Mas esta que agora, segunda-feira, 13, começa, não parece muito melhor para quem, em Washington, olha para o mundo e tem de decidir o que fazer, especialmente na sua mais importante frente de batalha", que é a guerra na Ucrânia, onde a vitória de Kiev será a vitória dos norte-americanos, e o inverso aplica-se da mesma forma.

Isto, porque o Politico, um dos mais relevantes media norte-americanos no acesso a informação do interior da Administração Biden, acaba de divulgar uma história onde conta que em Washington cresce de forma acelerada o mal-estar com o regime ucraniano de Volodymyr Zelensky, que, ao que parece, não se mostra nem dócil nem obediente à bussola da Casa Branca.

Depois de Joe Biden ter dito, pela última vez, há cerca de três semanas - não voltou a repetir -, que os EUA e os seus aliados ocidentais da NATO e da União Europeia, vão estar com Kiev "até onde for preciso e pelo tempo que for preciso", as chefias militares ucranianas e o Presidente Zelensky fizeram precisamente o contrário do que lhes foi "aconselhado" pelos americanos no que respeita à defesa da cidade de Bakhmut, onde se trava a mais mortífera e longa batalha urbana desta guerra.

Para os estrategas norte-americanos, as forças de Kiev deveriam já ter retirado de Bakhmut, por considerarem não ter importância estratégica que justifique a perda de dezenas de milhares de homens e material militar de difícil substituição que vão fazer falta para a anunciada e esperada contra-ofensiva ucraniana da Primavera.

Pelo contrário, Zelensky mandou reforçar as posições das suas forças e mostra-se cada vez manos satisfeito com a demora dos aliados ocidentais em fornecer as armas já anunciadas, como os carros de combate pesados, Leopard e Chalenger, os misseis de longo alcance para os sistemas HIMARS, e mais munições de artilharia, e os aviões de guerra que ainda não viram o "take off" da decisão do directório EUA/NATO.

Esta insistência de Kiev, que surge, aos olhos de alguns analistas, cada vez mais como o credor que exige o pagamento de dívidas antigas, deve-se, segundo o major general Agostinho Costa, analista militar da RTP3 e CNN Portugal, ao facto de os ucranianos terem avançado para negociações com os russos pouco depois do início da invasão de Moscovo mas foram convencidos a abandoná-las por Washington e Londres com a promessa de fluxo ilimitado de dinheiro e armamento para derrotar as forças do Kremlin, "até onde for preciso", frase que depois os lideres da União Europeia, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e o chefe da diplomacia, Joseph Borrell repetiram à exaustão.

Agora, tanto o Presidente Zelensky como o seu ministro dos Negócios Estrangeiros, Dmitri Kuleba, pressionam fortemente os países ocidentais para o envio de mais armas, porque foi isso que lhes fois prometido como troca pela continuação da guerra...

Com isto, segundo o Politico, Kiev e Washington travam uma guerra surda sobre o timing para acabar com a guerra, porque, entre outras razões, Joe Biden deixou de contar com uma maioria na Câmara dos Representantes, e porque as exigências da aproximação ao período de pré-campanha eleitoral para as Presidenciais de 2024, colidem nos interesses com Kiev: os Democratas precisam de terreno limpo para voltarem a convencer os eleitores com uma recuperação económica e um combate à inflação efectivo que a guerra está a encher de "pedras", que a oposição Republicana aproveita para atirar contra a Casa Branca.

Alias, Joe Biden, segundo esta publicação especializada nos temas da política norte-americana, lida actualmente com três complexas questões, uma é o ataque aos gasodutos russo-alemães no Mar Báltico, os Nord Stream I e II, que tudo aponta para uma autoria norte-americana, com apoio de alguns países europeus, o diferendo que começa a ser grave entre americanos e ucranianos quanto à defesa de Bakhmut, e a questão das exigências eleitorais, cada vez mais relevantes quando a sociedade norte-americana, e europeia, começa a dar sinais de exaustão com este extenuante conflito no leste europeu.

O problema Irão-Arábia Saudita

Na semana passada, por intermédio da China, mas com trabalho igualmente relevante da diplomacia russa, os dois até agora inimigos mais possantes do mundo islâmico no Médio Oriente, o Irão e a Arábia Saudita, os dois lideres do mundo xiita e sunita, as duas mais fortes correntes do Islão, voltaram a entabular relações diplomáticas e, segundo alguns analistas, de forma decidida e não para aparecer no boneco.

Esta aproximação de sauditas a Teerão é um duro golpe nos EUA, porque Riade, a seguir a Tel Aviv (Israel), era o mais emblemático aliado de Washington nesta conturbada região do mundo, e, agora, pela mão de Pequim, na boca de cena, e Moscovo, por detrás dos panos, voltam a ser amigos, embora com problemas ainda por resolver, abrindo, para já, embaixadas nas duas capitais respectivamente.

