Depois de parar a corrente de lava que, de Sábado, 21 de Maio, para Domingo, queimou centenas de habitações nas imediações de Goma, destruindo estradas e o aeroporto local, de forma parcial, levando largos milhares de pessoas a fugir com pouco mais que a roupa do corpo, estando ainda por encontrar dezenas, os cientistas acabam de revelar que o vulcão Nyiragongo está longe de ter voltado a adormecer e o pior pode estar para vir.

Isto, porque o rio de lava que inicialmente escorreu do seu cone vulcânico, depois deste colapsar, divergiu para o subsolo onde formou uma torrente subterrânea que continua, ainda hoje, incandescente e a avançar para a cidade de Goma e para o Lago Kivu, a escassos quilómetros do Monte Nyiragongo.

Na cidade, o risco, segundo estão a admitir os cientistas que no local monitorizam a evolução deste fenómeno, é de colapso do solo e de parte desta ser arrastada para o rio de lava, cujos efeitos, se tal suceder, estão a ser minimizados com a evacuação de milhares de pessoas pelas autoridades, mas o pior é se a lava, como parece ser o caso, avançar para o Lago Kivu, um dos maiores da região dos Grandes Lagos.

Tal como outros lagos africanos, o Kivu é um depósito de poluentes letais como o CO2 e o metano, que podem ser libertados em quantidades gigantescas caso a lava atinja as suas águas mais profundas e, com o aquecimento, esses gases mortíferos, sejam libertados para a atmosfera.

As consequências de um acontecimento desta natureza para os milhões de pessoas que habitam as suas margens, incluindo Goma, que ficariam imersas numa sufocante e mortal nuvem de metano e de CO2, são incalculáveis, mas há uma referência que pode ser usada para medir aproximadamente um cenário desta natureza, porque já aconteceu, embora num lago de muito menor dimensão e profundidade.

O Lago Nyos, nos Camarões, foi alvo de uma erupção límbica, que é a explosão das bolhas de CO2 acumulada nas profundezas, em Agosto de 1986, asfixiando até à morte 1.700 pessoas e destruindo grande parte da vida animal nas imediações.

Esta erupção límbica, nos Camarões, resultou de uma deslocação de terras da montanha para o lago, o que gerou a libertação dos gases que formaram uma densa e letal nuvem tóxica que se espalhou para as aldeias vizinhas.

O problema maior é que o Lago Kivu é incomparavelmente maior que o Nyos, contendo armazenadas quantidades igualmente incomparáveis de CO2 e outros gases, como o metano, bem como a ignição desta eventual erupção ser de natureza mais catastrófica, como o é a torrente de lava incandescente em direcção às águas profundas do Lago Kivu.

Os especialistas estimam estarem concentrados 300 km"s cúbicos de gás letal, invisível e sem odor, o que permite apanhar as pessoas de surpresa e sem fuga possível, porque sendo mais denso que o ar, este afasta o oxigénio tomando o seu lugar.

Para já, como advertem os cientistas, e as autoridades congolesas, através do Observatório do Vulcão de Goma (OVG), ninguém pode avançar se e quando tal fenómeno ocorrerá, mas sabe-se que pode suceder, como já aconteceu outras vezes em lagos africanos, sendo que o Lago Kivu, com 475 m de profundidade máxima e 2.700 km"s quadrados, é muito maior que o Nyos, onde isto sucedeu, que tem apenas 240 m de profundidade máxima e menos de 2 kms quadrados.

Ainda por cima, o Lago Kivu, que abraça ainda o Ruanda, é fortemente povoado nas suas margens e tem uma cidade, Goma, com 2 milhões de habitantes, nas proximidades, a cerca de 10 kms, o que faz com que seja impossível antecipar as consequências ou preveni-las totalmente através da evacuação de tanta gente para uma distância segura, que, na verdade, ninguém sabe qual seria essa distância de segurança.

Actualmente, de acordo com relatórios oficiais, a lava está a correr sob a cidade de Goma e aproxima-se das margens do Lago Kivu, embora com diferentes impetuosidades, sendo a esperança das autoridades locais que este fluxo seja travado por causas naturais visto que não há nada que seja humanamente viável fazer para conseguir estancar este rio subterrâneo.

Mas há ainda outro perigo subjacente a esta erupção, que é, como advertem igualmente os técnicos que acompanham esse fenómeno, a possibilidade de altas concentrações de metano na atmosfera, libertadas do fundo do lago pela lava ou pelos constantes tremores-de-terra, poderem começar a arder, como já estáa suceder em pequenas dimensões (na foto) e dizimar todos os seres vivos que se encontrem nesses locais, o que faz com que quase nenhuma área da região mais próxima do lago seja segura a 100%.

Para acudir às cerca de 500 mil pessoas que deixaram a cidade de Goma, a agência da ONU para os refugiados já lançou um apelo urgente de ajuda internacional de forma a garantir que milhares de crianças e idosos possam ser apoiados face à iminência de fome em que se encontram.