Passaram-se anos, quase dez, e o Gustavo foi insistindo para que eu criasse uma coluna de opinião no Novo Jornal, o que acabei por começar a fazer, porque já tinha alguma experiência de colaboração com o Vida & Cultura, o Lavra & Oficina, mas também porque sabia que era comum a opinião de que o pessoal da rádio não tinha capacidade para trabalhar em jornais... Infelizmente era assim que alguns olhavam para a profissão, de que ainda hoje muito me orgulho, de "radialista". Finalmente, em 2011, entre entradas e saídas na redacção do NJ, o Gustavo (e o Victor Silva) desafiaram-me para editar o então caderno Mutamba. Tinha estado longe do exercício quotidiano da minha profissão uma década, porém, colaborando já há mais de um ano com este semanário, onde, diga-se, se produzia o melhor jornalismo angolano. Tendo percebido que dificilmente a rádio, desde o final dos anos 90, voltaria a ser o que tinha sido a partir de 1977 e tendo amadurecido muito naquela década em que escolhera, por decisão própria, fazer uma travessia no deserto que não me tinha feito mal nenhum, aceitei com entusiasmo.
Foi por isso e principalmente graças ao Gustavo, que retomei a profissão e por absoluto mero acaso, me vi director deste semanário quatro anos depois. Aprendendo no batente uma certa continuidade do que já tinha aprendido na Rádio Nacional e exactamente com as mesmas dificuldades, os mesmos problemas, as mesmas incompreensões, os mesmos silêncios e as mesmas caras fechadas de sempre. Ou seja, o Gustavo não era apenas um brilhante articulista, por mais que algumas vezes discordássemos de pontos de vista. Nada mais natural, dada a diferença no capítulo da formação ideológica e cultural que cada um tinha e estava a consolidar. Além de solidário, respeitava sem limites a opinião contrária desde que séria e fundamentada. Desprezava, no mais profundo de si mesmo, o mercenarismo em qualquer profissão, em particular na nossa. E tinha profunda consideração por quem professava os seus próprios valores, defendendo-os, dentro da margem das regras básicas não apenas profissionais, mas também humanas. Alguns foram-nos chamando ao longo dos anos de "contestatários"... A maior parte, os mais antigos, mais batidos, por sinal mais sérios, coerentes e que tinham escolhido desde há muito o lado honesto, patriota e responsável da vida, sem nunca terem estado à venda, davam-nos força e alento, conselhos e críticas, sempre que fosse necessário.
A minha homenagem ao Gustavo Costa tem, pois, de passar por aqui. Em nome do que vivemos e atravessámos juntos, com mais uma dúzia de "malucos" que ainda acreditam, mesmo com tantas evidências do contrário, nas intrínsecas qualidades humanas, quando não submetidas a condicionalismos que um dia, caso a vida nos dê tempo para isso, teremos de contar. Integridade moral, autonomia de pensamento, consciência da responsabilidade, amor à Terra e respeito por nós próprios.Quanto ao resto, o tempo, os factos, a evolução ou regressão da sociedade angolana, as milhares de histórias (e estórias...) e tudo quanto está escrito, hão-de falar por si próprias, já que a memória colectiva nunca deixa de estar presente, ainda que aparentemente não o pareça.
Até sempre, Gustavo. Obrigado por tudo.