O General Mark Milley, chefe do Grupo dos comandantes militares no Pentágono, o que corresponde a Chefe de Estado-Maior General, estima ainda, segundo o próprio avançou numa intervenção num conhecido clube económico em Nova Iorque, que já morreram 40 mil civis ao lomgo dos quase nove meses de guerra na Ucrânia.

Esta guerra, que começou a 24 de Fevereiro, segundo o ocidente, e que os russos dizem ter começado em 2014, com os ataques das forças de Kiev às repúblicas independentistas pró-russas de Lugansk e Donetsk, já terão, assim, se os números avançados por Milley estiverem certos - o que não é possível confirmar de forma independente - morrido ou ficado feridos 240 mil pessoas no total, uma cifra que ultrapassa largamente os números apontados por Kiev e Moscovo.

Até agora, Kiev admite, dependendo das fontes, que, em alguns períodos, morriam ou eram feridos entre 200 a 400 soldados ucranianos, apontando para mais de 75 mil do lado russo ao longo dos mais de oito meses de guerra, o que dá cerca de 270 por dia de conflito até agora, enquanto do lado de Moscovo, na última contagem anunciada pelo Ministério das Defesa, terão perdido a vida "apenas" perto de nove mil soldados.

Ora, os números de Mark Milley, citados pelo The Guardian, sobrepõem-se claramente a estes fornecidos pelas partes, o que faz deste conflito, se se vierem a confirmar, num dos mais mortíferos desde a II Guerra Mundial, podendo ser comparados, por exemplo, com os 58 mil soldados norte-americanos que morreram nos quase 20 anos de guerra do Vietnam, entre 1954 e 1975, ou os 150 mil, entre norte-americanos, sul-coreanos e da ONU, que morreram na Guerra da Coreia, em três anos, de 1950 a 1953... embora os dados oficiais apontem para que nesta guerra, do lado da Coreia do Norte, 800 mil tenham sido abatidos.

Nesta mesma intervenção, em Nova Iorque, Mark Milley sugeriu que todas as oportunidades para fazer a paz devem ser aproveitadas ao máximo, lembrando que no início da I Guerra Mundiam as partes negaram a mesa das negociações e este conflito na Europa acabou por levar à morte de perto de 20 milhões de pessoas, entre estes cerca de 10 milhões de militares e quase 10 milhões de civis.

"Quando a paz está ao alcance, quando essa oportunidade surge, aproveite-se o momento", apelou MIlley, um dos ais experientes militares norte-americanos.

Putin manda as tropas sair de Kherson no maior revés russo nesta guerra

Kherson, a única capital das quatro províncias anexadas pela Rússia há dois meses e que estava sob controlo de Moscovo desde Março, foi agora abandonada pelas suas tropas e os civis retirados, deixando-a à mercê das unidades de combate ucranianas que estão nas proximidades, sendo, para já, uma perda simbólica gigantesca e a maior derrota militar do Kremlin desde que iniciou a invasão ao país vizinho, a 24 de Fevereiro.

Mas nem todos estão convencidos de que se trata de uma demonstração de fragilidade ofensiva das forças russas, admitindo o Presidente Volodymyr Zelensky e o secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, que se trata de uma manobra e não de uma retirada de Kherson, a capital da província com o mesmo nome.

Entre as possibilidades em ciama da mesa, na abordagem dos que duvidam desta manobra russa, estão tratar-se de uma retirada estratégica para reagrupar e voltar a avançar sob Kherson, colocando tracção no terreno, aproveitando a esperada pausa importa pelo Inverno, que permita às colunas russas forçar, na Primavera, o avanço até à cidade de Odessa, mais a oeste, na margem do Mar Negro.

A outra possibilidade é mais imaginativa e passa por definir estas movimentações de tropas russas e civis para a margem esquerda do Rio Dniepre, que atravessa a área urbana alagada da cidade de Kheron, como uma armadilha que visa atrair o grosso das unidades de combate ucranianas implicadas na contra-ofensiva sobre esta província iniciada há um mês, envolvendo milhares de homens, para o interior da cidade flagelando-a de seguida com as centenas de peças de artilharia, sistemas de misseis e rampas de lançamento de drones instalados do outro lado do rio, onde foram erguidas posições defensivas reforçadas.

