O Secretário-Geral da ONU, António Guterres, com ar sofrido de impotência, foi ao púlpito da 79ª Assembleia-Geral da ONU, em Nova Iorque, dizer que o "inferno está à solta no Líbano", que é o mesmo que dizer que Israel continua sem travão a espalhar a morte e a destruição.
"Não podemos deixar de nos alarmar com a escalada no Líbano, um país à beira do abismo", clamava impotente Guterres do alto da tribuna, nesta quinta-feira, 26, durante os trabalhos da 79ª AG das Nações Unidas, que vão, nas próximas horas, receber o primeiro-ministro israelita.
Benjamin Netanyhau, que, se António Guterres estiver certo nas suas palavras, e as imagens em directo nas tvs demonstram estar, então, na mesma dimensão metafórica, é o diabo que vai estar a falar do mesmo lugar do Secretário-Geral e a defender a continuidade da mortandade.
Isto, apesar de sobre ele penderem mandatos de captura internacionais emitidos pelo Tribunal Penal Internacional (TPI), o mesmo que quer ver detido o Presidente russo, Vladimir Putin, e que está a levar para o Líbano a mesma destruição que se viu em Gaza.
Território onde já foram mortas mais de 41 mil pessoas, na maior parte mulheres e crianças, um cenário que o português que chefia a ONU não quer ver "repetido no Líbano" mas que Benjamin Netanyhau já disse que é precisamente o que vai acontecer.
Porque se em Gaza a ideia era, até agora sem sucesso, aniquilar o Hamas, no Líbano é destruir o Hezbollah, se em Gaza foi preciso destruir mais de 80% dos edifícios do território, o mesmo está para acontecer no sul do Líbano, e se tiverem de morrer mais dezenas de milhares de inocentes, como frisou Netanyhau, a culpa é deles.
Isto, porque, explicou o primeiro-ministro israelita, as populações civis "têm de impedir o Hezbollah de as usar como escudos humanos", mesmo que Israel, nesta lógica, os possa matar sem estribos para pressionar o Hezbollah...
"O Líbano não se pode transformar noutra Faixa de Gaza", clama António Guterres horas antes de do mesmo lugar, Netanyhau, ir tentar explicar ao mundo que tudo o que o seu país faz "é em legítima defesa".
A mesma legítima defesa que os seus aliados ocidentais, do Presidente dos EUA, Joe Biden, aos europeus, quase todos, dizem que Israel tem paa se defender dos "terroristas" do Hamas e do Hezbollah, enquanto um fluxo ininterrupto de armas norte-americanas segue para Telavive sem limites.
Mas Washington, publicamente, mantém o discurso de que exige um cessar-fogo", tendo mesmo, agora, proposta, com os seus aliados europeus, uma paragem nos ataques de 21 dias...
A resposta do mais robusto aliado dos norte-americanos no Médio Oriente foi imediata e clara: nem pensar, porque "é preciso destruir o Hezbollah", é preciso "esmagar o Hezbollah", sendo que essa resposta de Netanyhau foi, seguramente, imposta pelos seus parceiros mais radicais da coligação que lhe permite governar Israel e manter-se no poder que o protege dos processos judiciais e do julgamento das urnas de voto.
"Esmagar o Hezbollah"
Os parceiros, de linha mais dura, da coligação de direita do primeiro-ministro israelita rejeitaram as propostas dos Estados Unidos e da França para um cessar-fogo de 21 dias no Líbano, avança a agência Lusa.
Netanyahu, que viajou para os EUA, para discursar nas Nações Unidas, afirma ter instruído o Exército a continuar a combater
O ministro das Finanças israelita, o ultranacionalista Bezalel Smotrich, rejeitou qualquer ideia de um cessar-fogo com o grupo xiita libanês Hezbollah, após um apelo internacional para uma trégua de 21 dias.
"A campanha militar no Norte deve terminar de uma única forma: esmagando o Hezbollah e eliminando a sua capacidade de prejudicar os habitantes do norte de Israel", escreveu Smotrich nas redes sociais, segundo a agência francesa AFP.
Numa declaração patrocinada por Estados Unidos e França, a União Europeia (UE) e vários países árabes pediram um "cessar-fogo imediato de 21 dias na fronteira entre o Líbano e Israel para dar uma oportunidade à diplomacia".
A declaração, divulgada na quarta-feira à noite por Washington, foi subscrita por Estados Unidos, França, UE, Austrália, Canadá, Alemanha, Itália, Japão, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Qatar.
O apelo foi divulgado após um recrudescimento dos combates entre Israel e o Hezbollah, grupo que tem o apoio do Irão.
As duas partes têm trocado tiros na fronteira israelo-libanesa desde o início da ofensiva israelita em Gaza, há 11 meses, que foi desencadeada por um ataque do Hamas palestiniano em Israel.
Milhares de residentes dos dois lados da fronteira tiveram de fugir dos locais de residência devido aos combates, que aumentaram significativamente esta semana e levaram ao apelo para uma trégua, dado o receio de um conflito alargado.
"Não se deve dar tempo ao inimigo para recuperar dos golpes violentos que recebeu e para se reorganizar para continuar a guerra ao fim de 21 dias", respondeu Bezalel Smotrich.
"Rendição do Hezbollah ou guerra. Esta é a única maneira de trazer o povo do Norte para casa e trazer segurança para esta região e para todo o país", acrescentou o ministro das Finanças israelita.
Smotrich é um dos principais aliados de extrema-direita da coligação do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu.
Na mesma linha, a ministra das Missões Nacionais e dos Colonatos, Orit Strock, do partido de Smotrich, disse, citada pela Lusa, que "não há mandato moral para um cessar-fogo, nem por 21 dias nem por 21 horas".
"O Hezbollah transformou o Líbano num barril de pólvora", afirmou nas redes sociais, segundo a agência espanhola EFE.
Strock apelou a Netanyahu para que "não repita os erros do passado" e não pare enquanto Israel não resolver a situação militarmente.
Também o ministro do Património, Amichai Eliyahu, afirmou que os esforços para alcançar um cessar-fogo são uma "hipocrisia perigosa".
"Não entregaremos a nossa segurança em troca de uma falsa paz", disse o ministro, membro do partido de extrema-direita Otzma Yehudit.
O líder da oposição, Yair Lapid, defendeu que o Governo deveria aceitar a proposta, mas "apenas por sete dias", para "não permitir que o Hezbollah restabeleça os seus sistemas de comando e controlo".
"Não aceitaremos qualquer proposta que não inclua a eliminação do Hezbollah da nossa fronteira norte", afirmou Lapid nas redes sociais, citado pela EFE.
Lapid defendeu ainda que "qualquer proposta que seja apresentada deve permitir que os residentes do Norte regressem imediatamente e em segurança às suas casas".