Os analistas notam que Riade e Teerão perceberam que Pequim e Moscovo são mais confiáveis que Washington, primeiro, porque Teerão viu o acordo nuclear de 2015 ser desmantelado sem justificação por Donald Trump, e com Joe Biden a manter a posição, no essencial, enquanto os sauditas viram, depois do caso Jamal Khashoggi (ver aqui), os americanos a enxovalhar Riade nos palcos internacionais.

Além disso, a China, com a sua Nova Rota da Seda, um megaplano global de criação de rotas comerciais por terra, mar e ar, com forte impacto na Ásia Central e Médio Oriente, como geografias fulcrais de acesso à Europa Ocidental e a África, mostraram a estes dois países que, sob o seu "guarda-chuva" podem criar uma nova perspectiva para o futuro, baseado nas ligações comerciais e não na insegura paz gerada pela corrida ao armamento, cenário no qual só os norte-americanos ganham com o negócio do armamento e no domínio diplomático dos aliados... inseguros.

Numa demonstração de poder que nos últimos anos só os EUA podiam evidenciar, Pequim pediu aos dois Governos, Irão e Arábia Saudita, que enviassem os seus chefes de diplomacia para um encontro em Pequim com o chefe da diplomacia chinesa, Wang Yi - que não é o ministro dos Negócios Estrangeiros mas sim uma espécie de director das reacções internacionais do Partido Comunista Chinês (PCC) -, sob os auspícios do Presidente Xi Jinping, e, durante quatro longos dias partiram pedra até chegarem a um entendimento.

Nas televisões de todo o mundo, Wang Yi apareceu de mãos dadas com o conselheiro nacional para a Segurança iraniano, Ali Shamkhani, e o seu homólogo saudita, Musaad bin Mohammed al-Aiban, fazendo lembrar os tempos em que os lideres norte-americanos surgiam nas mesmas circunstâncias a mediar conflitos em todo o mundo, sendo um dos mais emblemáticos a questão israelo-palestina, em Camp Davir (EUA), em 2000, com o Presidente Bill Clinton, o primeiro-ministro israelita, Ehud Barak, e o líder da Autoridade Palestina, Yasser Arafat.

Um dos resultados directos esperados deste acordo é o fim da guerra no Iémen, onde o Governo é apoiado por Riade e os rebeldes Houthis, por Teerão, mas as sequelas devem ser muito mais latas, especialmente na libertação da tensão, que vai levar estes dois países, grandes potências regionais, a redireccionar meios, empenho e energia para outras áreas...

Recorde-se que, quase ao mesmo tempo, embora com pouca expressão, curiosamente, nos media ocidentais, a Rússia e a Índia anunciaram que vão deixar de usar o dólar norte-americano como moeda franca - Moscovo e Pequim estão no mesmo caminho - para as suas transacções comerciais, o que impacta especialmente na questão petrolífera, com Nova Deli, o 2º maior importador do mundo, a ter agora os russos como maiores fornecedores da matéria-prima.

Este é um dos mais importantes contributos, devido ao volume de negócios Nova Deli-Moscovo, na ordem dos 15 mil milhões USD, para a ainda pouco acentuada erosão da moeda norte-americana como padrão para os negócios planetários.

Contexto da guerra na Ucrânia

A 24 de Fevereiro de 2022 as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação militar especial", sublinhando que o objectivo não era (é) a ocupação do país vizinho, condição que evoluiu depois para a anexação de territórios no Donbass mas também as regiões de Kherson e Zaporijia, mas sim a sua desmilitarização e desnazificação e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional.

O Kremlin critica há vários anos fortemente o avanço da NATO para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS, em 1991.

Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de Kiev da soberania russa da Península da Crimeia, invadida e integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro, tendo acrescido a esta reivindicação as províncias de Kherson e Zaporijia, depois da realização de referendos que a comunidade internacional, quase em uníssono, não reconhece.

Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1991, com o colapso da União Soviética.

Kiev insiste que a Ucrânia é una e indivisível e que não haverá cedências territoriais como forma de acordar a paz com Moscovo, sendo, para o Presidente Volodymyr Zelensky, essencial o continuado apoio militar da NATO para expulsar as forças invasoras.

A organização militar da Aliança Atlântica está a ser, entretanto, acusada por Moscovo de estar a desenrolar uma guerra com a Rússia por procuração passada ao Exército ucraniano, o que eleva, segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, o risco de se avançar para a III Guerra Mundial, com um confronto directo entre a Federação Russa e a NATO, que tanto o Presidente dos EUA, Joe Biden, como o Presidente Vladimir Putin, da Rússia, já admitiram que se isso acontecer é inevitável o recurso ao devastador arsenal nuclear dos dois lados desta barricada que levaria ao colapso da humanidade tal como a conhecemos.

Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país, mas que agora está concentrada no leste e sudeste da Ucrânia.

Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%, embora já tenha, entretanto, recuperado.

Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, a mais simbólica, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios, a banca e grande parte das suas exportações, incluindo o sector energético, do gás natural e em parte do petróleo...

Milhares de mortos e feridos e mais de 9,5 milhões de refugiados internos e nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.

O histórico recente desta crise no leste europeu pode ser revisitado nos links colocados em baixo, nesta página.