O anúncio de uma debandada russa de Kherson foi feito de uma forma pouco habitual pelas chefias militares russas, que permitiram a transmissão televisiva de uma reunião onde participaram o ministro da Defesa, Sergei Shoigu, e o comandante da operação miliar especial, que é como Moscovo chama à invasão do leste ucraniano, o general Sergei Surovikin, onde o primeiro autoriza formalmente o segundo a accionar a operação de retirada de Kherson, justificada, que tinha explicado antes que tal manobra era essencial para salvar a vida dos militares russos e dos civis.

O primeiro a reagir a esta estranha "manobra" de propaganda, porque não é usual uma reunião deste calibre, onde são tomadas decisões de uma importância estratégica de topo, ser transmitida pelos media, veio de Mykhailo Podolyak, o assessor principal de Zelensky para as questões da guerra, que disse que Kiev não acredita em anúncios desta importância encenados para serem transmitidos via televisão, apostando, tal como o Presidente fez depois, que se trata de algum tipo de "truque" afastando a possibilidade de os russos saírem de Kherson sem darem forte e robusta luta.

"Alias, Zelensky foi mais longe e disse não acreditar que "o inimigo esteja agora a dar presentes", pedindo "cautelas sem emoções esem correr riscos desnecessários" porque o objectivo se mantém intocável, que é "libertar todo o território nacional" sem ceder "um centímetro ao invasor".

Apesar desta desconfiança do Governo de Kiev, alguns analistas admitem que uma análise mais detalhada da propalada retirada russa permite vê-la como sendo efectivamente uma saída de Kherson.

Desde logo porque as forças russas ou destruíram ou armadilharam as pontes e nós rodoviários que deixaram para trás de forma a estancar o passo aos ucranianos que possam seguir no seu encalço, e depois, porque tudo o que era importante na cidade foi levado na "bagagem" das tropas russas, como obras de arte dos museus, peças importantes da história conjunta e até as ossadas do príncipe Grigory Alexandrovich Potemkin, que se encontravam na catedral da cidade, cuja importância vem do seu papel na anexação da Crimeia, no século XVIII, convencendo a Imperatriz russa Catarina, a Grande, fundadora da cidade de Odessa, a anexar aquela península.

Por explicar fica o facto de as forças ucranianas mais próximas de Kherson, apesar de alguns ataques de artilharia, não estarem a exercer uma pressão anormalmente forte sobre as defesas da cidade, e das aldeias limítrofes, o que dificulta uma explicação mais racional para esta opção estratégica dos russos, visto que a província de Kherson, para Moscovo, já é parte integrante da Rússia, tal como Zaporijia, Lugansk e Donetsk, desde que o Presidente Putin assinou os documentos aprovados pelo Parlamento em Moscovo (Duma) nesse sentido, há menos de dois meses.

Está Moscovo a abdicar do seu próprio território? Ou está a atrair os ucranianos para uma armadilha? Ou está a dar um passo atrás para depois de passar o Inverno dar vários em frente? Só o tempo o dirá...

Provavelmente, tudo o que se diga sobre este bizarro episódio desta guerra que já leva quase nove meses, será mera especulação, porque a verdade esconde-se entre o topo do comando militar desta invasão, que é constituído pelo Presidente Putin, pelo seu ministro da Defesa, Shoigu, e pelo comandante da operação, o general Surovikin, conhecido por ser a cara do sucesso russo na libertação da Síria sob ocupação dos radicais do estado islâmico.

A estranha morte de Stremousov

Entretanto, em mais um ainda por explicar episódio desta guerra de deceção em deceção, os media russos anunciaram nas últimas horas que Kirill Stremousov, o vice-governador da província de Kherson, um ucraniano russófilo, que ganhou estrelato ao usar as redes sociais com mestria em defesa dos pontos de vista de Moscovo, morreu na quarta-feira, num alegado acidente rodoviário.

