É nesta perspectiva que nas últimas horas, nas redes sociais em Angola, jovens ensaiam a própria morte, soterrados debaixo de lama ou deitados no chão, debaixo de objectos que variam desde blocos a jornais, cestos de pão e botijas de gás.
Sabe-se pouco sobre a origem do protesto. Segundo o Novo Jornal, a "Febre do bloco na cabeça", como inicialmente denominada, surgiu em homenagem às vítimas mortais das últimas chuvas que caíram sob a cidade de Luanda. Enquanto na outra versão, o desafio "Acaba de me matar", denota ser um protesto contra os mais variados problemas do país.
Um protesto inteligente num país que o Israel Campos diz ser ""anti-manifestantes"", afinal, por aqui o jovem que pensa não fala de política, a não ser que seja à beira das eleições, porque aí a sapiência dos nossos sábios redescobre que os jovens bebem cuca.
Portanto antes de estudar o angolano, como muitos sugerem, é preciso compreender e respeitar a audácia do protesto destes jovens. Eles que vêem o próprio reflexo entalado entre blocos e botijas de gás ao encarar a sua realidade de todos os dias. Jovens frustrados ao constatar que mudam-se os anos, mudam-se por vezes até os dirigentes, mas os problemas prevalecem. Problemas tão aviltantes quanto é vê-los simulando a morte por motivos tão fúteis, quanto é o alto preço do gás, do pão ou as inundações causadas pela água das chuvas, que caem na mesma estação todos os anos e resultam em tantas vítimas.
Agora é normal que o protesto não encante a todos. A cantora e compositora Irina Vasconcelos por exemplo fez coro àqueles que acham que a criatividade destes jovens tem ido longe demais, pois arriscam as próprias vidas. A Irina e os outros têm razão, mas a vida destes jovens ""sem noção"" é o risco que eles ilustram nestas fotografias. Um risco que já não pode ser ignorado, porque se for, estes corpos deitados ao chão nas imagens, não serão simulados.
*Mila Malavoloneke é fundadora da revista Jovens da Banda