O escrutínio da actividade governativa é algo muito comum em democracia, onde os governados fiscalizam a acção dos governantes e os partidos na oposição exercem o chamado direito de réplica em relação às políticas, propostas e posicionamento do partido no poder. É assim em democracia, e isso não devia provocar uma guerra de comunicados e de acusações de ingerências.

É urgente democratizar o espaço público e perceber certas estratégias que fazem parte do combate político. É muito comum os jornalistas irem procurar reacções dos partidos na oposição em relação aos pronunciamentos do líder do partido que governa ou de outros altos dirigentes do partido que governa. Fazem o chamado direito à réplica. E quem governa tem de saber lidar com isso, tem de saber gerir a situação e como actuar. Recordo-me de que, no início de Agosto de 2021, por altura do processo de impugnação (no Tribunal Constitucional) do congresso da UNITA que elegeu Adalberto Costa Júnior como presidente do partido, o Secretariado do Bureau Político do MPLA fez um comunicado a dizer que a liderança de Adalberto Costa Júnior estava "por um fio".

Não estaria, neste caso, o MPLA a " imiscuir-se" nos assuntos internos da UNITA? Não estivemos perante um caso de "ingerência" do poder político num assunto cuja decisão pertencia aos tribunais? Portanto, penso que este comunicado foi extemporâneo, houve alguma precipitação e até mesmo "ingenuidade" política do Grupo Parlamentar do MPLA, que acabou alinhar no jogo da UNITA. Era essa a reacção que a UNITA queria provocar no MPLA e percebeu que a sua estratégia resultou. O MPLA deu ao assunto a dimensão que eles desejavam, ou seja, a UNITA "espirrou" e o MPLA "constipou-se".

Nas hostes da UNITA, as reacções ao comunicado do MPLA foram assim: "O regime acusou a nossa comunicação", "doeu. Morderam o isco" e "Foi muito forte. São raras as vezes que eles reagem". Um sinal de como a UNITA já percebe como o MPLA reage às suas críticas e se incomoda quando usa o espaço público para "replicar" acções do MPLA e do Executivo. Aos olhos da UNITA, o MPLA tornou-se bastante previsível. E é algo que precisa de corrigir com urgência.
A UNITA está na oposição e quer alcançar o poder. Sabe que não tem muito espaço de manobra na comunicação social pública, também sabe que "provocando", o MPLA reage, e que a sua reacção irá fazer eco ali onde ela não tem espaço. O que acontece é que os cidadãos vão atrás dos pronunciamentos que provocaram a ira dos camaradas.

Quem governa tem de perceber que tem outras responsabilidades, tem outras prioridades. Quem governa tem de elevar o debate político e liderar pelo exemplo. Esta guerra de comunicados e de acusações de ingerência acaba por não ter o efeito desejado até junto dos militantes e simpatizantes do próprio MPLA.

Podia-se esperar da UNITA outro comportamento que não fosse o de criticar a governação? É o que eles vão fazer sempre para fragilizar e para " incomodar" quem governa, ou até mesmo para mostrar aos cidadãos que estão atentos e que fazem a tal verdadeira oposição. Era mais prático o MPLA não reagir com os nervos à flor da pele e levar o hemiciclo e " encurralar" a UNITA em sede do debate parlamentar. Os cidadãos têm outras preocupações e prioridades e já não têm pachorra para estas guerras de comunicados.

Outro assunto ligado à comunicação é o da parte da entrevista à Rádio Cinco, na qual o ministro da Juventude e Desportos, Rui Falcão, considera que "não faz sentido" o Ministério do Comércio licenciar ginásios para a prática desportiva em Angola. Não fica bem um ministro levantar publicamente polémicas que podem fragilizar outras instituições do Estado. Deve haver ética, coordenação e comunicação entre os ministérios. O ministro Rui Falcão bem podia discutir este assunto com o seu colega do Comércio, o ministro Rui Miguêns de Oliveira, ou levar a preocupação para o Conselho de Ministros.

Um ministro não deve colocar instituições do Estado em polémicas públicas ou a "animar" conversas das redes sociais. Devia seguir o exemplo e postura adoptados pelos ministros Eugénio Laborinho e Márcio Daniel. Esses, sim, deram um bom exemplo de coesão, comunicação e coordenação institucional na forma como resolveram um assunto da responsabilidade dos seus ministérios e de interesse para o País. Essa imagem de homem de "trungungo" pode ser útil no confronto partidário, mas nunca para relações entre instituições do Estado. Nesta altura, o Executivo de João Lourenço dispensa este tipo de "fogo amigo" e de automutilação governativa.