Porém, algumas fontes ucranianas já admitiram que se tratou de um atentado conduzido por aliados de Kiev, até porque Kirill Stremousov estava na lista dos inimigos da Ucrânia a abater, o que, a confirmar-se, é mais uma humilhação para o Kremlin que viu um dos seus mais fervorosos apoiantes em Kherson ser abatido... em território russo.

Stremousov não era militar e não andava armado, segundo contaram os seus próximos, sendo conhecido pela forma como se deslocava entre a linha da frente dos combates e a rectaguarda logística munido apenas de uma câmara de vídeo ou um telemóvel onde gravava os vídeos que posteriormente difundia nas redes sociais destacando os feitos russos e as iniciativas de protecção dos civis e de apoio às populações da província anexada por Moscovo.

As possibilidades para a paz e o G20

A Rússia, desde quase , é um dos membros do G20, o grupo dos vinte países mais desenvolvidos e ricos do mundo, mas, com o eclodir desta guerra, Vladimir Putin passou a ser uma espécie de persona non grata em tudo o que diga respeito às iniciativas deste restrito corpo da elite industrial planetária, estando há várias semanas em suspenso a possibilidade de o senhor do Kremlin poder deslocar-se a Bali, na Indonésia, onde este mês tem lugar mais um encontro do grupo dos vinte.

De 15 a 16 de Novembro, os 20 mais ricos vão reunir na paradisíaca ilha de Bali, sendo, há semanas, alimentada uma mediática possibilidade de um encontro entre Putin e o Presidente norte-americano Joe Biden, para debater um hipotético fim para o conflito no leste europeu, porque, como a generalidade dos analistas sustentam, os EUA têm a palavra decisiva sobre a condução da guerra porque só graças aos seu continuado e intenso apoio financeiro e em material de guerra permite a Kiev manter o ímpeto defensivo face à invasão russa.

Primeiro, foi The Washington Post a noticiar, sempre recorrendo a fontes próximas da Administração Biden, que a Casa Branca está a pressionar o Governo de Volodymyr Zelensky para não fechar totalmente a porta a negociações com a Rússia para alcançar um acordo de paz.

Depois foi The Wall Street Journal a garantir, sob certezas afiançadas por fontes ligadas ao Governo norte-americano, que Jake Sullivan, o conselheiro principal de Joe Biden para a Segurança Nacional, manteve permanentes contactos com o Kremlin para evitar uma escalada perigosa nesta guerra e manter a porta sempre entreaberta para uma solução negociada.

Por fim, a Bloomberg, já hoje, terça-feira, 08, dias das eleições intercalares nos Estados Unidos, divulgou que o Presidente Joe Biden permitiu, secretamente, apesar das sanções claras a impedi-lo, que os gigantes da banca norte-americana, como JP Morgan ou Citigroup, que mantivessem os negócios com as grandes empresas russas... alegadamente para diluir os efeitos-refluxo das sanções na economia do país.

Segundo a Bloomberg, nesta que pode ser a mais importante das três notícias que mostram como Washington está a esforçar-se para manter uma ligação sólida com Moscovo, apesar de toda a retórica agressiva de parte a parte sobre e por causa da guerra na Ucrânia, o Tesouro dos EUA (tutela das Finanças) e o Departamento de Estado (tutela das Relações Exteriores), não só autorizaram como "pediram tecnicamente que os grandes bancos norte-americanos não recusassem manter os negócios com certas empresas estratégicas russas".

Este contexto, apesar de o Presidente ucraniano ter dito que não se dirigiria ao G20 por videoconferência se Putin lá estivesse, o que de pouco valerá como ameaça se EUA e Rússia decidirem que está na hora de resolver o problema, permitiu por algum tempo alimentar a ideia de que Biden e Putin se encontrariam para acertar agulhas em Bali, enquanto usufruiriam da vista para o Oceano Índico e beberiam uma água de coco.

