À MONUSCA está a ser exigido pelas populações que deixe de imediato o país porque, apesar de ser a mais cara missão da ONU em África, com mais militares e pessoal ao seu serviço, e com um estatuto especial que lhe permite integrar acções de combate contra as várias guerrilhas que desde a década de 1990 espalham o terror no leste da RDC, a sua presença não está a conseguir minimamente os objectivos.

Na primeira reacção a estes tumultos, a ONU já veio dizer que os atacantes às suas instalações, de onde resultaram vários mortos, incluindo capacetes azuis, podem ser acusados de crimes de guerra.

E, no âmbito dos protestos que emolduram a exigência popular de abandono da MONUSCO do país, que foi fomentada inicialmente por um grupo de políticos radicais em Kinshasa, ligados à oposição ao Governo do Presidente Félix Tshisekedi, que chegou ao poder, em 2018, com a promessa de debelar o problema das guerrilhas como uma das suas prioridades, já morreram perto de 20 pessoas, entre as quais três elementos da missão e pelo menos 17 populares , em resultado da acção directa dos protestos ou de ferimentos que vieram a ser, posteriormente, fatais.

Os ataques populares começaram no fim-de-semana em Goma, cidade do Kivu NOrfte, que a par do Kivu Sul e Ituri, são as províncias mais afectadas tanto pela acção dos grupos armados como destes ataques às suas fortificações por milhares de jovens cansados da sua presença inútil na região.

Uma das críticas mais ouvidas, segundo relatos dos jornalistas das agências de notícias no local, é que em mais de 20 anos - a MONUSCO foi criada em 1999 - não se percebem quaisquer resultados da sua acção e, com os recentes ataques dos rebeldes do M23, que há semanas espalham o terro, de novos, na região, a inoperância dos "capacetes azuis" ficou ainda mais exposta.

O M23 voltou, ao fim de largos anos de inactividade, a emergir com especial violência no leste congolês, levando Kinshasa a acusar o Ruanda de estar a apoiar logisticamente estes guerrilheiros com o intuito de, através deles, obter benefícios da exploração ilegal dos vastos recursos naturais ali existentes, desde logo os diamantes, ouro e, especialmente, o coltão, um mineral estratégico de grande interesse comercial pelas suas características únicas no sector das novas tecnologias de comunicação e informática.

Este diferendo grande entre a RDC e o Ruanda levou mesmo a mais uma intervenção do Presidente angolano, João Lourenço, que nos últimos meses - ver aqui e aqui - se colocou como ponte entre os dois litigantes, procurando um entendimento que viabilize uma saída pacífica para aquilo que tem tudo para ser um catastrófico confronto militar entre dois vizinhos dos Grandes Lagos.

Os protestos, que tiveram início em Goma, rapidamente chegaram a Butembo, outra das grandes cidades do leste congolês, com as Forças Armadas da RDC (FARDC) a mostrarem incapacidade total para conter os protestos populares.

Alguns analistas inserem estes protestos numa estratégia mais vasta que visa a retirada da MONUSCA do leste da RDC para que os interesses de longo termo dos vizinhos, Ruanda e Uganda, que desde sempre mantêm um ruidoso silêncio sobre as suas verdadeiras intenções, sejam conseguidos, o que pode passar, ou por uma exploração desenfreada dos recursos do subsolo congolês sem interferências, ou pela tomada de territórios aproveitando a ausência de Estado em vastas áreas, onde nem sequer as FARDC têm acesso.

A colaboração entre as FARD e as forças da MONUSCA foi, apesar de nalguns momentos, frutuosa, quase sempre tensa e ineficaz devido às fragilidades do Estado congolês, subterrado em corrupção e falta de cadeias de comando sólidas no seu Exército, especialmente nos destacamentos mais distantes da capital e onde, segundo vários relatórios de organizações internacionais, a actividade ilegal do garimpo gera riqueza que permite pagar avultadas quantias para corromper os militares para ignorarem o que os circunda.

Recorde-se que a par da actividade das guerrilhas tradicionais na região leste do Congo, que ali se instalaram com maior expressão após o genocídio do Ruanda, em 1994, quando a maioria Hutu ceifou a vida a mais de 800 mil tutsis, especialmente as Forças Democráticas de Libertação do Ruanda (FDLR) e a Aliança das Forças Democráticas (ADF), do Uganda, bem como o M23, que conta com apoios do Ruanda e do Uganda e tem um propósito estratégico de servir de ferramenta para as actividades ilegais que há décadas ali ocorrem, existe agora um fenómeno novo que é a chegada ao terreno dos homens do "estado islâmico", que tomaram conta do comando das ADF ugandesas, levando mesmo os bispos católicos do país, CENCO, a chamar à atenção do mundo para este problema.