Em África... bem, em África a situação é tão ou mais grave e perturbadora. Cientificamente, há anos que se sabe que o continente africano é um dos pontos mais afetados pelas alterações climáticas. Somália, Namíbia e Sudão do Sul têm sido os países mais massacrados. Em números, 7,5% da população africana teve de sair do seu local de residência para sobreviver e escapar às catástrofes provocadas pela mudança climática. Estudos revelam que cerca de 52 milhões de pessoas estão, devido a estas condições, a passar fome.
Há sensivelmente dois anos, o Zimbabué, Moçambique, Malawi e África do Sul sofreram uma das mais intensas tempestades da última década, seguramente - o Idai. Estima-se que mais ciclones, formados no Oceano Índico, ocorrerão e atacarão o continente africano. Em 2019, foram oito os ciclones que se formaram neste mesmo oceano - um novo recorde.
O gelo do Monte Kilimanjaro, na Tanzânia, diminui 85% entre 1912 e 2007. Prevê-se que este mesmo gelo - ou o que sobra dele - esteja quase a derreter por completo.
Pragas de gafanhotos são o dia-a-dia de muitas comunidades africanas, que também têm afectado Angola com grande intensidade.
Já não há propriamente modelos nem previsões capazes e eficazes de se anteciparem a estes fenómenos. São extremos, severos e, muitas vezes, inesperados.
Há vários factores que exponenciam toda a actual e futura urgência de atuação em África, no espectro ambiental, e criam um ciclo vicioso e perturbador.
Cerca de 70% dos africanos dedicam-se à agricultura. A perda da fertilidade dos solos, as secas e as cheias são recorrentes e resultado da alteração do clima. Com isto, a população fica sem comida para se alimentar - o caso do sul de Madagáscar é um exemplo disso mesmo: as pessoas comem sapatos para não morrerem à fome. Repito, sapatos.
Sem alimentação e cuidados básicos, surgem as doenças. Não obstante a esta causalidade de acontecimentos, as alterações climáticas, por si só, são um elemento gerador de aparecimento e propagação de doenças. Alguns estudos, inclusive, referem que, se continuarmos neste ritmo de degradação do planeta, existirá, no mínimo, um aumento de 5 a 7% de transmissão de malária até ao final do século. Existem também outras doenças que preocupam os especialistas: dengue, febre-amarela ou chikungunya, para além de graves problemas respiratórios.
O continente africano contribui apenas com 3,6% das emissões de carbono mundiais. As principais cidades, sobretudo a Este, estão a ficar com temperaturas cada vez mais elevadas.
Desta forma, existirão mais competições e guerras por recursos e territórios, havendo, inevitavelmente, um maior fluxo migratório de pessoas. A cada vez mais valiosa água potável e os escassos terrenos férteis, que já são disputados, serão um verdadeiro "El Dorado", num continente cujos seus tesouros são sucessivamente degradados por terceiros.
As soluções? Não vou ser hipócrita, todos nós sabemos quais são. Agora, para inverter a situação - aliás, perdão, para não agravar a situação - é preciso que se façam escolhas, escolhas essas que trarão consequências.
África precisa de alertar o resto do Mundo que está a sofrer bastante, em grande maioria, por culpa de alguns. Tem de se chamar a responsabilidade dos principais e mais poderosos atores internacionais, de modo a que estes possam contribuir financeiramente para auxiliarem as comunidades mais afectadas e ameaçadas.
Importante recordar que, como vimos, as mudanças climáticas ameaçam a paz, os direitos humanos e a democracia. Nós cá ficamos a ver, escandalizados com determinadas ocorrências, enquanto trilhamos o caminho para o abismo.