Mas tal não vai acontecer, porque Vladimir Putin já disse que não vai a Bali, embora deixando em aberto a possibilidade de participar num dos painéis via digital.

Todavia, presencialmente, segundo a embaixadora russa na Indonésia, Yulia Tomskaya, em Bali vai estar o ministro dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov, o que deixa uma fresta por onde se pode esgueirar uma possibilidade de diálogo com o seu homólogo norte-americano, o Secretário de Estado Antony Blinken, que é o mais importante patamar negocial logo abaixo do nível Presidencial, entre as duas maiores potências militares do mundo no que toca ao nuclear.

Outro encontro de extrema importância para o mundo é o que se espera que veha a suceder entre Biden e o Presidente Chinês, Xi Jinping, o que, além da questão melindrosa de Taiwan, inevitável se os dois vierem a conversar fora dos holofotes do G20, terá ainda em coma da mesa a guerra na Ucrânia, visto que os EUA acusam amiúde os chineses de sustentarem de forma importante Moscovo neste confronto ao evitarem condenar a Rússia e mantendo um fluxo de negócios crescente e já gigantesco com a Federação Russa, apoiando Moscovo politicamente com sucessivas abstenções em votações de condenação decisivas na ONU, incluindo no Conselho de Segurança e na Assembleia-Geral.

Esta recusa de ir a Bali por Putin é, todavia, estranha, porque uma das batalhas globais da Rússia é por evitar a sua exclusão dos principais areópagos face à pressão nesse sentido dos EUA e da União Europeia, tendo o senhor do Kremlin recebido um convite pessoal do Presidente indonésio, Joko Widodo, quando este esteve em Moscovo no mês de Junho.

Integram o G20 a Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, França, Alemanha, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Rússia, Arábia Saudita, África do Sul, Turquia, África do Sul, Reino Unido, Estados Unidos e a União Europeia.

Contexto da guerra na Ucrânia

A 24 de Fevereiro as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação militar especial", sublinhando que o objectivo não é a ocupação do país vizinho, condição que evoluiu depois para a anexação de territórios no Donbass mas também as regiões de Kherson e Zaporijia, mas sim a sua desmilitarização e desnazificação e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional.

O Kremlin critica há vários anos fortemente o avanço da NATO para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS, em 1991.

Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de Kiev da soberania russa da Península da Crimeia, invadida e integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro, tendo acrescido a esta reivindicação as províncias de Kherson e Zaporijia, depois da realização de referendos que a comunidade internacional, quase em uníssono, não reconhece.

Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1991, com o colapso da União Soviética.

Kiev insiste que a Ucrânia é una e indivisível e que não haverá cedências territoriais como forma de acordar a paz com Moscovo, sendo, para o Presidente Volodymyr Zelensky, essencial o continuado apoio militar da NATO para expulsar as forças invasoras.

A organização militar da Aliança Atlântica está a ser, entretanto, acusada por Moscovo de estar a desenrolar uma guerra com a Rússia por procuração passada ao Exército ucraniano, o que eleva, segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, o risco de se avançar para a III Guerra Mundial, com um confronto directo entre a Federação Russa e a NATO, que tanto o Presidente dos EUA, Joe Biden, como o Presidente Vladimir Putin, da Rússia, já admitiram que se isso acontecer é inevitável o recurso ao devastador arsenal nuclear dos dois lados desta barricada que levaria ao colapso da humanidade tal como a conhecemos.

Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país, mas que agora está concentrada no leste e sudeste da Ucrânia.

Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%, embora já tenha, entretanto, recuperado.

Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, a mais simbólica, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios, a banca e grande parte das suas exportações, ficando apenas de fora o sector energético, do gás natural e em pate do petróleo...

Milhares de mortos e feridos e mais de 5,5 milhões de refugiados nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.

O histórico recente desta crise no leste europeu pode ser revisitado nos links colocados em baixo, nesta página.