutch Angola, tal não foi ainda atendido, embora mantenha via aberta para tal.
No entanto, na documentação enviada aos trabalhadores, a empresa refere que respalda todo o processo de despedimento colectivo na LGT angolana e que, antes de enviar as cartas aos funcionários, submeteu os procedimentos adoptados para isso à IGT, notando que esta, após 22 dias legais para o efeito, "não manifestou oposição nem solicitou esclarecimentos".
A NileDutch Angola, que em breve passará a ser a Hapag-Lloyd Angola, representante do gigante dos mares alemão Hapag-Lloyd no país, explica aos seus trabalhadores, alguns com longos anos de casa, que "não tem conseguido atingir os seus objectivos e metas de vendas".
Evoca ainda a crise no sector petrolífero e de liquidez de moeda estrangeira associada à desvalorização cambial do Kwanza como razões para este desfecho que diz ser "inevitável e irrevogável".
A empresa informa os visados pelas cartas de despedimento que, entre outros motivos, a isso levou a "actual situação económica de Angola" que afecta os resultados económicos e financeiros da empresa, acrescentando que, devido às fragilidades da economia nacional, "a médio prazo não se antecipa que haja alterações" nestes pressupostos, o que deixa a empresa em alternativas ao encerramento das suas operações no país.
Dizem ainda, embora tal possa não constar de todas as cartas de despedimento, e mesmo sabendo-se que à NileDutch Angola sucederá a Hapag Lloyd Angola, que a empresa não possui capacidade de realocar os funcionários para novos postos de trabalho.
Segundo um jurista ouvido pelo Novo Jornal, se esta situação chegar às instâncias judiciais para decisão, o que estará em cima da mesa é se o processo de aquisição, criação de nova empresa e continuidade da actividade comercial é ou não uma sucessão natural e dentro da mesma entidade patronal, o que fará com que se perceba se o processo de despedimentos é legal ou ilegal.
Os trabalhadores que em Dezembro recusaram a proposta de rescisão por mútuo acordo defendem que este processo é ilegal e, como tal, as compensações previstas na LGT não se aplicam.
O que se passa a aplicar, caso tenham a razão legal do seu lado, é que a empresa tem de procurar soluções negociadas caso a caso com cada um dos seus funcionários que não aceitaram as condições anteriormente usadas para a rescisão.
Além disso, os trabalhadores referem um acrescento de indignação quando a empresa refere problemas financeiros e económicos para se livrar deles mas, na carta de Natal enviada aos trabalhadores, a Hapag-Lloyd refere os bons e "robustos" resultados do ano que passou, com uma "equity position" de 21 mil milhões USD e uma "liquidity reserve" de 8 mil milhões USD.
E foi noticiado recentemente que a Moody"s acaba de subir a Hapag-Lloyd, actual detentora da NileDutch Angola e da futura Hapag Lloyd Angola, para a posição "Ba1", a mais alta posição de "credit rating" alguma vez notada pela agência desde 2010, quando esta ligação foi iniciada