A Assembleia-Geral (AG) da FAF votou pela realização da segunda "mão" da Supertaça de futebol, edição 2021, prova que foi disputada em apenas uma "mão" e que consagrou o Sagrada Esperança como vencedor no terreno. Na sequência de um protesto do Petro Atlético de Luanda, entrado na secretaria da FAF dentro dos prazos regulamentares, o problema "rebentou" com estrondo de um terramoto, cujos estragos estão longe de ser avaliados. A "procissão" ainda vai no adro e certamente até o fim desta pendenga judicial serão "percorridos" muitos quilómetros.
Pelos elementos indicativos sobre esta maka (mais uma) criada pelo elenco directivo de Artur Almeida e Silva, é legítimo pensar-se que no meio de tudo isso, os clubes - curiosamente, ambos tutelados por empresas públicas do Ministério dos Recursos Naturais, Petróleos e Gás - são as grandes vítimas da borrada feita pela FAF. Ambos parecem ter razão e, em defesa das respectivas damas, esgrimem argumentos de razão atendíveis.
Aparentemente, o "caso" pode chegar à Federação Internacional de Futebol Associado (FIFA). A acontecer, será a primeira vez que uma questão tão doméstica subirá à entidade máxima da modalidade. Tudo porque a turma de "rei" Artur meteu os pés pelas mãos, ao ter tomado a decisão sem se ater às normas regulamentares que dão respaldo à eventual alteração de dispositivos legais já consagrados. Porque se o tivesse feito, em tempo hábil, provavelmente um dos contendores teria discordado na hora e ter-se-ia encontrado uma solução. E isto é, no mínimo, inaceitável de uma instituição que tem no seu elenco directivo alguns dos mais reputados juristas deste País. Isto pode ser o reflexo de uma certa jactância da classe que diz de boca cheia não discutir Direito com que não estudou Direito...
Não havendo ainda muitos elementos informativos disponíveis, fica difícil formular qualquer juízo de valor. Mas é quase certo onde está a culpa desta alhada, que envergonha o futebol nacional. Pela forma como nos bastidores da AG oficiais da FAF se desdobraram para que os associados não votassem a repetição, não é difícil inferir, mesmo sem todos os dados do problema, quem meteu os pés pelas mãos. Afinal, os clubes limitaram-se a obedecer às directrizes da FAF.
O problema agora levantado com a putativa disputa da segunda "mão" da Super-Taça de Angola deveria convocar a "sociedade futebolística" nacional para uma séria reflexão sobre o sistema eleitoral nas associações desportivas. Artur Almeida e Silva foi democraticamente eleito para mais um mandato e não há volta a dar. Mas o problema não está aqui. Várias figuras que foram eleitas democraticamente tiveram desempenho simplesmente desastroso, quando não trágico. Aliás, a eleição democrática não dá garantia de gestão séria.
No seu primeiro consulado, iniciado logo após eleição em 2016, Artur Almeida e Silva cometeu erros crassos. Tantas asneiras que metade dos seus vice-presidentes bateu com a porta. Desde a sua chegada à Direcção da FAF à reeleição, a Selecção Nacional AA, que é o cartão de visita de qualquer federação que se preze, teve desempenho apenas mediano. Em 30 jogos obteve 11 vitórias, 12 empates e 7 derrotas, o que dá 45 pontos em 90 possíveis. Quer dizer que as "Palancas Negras" só conquistaram 50% dos pontos disputados. Isto é manifestamente pouco para uma equipa que já esteve em lugares de destaque do ranking africano.
Nesse período, Angola teve revezes impensáveis e mereceu inclusive o "desrespeito" de adversários sem gabarito. Permitiu-se ao "luxo" de perder em casa com a Gâmbia, foi desfeiteada pela Mauritânia fora de portas e consentiu empate caseiro e forasteiro com a Suazilândia. A "mesma" Swazilândia que no passado levava cabazadas atrás de cabazadas! Esta prestação deve-se em grande medida a um amontoado de asneiras cometidas pelo elenco directivo comandado por Artur Almeida e Silva. Como a ocultação dos prémios de qualificação para o CAN"19, o que levou a uma rebelião surda, em consequência da qual a equipa nacional ficou sem treinar e sem efectuar dois jogos de preparação para a prova agendada para o período de 21 de Junho a 19 de Julho de 2019, no Egipto.
Também nesse espaço de tempo mudou quatro vezes de treinador, dando a impressão de que não havia projecto credível e que os técnicos entravam e saíam ao sabor da maré. Mais: dois desses treinadores foram tomados por empréstimo a clube, servindo assim a dois "deuses", prática que as federações sérias e dirigidas por gente que entende efectivamente de futebol deixou de usar há séculos. E isto sem falar que o técnico que obteve os melhores resultados foi defenestrado por não concordar com as "travessuras" que via na gestão administrativa da Selecção Nacional. Aqui nem convém, por exemplo, esmiuçar o episódio do jogador da Selecção de Sub-20 que foi impedido de ir ao "Mundial" do Brasil em 2018 porque o clube contratante o quis punir!
O problema é que, com todo este passivo, ainda assim, Artur Almeida e Silva e compangons de route foram reeleitos para um segundo mandato. Nesse pleito, o elenco directivo agora em funções perdeu em Luanda, o principal centro desportivo do País. Isto diz muito coisa. Para a vitória, contou maioritariamente com votos de "escolinhas" e clubes menores [aqui não há nenhum menosprezo]. Nessas condições, um eleitorado esclarecido, que em vez de ver a árvore vê a floresta, jamais concederia uma segunda oportunidade.
Talvez seja injusto fazermos referência à qualidade do eleitorado do futebol, até porque não dispomos de um dispositivo para a medir. Aparentemente - aqui corremos o risco de sermos iludidos pelas aparências - não tem a mesma qualidade do eleitorado do andebol ou do basquetebol, por exemplo. Se calhar, é por esta razão que estas duas modalidades se fartam de ganhar títulos e estar presentes em pódios continentais, enquanto o futebol... népias, apesar dos rios de dinheiro que os deviam sustentar, mas que vão para bolsos indevidos.
Depois de tantas "traquinices", ser reeleito é no mínimo intrigante. É óbvio que, como diz o povo, a maioria vence. Mas vencer não significa ser melhor. Em face deste risível autogolo marcado pela FAF, insistimos na necessidade de uma séria reflexão à volta de muito que vai acontecendo no nosso futebol, mas sobretudo no sistema eleitoral. Porque, não é justo que uma qualquer "escolinha" de futebol (com todo o respeito que merecem) tenha voto igual a de um 1.º de Agosto, Petro Atlético de Luanda, Sagrada Esperança ou 1.º de Maio de Benguela. E isto aplica-se também no caso das associações provinciais.