O Presidente angolano, que é o actual líder da Conferência Internacional para a Região dos Grandes Lagos (CIRGL) e que foi, neste fim-de-semana, denominado pela União Africana, em Malabo, Guiné-Equatorial, como "Campeão da paz e da reconciliação em África", é assim chamado a exercer a sua influência enquanto "pacificador" na busca de uma solução para o diferendo entre o Ruanda e a RDC, países que estão à beira de uma ruptura completa das relações bilaterais, como o Novo Jornal noticiou aqui e aqui.
Esta deslocação de Tshisekedi ao Palácio da Cidade Alta, anunciada à última da hora, acontece depois de a liderança rotativa senegalesa da União Africana, pelo Presidente Macky Sall, que esteve em Luanda na passada semana, ter colocado os líderes ruandês e congolês a dialogar para evitar uma escalada que poderá desestabilizar a já de si instável situação neste xadrez regional que são os Grandes Lagos.
Sall elogiou os dois líderes pela franca conversa que com eles manteve e pelo seu empenho na procura de uma saída pacífica para o problema, mas não foi anunciado qual o passo seguinte, nem se ficou definido o quadro de um eventual acordo para acabar com as hostilidades, quando o momento é de clara ruptura diplomática.
Agora, com este encontro com João Lourenço em Luanda, sendo possível que o Palácio da Cidade Alta receba igualmente nos próximos dias o Presidente do Ruanda, Paul Kagame, Tshisekedi fecha o ciclo de contactos com os líderes regional, da CIRGL, e pan-africano, da União Africana, quando a situação na fronteira entre a RDC e ao Ruanda é já um dos pontos mais escaldantes em todo o continente africano pelo que representa se evoluir para um conflito aberto.
O que ficou decidido nesta conversa entre Lourenço e Tshisekedi foi pouco divulgado, além do habitual momento de declarações de circunstância à imprensa, mas o contexto para o problema que está sobre a mesa é fácil de explicar e complexo de resolver: a RDC acusa o Ruanda de dar guarida e apoiar os guerrilheiros do M23 que há meses protagonizam violentos ataques às unidades militares das Forças Armadas da RDC (FARDC) na província do Kivu Norte, no leste congolês.
Para já, depois de cerca de dois meses de intensos combates entre o M23 e as FARDC, apoiadas pelas unidades de combate da MONUSCO, a missão da ONU na RDC, cuja definição é de apoio à paz e ao combate militarizado aos grupos de guerrilha, com graves acusações mútuas, a RDC de que o Ruanda apoia os guerrilheiros, e o Ruanda de que a RDC tem disparado tiros de artilharia para o seu território, o Governo de Kinshasa proibiu, este Sábado, a companhia aérea RwandAir de usar o espaço aéreo congolês, em mais um passo rumo à ruptura total.
Uma das soluções preconizadas e em discussão nos corredores diplomáticos é a chamada à acção pelos dois países do Mecanismo Conjunto de Verificação Alargado (MCVA), criado em 2012 para responder rapidamente a situações de dificuldade de comunicação com potencial de conflito entre membros da CIRGL, que tem como líder, no momento, o coronel José Rui Miranda, das FAA.
Também o M23 foi constituído em 2012 por elementos maioritariamente de etnia Tutsi, a minoria ruandesa que foi alvo de um genocídio em 1994 - morreram mais de 800 mil pessoas - às mãos das maioria Hutu.
Uma das questões que podem derrapar de vez a já fraca estabilidade das relações entre Kigali e Kinshasa foi a detenção de dois soldados ruandeses pela RDC quando faziam uma ronda de patrulha pela sua fronteira comum.
A RDC acusa directamente o Ruanda de estar a apoiar o M23 de diversas formas, nomeadamente dando guarida aos rebeldes no seu território, onde organizam investidas sobre o território do Kivu Norte, atacando aldeias e aquartelamentos das FARDC/ONU.
Nestes últimos dias tudo parece estar a desmoronar-se e a tensão a subir, facto que é visível na imprensa dos dois países, com títulos agressivos, especialmente do lado congolês, podendo ler-se, na síntese dos media feita pela Radio Okapi, suportada pelas Nações Unidas,
O jornal "Le Potentiel" diz que "às máscaras caíram na linha da frente", referindo-se ao Ruanda, referido como o "grande inimigo da paz", enquanto "La prospérité", seguindo a mesma visão anuncia "medidas draconianas" para restabelecer a paz no leste da RDC e "garantir a soberania territorial" e o "L"Avenir" sublinha que a RDC e o Uganda, "apesar do problema entre a RDC e o Ruanda", mantiveram sem alterações a abertura de um Fórum Económico em Kinshasa, sublinhando as boas relações entre Kinshasa e Kampala, destacando que o Presidente Felix Tshisekedi "aposta na promoção da paz" e não na aceleração de conflitos entre vizinhos.