Mesmo com o empenho dos Estados Unidos, o maior aliado de Israel, a quem fornece financiamento e armamento que faz deste país uma potência militar sem paralelo na região do Médio Oriente, Benjamin Netanyhau, o primeiro-ministro israelita, acaba de anunciar que a guerra vai continuar até que o Hamas seja totalmente destruído e os prisioneiros israelitas em Gaza sejam libertados.

Esta recusa de baixar as armas através de um cessar-fogo, como toda a comunidade internacional está a pedir, e o chefe da diplomacia dos EUA, Antony Blinken, que está pela 5ª vez na região em quatro meses, é justificada por Netanyahu com as condições exigidas pelo Hamas, que passam por três etapas: saída das tropas israelitas de Gaza e a libertação por etapas de todos os prisioneiros israelitas e uma parte substantiva dos palestinianos nas prisões israelitas, abertura das fronteiras à ajuda humanitária e a definição de um plano para a reconstrução do território.

O chefe do Governo de Telavive veio dizer, quando Blinken ainda está na região, e depois de com ele se reunir, que as condições do Hamas, que são bem vistas pelos restantes negociadores, além dos EUA, o Qatar e o Egipto, apenas permitem que a ameaça terrorista sobre Israel se mantenha a partir de Gaza.

Benjamin Netanyhau, depois de repetir que o objectivo desta operação das Forças de Defesa de Israel (IDF) em Gaza, que começou após 07 de Outubro, quando os combatentes do Hamas invadiram o sul de Israel e deixaram um rasto de destruição e 1200 mortos pelo caminho, é destruir totalmente este "grupo terrorista e libertar os reféns" levados pelo Hamas para Gaza naquele dia.

"De maneira nenhuma podemos aceitar que a Faixa de Gaza continue a ser governada por um grupo terrorista que ameaça directamente a segurança de Israel e dos israelitas", disparou Netanyhau, apertando de novo o gatilho para dizer que as IDF só vão dar por terminada a operação em Gaza quando o Hamas deixar de ser uma ameaça, seja qual for a perspectiva que se olhe para essa garantia.

Este desfecho para um duro e longo processo negocial, que se achava que seria levado a bom porto, apesar das dificuldades, segundo vários analistas citados pelos media internacionais, é que a linha mais radical do Governo de Netanyahu, o mais extremista dos Governos israelitas deste a fundação do país, em 1948, suportado por partidos religiosamente ultra-ortodoxos, sionistas e de extrema-direita ideológica, acabou por se impor sob ameaça de retirar o apoio parlamentar ao Likud, o partido maioritário da coligação.

Com isto, Benjamin Netanyhau, apesar de a isso ter sido, forçado pelos extremistas do seu Governo, entre estes destacam-se Yariv Levin, ministro da Justiça, Yoav Galant, da Defesa, ou o das Finanças Bezalel Smotrich, entre outros, que defendem, por exempo, a expulsão de todos os palestinianos da Palestina, a expansão dos colonatos ou ainda o abate indiscriminado de civis em Gaza, deu mais uma machadada no prestígio da diplomacia norte-americana, que apostava num acordo definido durante esta visita de Blinken à região.

Isto, porque, também nas quatro anteriores deslocações ao Médio Oriente, Blinken anunciará como objectivo reduzir as tensões, aumentar a ajuda humanitária a Gaza e exigir a Israel medidas para reduzir o número de vítimas civis, embora o cessar-fogo nunca tenha sido uma exigência de Washington, tendo, em todas elas, acontecido precisamente o contrário, com excepção para um ligeiro incremento da ajuda humanitária.

E por detrás deste desfecho estão, claramente, os radicais do Governo de Netanyhau, que não valem apenas pelas suas posições sobre a Palestina e sobre o conflito, são especialmente relevantes porque sem o apoio dos seus pequenos partidos extremistas, o Governo liderado pelo Likud cairia logo depois.

