A situação estava, às primeiras horas desta quinta-feira, 19, bastante melhor que no final da tarde de quarta-feira, 18, mas, ainda assim, continuavam no terreno cerca de 5.000 bombeiros a combater 130 focos de incêndio, a maior parte controlados mas ainda activos.
Portugal foi, por estes dias, palco da demonstração de que a solidariedade europeia e regional pode funcionar, porque, além dos 8 aviões pesados de combate às chamas enviados pelos "colegas" de Portugal na União Europeia, Espanha, Grécia, França e Itália, ainda estão nos céus do país dois Canadair marroquinos, e mais de 200 bombeiros espanhóis que levaram consigo quase 80 carros de combate aos incêndios florestais.
Os distritos de Aveiro, Viseu, Porto, Coimbra e Vila Real, que correspondem em Angola, grosso-modo, à área administrativa da província, foram os mais afectados por esta avalanche de fogo que varreu o Centro/Norte de Portugal, havendo, segundo as autoridades portuguesas citadas pelos media locais, ainda dezenas de aldeias que continuam a merecer cuidados especiais das equipas no terreno.
Até ao momento não há registo de angolanos a residir no país afectados directamente pelas chamas, mas a preocupação é grande, como o demonstra a necessidade de muitos deles usarem as redes sociais para sossegarem parentes e amigos em Angola e noutras regiões de Portugal.
Segundo o Governo português, com a descida substantiva da temperatura nesta quinta-feira, 19, que é acompanhada por uma drástica redução da intensidade do vento vindo do Leste, do interior da Península Ibérica, geralmente quente e seco, e a chegada dos ventos marítimos, espera-se que até ao final do dia deixe de haver localidades em risco e o "exercito" de bombeiros possa, finalmente, descansar.
Mas se as chamas se extinguem com esta mudança do quadro climatérico, e o esforço dos bombeiros no terreno, dos portugueses e dos vizinhos europeus e africanos, no mesmo sítio de sempre fica a polémica aposta do país naquilo a que em tempos era oficialmente, porque assim foi "baptizado" por um ministro da Agricultura, "petróleo verde", que é o eucalipto.
O eucalipto, árvore que não é autóctone, é usada há décadas como monocultura em vastas regiões de Portugal porque o seu rápido crescimento alimenta as lucrativas indústrias das celuloses, desde a pasta de papel às fibras para a indústria têxtil, passando pela indústria química dos plásticos.
Só que, com essas qualidades, essencialmente o crescimento rápido, vem o exponenciado risco ambiental, porque as áreas onde é intensivamente plantado, transformam-se em desertos de biodiversidade e as suas cascas e folhas projectam fagulhas a longas distâncias, porque, nas regiões de onde é natural, como a Austrália, o fogo é um elemento essencial ao seu crescimento e reprodução, mas que em Portugal é apenas um fortificado combustível para alimentar fogos florestais.
Fogos esses que têm marcado a vida do país com centenas de mortos na última década, tendo os famosos incêndios de 2017 provocado 66 mortos em apenas um dia, ganhando o famigerado estatuto do mais letal de sempre no longo histórico dos fogos florestais neste país.
Desde então, já morreram mais cerca de duas dezenas de pessoas, entre civis e bombeiros, balanço trágico para o qual contribuiu o actual momento, onde já morreram sete pessoas, seis bombeiros e um civil.
E, apesar deste quadro nefasto, o que se passou a seguir só pode ser considerado negligência, como acusam vários analistas, porque nada foi feito para acabar com este cíclico fenómeno de morte e destruição, especialmente na essencial redução da área dedicada ao eucalipto devido ao lobby poderoso da indústria das celuloses que tem uma gigantesca influência na condução das políticas públicas para a floresta.
Citado pela RTP, a televisão estatal portuguesa, Pedro Lopes, especialista em Segurança de incêndios, considera que as medidas que deveriam ter sido adoptadas para evitar incêndios florestais ficaram por aplicar.
"A floresta está bem pior do que estava em 2017 nas mesmas zonas que arderam nessa altura", considerou em entrevista ao Telejornal da RTP.
O perito reconhece que houve algumas melhorias a nível da limpeza das florestas, mas tal não basta para evitar este tipo de incêndios.
Perante a evolução da climatologia do país, Pedro Lopes estima que "o futuro será sempre pior" e considera que é cada vez mais importante adoptar "medidas estratégicas e de longo prazo".
No entanto, como notam outros especialistas, parece em todas as políticas possíveis de adoptar, nunca é referido o problema do eucalipto, uma árvore perigosa e totalmente inadequada para um país como Portugal, que é um dos mais afectados pelas alterações climáticas em todo o sul da Europa e um dos mais expostos em todo o mundo.