Enquanto uma das partes envolvida na guerra, Federação Russa, que não foi convidada pelo Governo suíço, referiu-se já há meses a esta iniciativa ucraniana-suíça como "uma palhaçada" sem utilidade.
Com o passar das semanas, a adesão a esta iniciativa foi-se reduzindo ao núcleo duro dos mais férreos aliados de Kiev, desde logo os países ocidentais da NATO, onde, apedsar disso, aconteceu a mais pesada "derrota" para Zelensky, que foi o anuncio de que o próprio Presidente dos EUA, Joe Biden, não iria estar presente.
E o pior foi o facto de Joe Biden ter justificado a ausência com uma acção de recolha de fundos, entre centenas a que assistiu e assistirá até às eleições de 05 de Novembro, para a sua campanha, o que é claramente um golpe nas possibilidade de sucesso desta Cimeira.
Alias, Zelensky foi recebendo diversas recusas ao longo do caminho, sendo uma delas a do Presidente angolano, tendo João Lourenço justificado a ausência com "razões de calendário" sem explicações posteriores.
E, depois de ter, na última semana, feito um vídeo onde lançou um apelo quase em desespero para que a China e os EUA se fizessem representar ao mais alto nível, não só viu Washington reconfirmar a prioridade de Biden para a recolha de fundos como a China, por fim, esclareceu que não só não concorda com o "mapa" desta Cimeira como não enviará qualquer delegação.
Este momento foi o passo derradeiro para enfurecer o Presidente Volodymyr Zelensky que, não podendo mostrar o incómodo com a posição do Presidente norte-americano, de quem depende substantivamente para manter o esforço de guerra, virou-se para a China naquilo que foi visto pela generalidade dos analistas como um tiro no pé.
Zelensky, depois de Pequim clarificar a sua posição sobre a Cimeira deste mês, acusou o Presidente chinês, Xi Jinping, de ser "um instrumento nas mãos de Putin" porque, acrescentou, "está a tentar fazer descarrilar a iniciativa em favor de Moscovo".
Sem se referir à recusa do seu principal aliado, o Presidente dos EUA, Zelensky disse, em Singapura, num encontro internacional sobre geoestratégia denominado "Diálogo Shangri-La", que a China é uma ferramenta nas mãos da Rússia.
Naquilo que é claramente uma tentativa de humilhar a China, um colosso global económico e militar, Zelensky disse que Moscovo está a usar a influência chinesa no mundo para fazer descarrilar a Cimeira na Suíça e impedir o seu sucesso.
"É uma vergonha que um país tão grande, poderoso e independente esteja na condição de instrumento nas mãos do Presidente russo", disse o Presidente ucraniano, acusando ainda Pequim de estar a enviar assistência militar para os russos.
Como seria de esperar, Pequim respondeu à desafiante declaração de Zelensky com ponderação e contenção, dizendo que nunca lançou gasolina para as chamas na guerra na Ucrânia.
A porta-voz do ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, Mao Ning, sublinhou que mantém relações importantes com a Ucrânia, sendo mesmo o seu maior parceiro comercial, destacando que a posição de Pequim "foi sempre a mesma e sempre clara e transparente", defendendo o diálogo e as negociações como saída para o conflito.
Em pano de fundo a esta tentativa de Zelensky culpar a China pelo aparente descarrilamento dos seus planos para esta Cimeira, claramente o de apertar o cerco sobre a Rússia, está a sucessão de recusas em participar, como a China, África do Sul, Brasil, Indonésia ou a Arábia Sadita, ou, quando não há recusa directa, há o sublinhado de que se farão representar por delegações de segundas e terceiras linhas de importância política.
Segundo o site suíço swissinfo, dos 160 convites enviados para esta Cimeira, 70 já responderam, sendo que quase todas as confirmações com Chefes de Estado e de Governo, perto de 40, são oriundas da Europa Ocidental.
Se não ocorrerem mudanças significativas no mapa de participações, ficará claro que o objectivo maior desta Cimeira, que era isolar a Rússia, falhou, embora existam já manobras de corredor para relançar uma segunda Cimeira onde a Rússia poderá ser convidada.
A favor dessa possibilidade poderão estar dois factores importantes, a tradução de que a maior parte do mundo, ao recusar estar na Suíça, pretende outro formato para uma Cimeira de Paz, onde os contendores têm de estar presentes para fazer sentido, e o descalabro na linha da frente onde, apesar do ilimitado apoio ocidental, a Ucrânia está a perder posições relevantes para a clara superioridade militar russa.
O que, se tal suceder, finalmente a paz terá uma efectiva oportunidade, porque, independentemente da justiça que uns e outros possam fazer, uma guerra só termina com cedências mútuas e, além disso, os analistas tendem a sublinhar que a maior potência nuclear do mundo não pode ser derrotada sem que a situação descambe para uma hecatombe global nuclear.
E as recentes evoluções no contexto deste conflito podem estar a aproximar o mundo de uma situação limite no que diz respeito ao uso de armas nucleares, porque, mesmo após os avisos carregados dos russos, os países ocidentais estão, um atrás do outro, a autorizar a Ucrânia a usar as suas armas de maior alcance para atacar o território russo em profundidade.
Esta evolução não é apenas importante porque nunca antes, mesmo durante a Guerra Fria, uma das potências, EUA e URSS, tinha fornecido armas para ataques directos ao território da outra, mas sim porque os misseis norte-americanos ATACMS, de longo alcance, ou os britânicos storm shadow e os franceses scapl G são de tal modo sofisticados que o seu uso contra a Rússia só é possível sendo manuseados por especialistas oriundos destes países para o campo de batalha.