E Netanyhau é um dos principais interessados em prolongar a tensão, mesmo com um cessar-fogo, porque a sua vida política em Israel voltaria, sem a condição de país em guerra, a estar na corda bamba, essencialmente por duas razões: porque voltaria a ter de lidar com as graves acusações de corrupção e peculato que contra si correm na justiça, e porque vai ter, como o próprio já admitiu, que dar explicações sobre o estanho conjunto de condições de excepcional falhanço da segurança que proporcionou a operação do Hamas a 07 de Outubro sobre o sul de Israel.

Nessas circunstâncias ainda por explicar, somam-se factos como as três estruturas de segurança e intelligentsia, como a Mossad, secreta externa, o Shin Bet, secreta interna, e a Aman, a secreta militar, tidas como das melhores do mundo, terem falhado ao mesmo tempo, a par da panóplia de tecnologia de ponta da rede de vigilância electrónica da fronteira com Gaza, que também não deu conta do recado...

Para manter estes temas fora da agenda política interna, Netanyhau está a apostar numa táctica que lhe pode vir a ser fatal, porque está a desafiar de forma directa os seus principais aliados ocidentais, entre estes os Estados Unidos, onde o momento político, vésperas de eleições Presidenciais, está a deixar o Presidente e candidato pelos democratas, Joe Biden, sem margem de manobra perante uma crescente adesão popular às críticas a Israel baseadas na chacina de civis em Gaza, que está a ganhar dimensões insuportáveis, mesmo nos EUA, país que é, tradicionalmente, aliado incondicional de Telavive.

Mesmo antes desta nova humilhação da diplomacia norte-americana, na forma de balde de água fria sobre as negociações do cessar-fogo, quando já se pressentia no ar a chegada do fim das hostilidades, Joe Biden tinha dado um sinal sério de estar no limite da paciência com as tácticas israelitas, ao aplicar sanções económicas e burocráticas, como o fim dos vistos para os EUA, por exemplo, a lideres dos colonatos ilegais na Cisjordânia, que têm sido uma fonte de violência armada sobre as populações palestinianas locais indefesas.

Agora, perante este cenário, como vai Joe Biden responder aos crescentes manifestantes que invadem as suas acções de campanha a exigir o fim das atrocidades em Gaza, pedindo ao Presidente norte-americano que imponha condições ao Governo israelita, cujas armas que usa em Gaza são fornecidas por Washington, bem como é igualmente real o apoio financeiro aos custos da guerra.

Sem linha de fuga visível, Antony Blinken, em Israel limitou-se a admitir que "ainda há muito trabalho para fazer" mas mostrou-se confiante de que vai ser possível avançar no processo de libertação dos detidos israelitas pelo Hamas em Gaza, que se pensa serem ainda cerca de 140, dos mais de 200 inicialmente levados do sul de Israel para o território no dia 07 de Outubro.

Entretanto, em Gaza, a destruição e morte soma e segue, com o avanço agora da incursão israelita para o sul do território, incidindo os ataques nas cidades de Khan Younis e Raffah, deixando de norte para sul um resto de destruição que se mede por mais de 28 mil mortos, 70 mil feridos, entre o conjunto, mais de 70% crianças e mulheres, numa população de 2,3 milhões de pessoas confinadas a uma geografia de 365 kms2 compreendida numa faixa de 40 kms por nove de largura, onde mais de 1,2 milhões vivem actualmente sem tecto e a fome, a falta de água potável, de medicamentos e as doenças infecciosas ganham dimensão a cada hora que passa.

A isto, juntam-se recordes macabros como a morte de mais de 150 jornalistas, muitos deles alvejados deliberadamente pelas IDF, a morte de mais de 200 funcionários da ONU ao serviço da agência para os refugiados da Palestina (UNRWA), que viu os aliados ocidentais de Israel - EUA, Alemanha, Reino Unido, Itália... - deixarem de a financiar depois de Telavive acusar 10 dos seus mais de 30 mil colaboradores de terem pactuado com o Hamas na operação de 07 de Outubro sem terem sido apresentadas quaisquer provas, mas afectando de morte o trabalho desta indispensável organização humanitária.