Se o plano de paz do Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, exige a saída incondicional das forças russas dos territórios ocupados na Ucrânia, a proposta de Vladimir Putin é diametralmente oposta.

O chefe do Kremlin exige que a Ucrânia abandone a parte das quatro províncias que a Rússia anexou em 2022 que ainda não controla, que são, no sul, Kherson, onde Kiev ainda controla cerca de 35% do território, Zaporizhia, menos de metade é controlada pelos russos.

E no Donbass, Donetsk, onde os russos só controlam perto de 60% e Lugansk, onde apenas falta a Moscovo ocupar uma pequena parte do território, menos de 4%.

Recorde-se que a Rússia anexou estas quatro regiões em 2022 após referendos que ganhou de forma avassaladora mas que a comunidade internacional não reconhece, e em 2014 tinha feito o mesmo com a Crimeia, no rescaldo do golpe de Estado que o Kremlin diz ter sido financiado e organizado com o apoio dos EUA, que afastou do poder o Presidente pró-russo Viktor Yanukovych.

Depois dessa anexação, ilegal, na perspectiva de Kiev e dos seus aliados ocidentais, mas já parte integral da Federação Russa na perspectiva de Moscovo, Putin entende que é a Ucrânia que está a ocupar ilegalmente parte dos seus territórios da Novorossiya, denominação histórica desta parte do sudoeste russo/ucraniano.

Com esta proposta, o Presidente russo pretende manipular a Cimeira na Suíça, retirando protagonismo a Volodymyr Zelensky e ao seu plano de paz em 10 pontos, que, além da saída das forças russas das áreas ocupadas, pretende ainda impor a Moscovo a obrigatoriedade de custear a reconstrução do país e ainda levar à justiça internacional os líderes russos.

No momento em que anunciou o seu plano de paz para a Ucrânia, numa reunião com diplomatas russos, em Moscovo, onde esteve com o seu ministro dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov, (na foto), Putin insistiu que as cinco regiões anexadas são "definitivamente" parte da Federação Russa.

"E cessaremos de imediato as hostilidades assim que Kiev ordenar a saída das suas tropas dos territórios russo e daremos início a negociações assim que Kiev mostrar estar disponível para conversar e começar por assinalar que desiste oficialmente de aderir à NATO", disse Putin.

Putin acusa há muito os aliados ocidentais de Kiev, nomeadamente EUA e os restantes países da NATO, de estarem a impedir os ucranianos de negociarem com a Rússia uma saída para este conflito. (ver links em baixo nesta página)

E agora veio reiterar, neste encontro na sexta-feira, 14, em Moscovo, que o Kremlin está a "contar com a retirada das forças de Kiev, da declaração de neutralidade (manter-se fora da NATO) e dialogar com a Rússia as condições em cima da mesa e das quais depende a existência futura da Ucrânia".

Essa Ucrânia será um país "independente e baseado na realidade corrente e guiado pelos verdadeiros interesses dos ucranianos e não dos interesses dos países ocidentais que comandam Kiev".

Putin não aceita o congelamento do conflito, como chegou a ser, embora de forma sibilina, pelo ocidente, porque isso, explicou, permitiria aos Estados Unidos e aliados reconstruírem e rearmarem as forças armadas ucranianas para reatar o conflito, sendo que as condições de paz agora propostas terão de ser consolidadas por um acordo internacional, que incluirá o levantamento de todas as sanções a Moscovo.

As reacções a este plano russo para a paz na Ucrânia foram imediatas e, nos EUA, o secretário da Defesa, Lloyd Austin, disse clara e inequivocamente que Moscovo não pode nem poderá ditar as condições de um cessar-fogo ou de um acordo de paz na Ucrânia.

Também o chanceler alemão Olaf Scholz assim pensa, sublinhando que não será Putin a definir os contornos da paz na Ucrânia e que essa será definida pelos ucranianos.

Porém, os analistas dividem-se sobre as intenções de Putin, que podem ser de "implodir" a Cimeira de Paz na Suíça, que está agendada para este fim-de-semana, Sábado e Domingo, e que tem como pilar de referência o Plano de Paz de Zelensky que o Kremlin já disse ser inútil e sem sentido.

Isto, porque, como sucedeu em todos os grandes conflitos da história, os acordos de paz são desenhados pelos vencedores, e, nalguns casos, com intermediação internacional, mas sempre enfatizando os interesses de quem está em vantagem nas trincheiras.

Ora, neste caso, os russos não só estão como afirmam estar em vantagem na frente de batalha e até as chefias militares ucranianas, a Presidência e os seus aliados ocidentais reconhecem que as forças russas estão a avançar, nalguns locais de forma sólida e acelerada, sendo esse, precisamente, o argumento mais usado por Kiev para reforçar os pedidos de apoio militar ao ocidente.

Todavia, existe a defesa da tese de que, com a chegada nos próximos meses de diversos esquadrões de aviões de guerra ocidentais como os norte-americanos F-16 fornecidos por países europeus, ou os franceses Mirage 2000 F5, e ainda as novas remessas de defesas antiaéreas Patriot ou IRIS - T, entre outras, podem mudar o curso deste conflito, diluindo a actual vantagem russa na frente de guerra, onde já conquistou perto de 30% dos territórios ucranianos do leste sudoeste.

Entretanto, isto acontece ao mesmo tempo que ucranianos e suíços se deparam com o falhanço da sua cimeira, à qual, nas últimas semanas, foram desistindo, ou reduzindo a importância das suas delegações para o nível de embaixadores, que é a etapa imediatamente antes do abandono, a generalidade das grandes potências do Sul Global, como a China, a Índia, o Brasil, a África do Sul, o Brasil, a Indonésia... (ver links em baixo nesta página)

E até os Estados Unidos anunciaram que o Presidente Joe Biden não estaria presente porque iria antes a uma iniciativa de recolha de fundos para a sua campanha às eleições de Novembro, enviando no seu lugar a vice-Presidente Kamala Harris, que é a figura mais apagada da sua Administração.