Como é sabido, o mundo era então bipolar, ou seja, a influência hegemónica era exercida pelos EUA e ex-URSS, países que haviam saído vitoriosos da Segunda Guerra Mundial, passando a pertencer ao Conselho de Segurança da ONU.
Em resultado deste conflito mundial, estas duas superpotências passaram a sustentar, por razões diferentes, o direito inalienável dos povos à autodeterminação e independência, princípio que foi consagrado no art. 78.º da Carta da ONU.
No que respeita aos EUA, a defesa desse direito resultava do facto de ele ter sido uma colónia da Inglaterra que se autodeterminou e, no caso da ex-URSS, por princípios decorrentes do próprio regime.
Não admira, por isso, que as ex-colónias africanas viessem a alcançar o reconhecimento das respectivas independências, desde logo com a independência do Gana, em 1957.
O mundo bipolar, ao dar lugar na Europa a uma "guerra fria", conduziu, sobretudo em África, como já escrevi, a uma "guerra quente", por interpostos agentes, procurando assegurar a hegemonia de uma ou outra das referidas superpotências.
Inúmeros conflitos que se seguiram em vários países de África, a que os de língua portuguesa e neles Angola, não escaparam, desenvolveram-se sob este pano de fundo até à implosão da ex-URSS, com a queda do muro de Berlim, em 1989.
Quando em 25 de Maio de 1963 os representantes dos países africanos independentes se reuniram em Adis Abeba, este pano de fundo esteve presente.
Personalidades como os presidentes das repúblicas do Mali e da Guiné Conacri posicionaram-se em oposição a outros presidentes como Senghor ou Houphouet Boigny, do Senegal e Côte d"Ivoire, por exemplo.
Sem prejuízo disso, a OUA teve um papel importante na concertação de esforços da luta contra o apartheid da África do Sul e da ex-Rodésia do Sul, actual Zimbabwe, e na persistência da luta anticolonial.
A implosão do regime da ex-URSS deu lugar a um novo mundo, unipolar, com influência determinante dos EUA, que eram o único país que tinha, do ponto de vista militar, económico e financeiro, capacidade para assegurar essa hegemonia, dando lugar à globalização.
Este mundo unipolar também já não existe mais, como se pode constatar pelo surgimento da força comercial de uma potência emergente, a China, que se confronta agora com os EUA e pretende ser, em 2050, o país mais influente no mundo.
Há também os chamados BRIC"s - Brasil, Rússia, Índia e China, com uma lógica que pretende ser própria.
A realidade é hoje completamente diferente da que existia há 60 anos, quando foi criada a OUA e institucionalizado o Dia de África.
Hoje vivemos sob a multipolaridade que apresenta novos desafios, a exigirem novas respostas, não podendo África e os africanos deixarem de tirar consequências da dependência em que se colocaram no mundo bipolar das superpotências existentes.
Ao evocar o Dia de África, em 2023 e não 1963, importa sublinhar e fazer registar a necessidade de os países africanos caminharem no sentido da autossustentabilidade, com políticas transparentes, que reforcem com ousadia a credibilização da política e dos políticos, com os olhos postos no futuro.
As opções não são fáceis, mas não há outra forma de ganhar o futuro e responder aos anseios da generalidade dos cidadãos que aspiram por melhores condições de vida.
Em África, o terceiro continente mais extenso, que representa 20,3% do planeta Terra, com uma população muito jovem, Angola tem condições invulgares e excepcionais para conquistar esse futuro.
Não pode por isso desconseguir.

*(Secretário-geral da UCCLA)