Apesar desta ofensiva ter coincidido com o início do segundo mandato de Abiy Ahmed, a informação foi avançada pelos rebeldes da Frente Popular de Libertação de Tigray (TPLF, sigla em inglês) que, como o Novo Jornal noticiou então, desde finais de Outubro de 2020 enfrentam as forças leais a Adis Abeba, que procuram esmagar esta organização com apoio da Eritreia, os vizinhos do norte, que se envolveram nesta guerra, primeiro às escondidas, depois abertamente.
Com este conflito, surgiu um novo foco de tragédia em África, onde largas centenas de milhares de pessoas procuraram segurança nos países vizinhos, desde logo no Sudão, ou nas províncias a sul de Tigray, dando início a uma nova tragédia humanitária naquele que é o segundo país mais populoso de África, a seguir à Nigéria, com perto de 110 milhões de habitantes, e que viu no alastramento desta guerra a outras províncias um factor de retrocesso no seu desenvolvimento.
A Etiópia está igualmente na génese de um perigoso jogo do gato e do rato com os vizinhos Sudão e Egipto, como pode ser revisitado no noticiado pelo Novo Jornal aqui e aqui, por causa da mega barragem que está a ser construída no Rio Nilo.
Aparentemente, esta ofensiva desencadeada pelas forças leais a Abiy Ahmed, com apoio da Eritreia, visam acabar de uma vez por todas com o conflito que, além da tragédia humanitária, e com a registada perda de milhares de vidas, veio retirar brilho à carreira política do primeiro-ministro que tinha sido galardoado em 2019 com o Nobel da Paz por, precisamente, ter acabado com a guerra com a Eritreia que já durava há duas décadas.
Guerra essa, entre a Etiópia e a Eritreia, que foi alimentada pelo ódio ancestral entre o povo de Tigray, que, na altura, tinha os seus à frente do Governo em Adis Abeba, e os eritreus, e que, com a chegada de Ahmed ao poder, natural da região de Oromia, antiga Kaffa, perdeu o ódio étnico como combustível.
Porém, e ao que tudo indica, esse ódio étnico foi redireccionado para o povo de Tigray que, até à tomada de posse de Abyi Ahmed, há cinco anos, dominou o poder central por quase três décadas.
Segundo estão a avançar as agências de notícias internacionais, o responsável pelas relações externas da FPLT informou que o Exército etíope lançou esta operação com centenas de milhares de homens, recrutando igualmente fora das forças regulares, alegadamente mercenários sudaneses e outros, focando o ataque na vizinha região de Amhara, onde está agora a linha da frente do conflito depois dos rebeldes terem, alegadamente, recuperado quase todo o território perdido em finais de 2020.
Como tem sido comum, estas informações, que dizem ainda estar a ocorrer ataques com aviação, drones ou artilharia pesada, não estão a ser confirmadas automaticamente por fontes independentes porque a região conta com poucos elementos de organizações externas, nomeadamente humanitárias, da ONU ou do Crescente Vermelho.
Todavia, citado pela agência de notícias norte-americana, Associated Press (AP), o porta-voz de Abyi Ahmed, questionado sobre esta ofensiva, disse apenas, laconicamente, que o Governo de Adis Abeba vai "continuar a enfrentar e neutralizar os ataques da FPLT seja em Amhara, seja noutra qualquer região do país".
Estes combates intensificam-se quando Ahmed assume o seu segundo mandato de cinco anos como primeiro-ministro, embora já tenha perdido a áurea de pacifista que ganhou com o Nobel da Paz em 2019, e, com isso, uma vaga acentuada de críticas à sua acção da comunidade internacional.
Mas este segundo mandato, que saiu da vitória do seu Partido da Prosperidade (PP) nas eleições legislativas de Junho último, significa que o país ainda vê nele a solução para os problemas que enfrenta, desde logo esta guerra que ameaça tornar-se um novo longo conflito a envolver a Etiópia.
Para já, como a ONU tem documentado, este conflito á provocou a morte, directamente, ou pela fome que surgiu no seu rasto, a milhares de pessoas, estando ainda largas centenas de milhares à beira da morte em campos de refugiados onde a ajuda internacional não chega devido à guerra.
Isto, porque, depois de a FPLT er, de faco, repelido as forças de Ahmed do seu território, o conflito descaiu para as vizinhas províncias de Amhara e Afar, com o Exército a manter uma espécie de bloqueio humanitário não oficial a Tigray, o que pode estar a sentenciar milhares de crianças, mulheres e idosos à morte...