O Namibe é uma província maioritariamente desértica, semiárida, regista o menor número de precipitações do País e vive períodos longos de seca severa. A própria origem do nome da província, Namib, tem a ver com o seu significado em língua nativa "de lugar vasto, terra sem água, sem gente, lugar onde nada existe". Os rios de Carumjamba e Giraul, situados a Norte de Moçâmedes, são rios extremamente irregulares, ou seja, são rios que dependem a montante das chuvas a Norte da região, geralmente provenientes da Huíla: às vezes, os seus efeitos são torrenciais e destrutivos, como aconteceu em 2000 e 2011 com a destruição de infra-estruturas rodoviárias, ferroviárias e de saneamento. Essa característica é típica não só desses dois rios, mas também de todos os outros rios e vales do Namibe (Inamangano, Bentiaba, Mutiamba, Bero, Cubal ou Curoca) que, na maior parte do ano, se apresentam de leito seco, por isso considerados também rios intermitentes.

Até agora, a gestão dos efeitos negativos da seca tem sido feita por via de programas emergenciais que se restringem a acções e medidas de carácter assistencial ou à abertura de furos de água subterrânea de pouca profundidade, e, em muitos casos, a água encontrada é salobra. Por se tratar de um tema a que dedicamos bastante importância, por meio do Plano Integrado de Intervenção nos Municípios (PIIM), foram concretizados, para além de furos de água, outros sistemas, tais como a reabilitação de pequenas chimpacas e represas, que têm permitido a mudança de hábitos de vida. É o que ocorre no município do Virei, muito afectado pela seca, onde a construção de alguns sistemas de água e reservatórios permite que as comunidades do Kuiti Kuiti já pratiquem agricultura.

Soluções mais estruturantes são necessárias e o canal do Cafu, no Cunene, bem como os projectos de construção de barragens e canais de irrigação para o Namibe, Huíla e Kuando-Kubango darão uma solução sustentável ao problema da seca no Sul de Angola, garantindo maior estabilidade social das comunidades - a agricultura familiar passa a ser possível, as famílias têm mais fontes de rendimento, e a transumância torna-se menos necessária.

O Presidente da República sublinhou a relevância dos projectos de gestão da seca no Sul de Angola, tendo afirmado, recentemente, que "estão a ser construídos outros canais e grandes barragens/albufeiras de retenção das águas pluviais que se vêm perdendo no oceano ao longo de anos (...)". O grande desafio que se nos coloca a todos nós, governantes e técnicos das áreas afins, é a capacidade de utilização de recursos hídricos de água doce que advêm da natureza e que não estão à disposição do homem para a sua sobrevivência. Essa exigência é ainda maior quando estamos perante incertezas - temporal e espacial - das chuvas nesta zona do Sul de Angola, para que as pessoas que nela habitam possam usufruir do excelente microclima, do seu trabalho, das suas energias, das terras aráveis da região, produzindo nelas o alimento necessário para as suas vidas, bem como o excedente que alavanca o desenvolvimento económico e social das comunidades, da região e do país. "A barragem representa um espelho d"água e de vida no meio da ressecada natureza; um espelho de esperança no seio da atordoante incerteza que acompanha a marcha das estações." Como sabemos, a seca traz consigo efeitos devastadores sob o ponto de vista da vida das pessoas, dos bens e infra-estruturas produtivas. A seca provoca enormes prejuízos, tais como a destruição de lavouras, a dizimação de rebanhos, a transumância, bem como consequentemente a fome generalizada e a desnutrição. No caso concreto da região, a transumância tem efeitos multiplicadores, pois arrasta consigo outros fenómenos sociais graves, como desestruturação das famílias, o abandono escolar de crianças e jovens (em idade escolar), a propagação de grupos nómadas, entre outros.

Outra consequência da seca na região é a destruição das cortinas florestais, por meio do abate indiscriminado das árvores, que tem provocado grandes extensões de areia, constituindo, assim, uma grande ameaça às infra-estruturas habitacionais, económicas e produtivas.

Com um microclima fantástico (permite cultivar durante todo o ano) e a reutilização das águas que se perdem no mar, através de barragens de retenção, estaremos em condições de produzir milhares de hectares irrigados. As nossas terras produzem quase tudo (tomate, cebola, batata, milho, soja, feijão, oliveiras, frutas da mais diversa variedade). E há uma vantagem adicional: a nossa população é trabalhadora. Apesar das vicissitudes derivadas da seca, com a utilização de sistemas precários de irrigação "gota a gota" por bombeamento de água proveniente de furos artesanais, o Namibe é responsável por cerca de 60% de tomate que se produz no País. É de realçar também que o facto de ser uma região de elevada atmosfera seca significa também menos doenças e, consequentemente, custos de produção mais baixos.

A nível da pecuária, a capacidade de produção de feno (alimento para o gado) aumentará substancialmente e haverá condições para a instalação de infra-estruturas para o abeberamento dos animais.

A construção de barragens de retenção vai desenvolver zonas agrícolas de grande extensão com diversidade de culturas, elevando o sustento dos agricultores e o aumento do emprego das pessoas, regularizando o habitat dos nativos, preservando as suas culturas, usos e costumes e melhorando a dignidade da vida humana.

Com a construção das duas barragens e outras que se prevêem para o Namibe, estaremos no caminho certo para a criação de um oásis em Angola, pois teremos campos vastos de produção agro-pecuária, desenvolvendo um ecossistema agrícola com capacidade de prover serviços e importantes benefícios socioeconómicos, à semelhança do que assistimos nos países desérticos do Norte de África e do Médio Oriente. Para além das vantagens económicas já enunciadas, um oásis no deserto de Angola tratará externalidades positivas, quer no domínio ambiental, quer no domínio social. Destacaria, entre outras: a redução de emissão de gases com efeito estufa, pois as pessoas não terão de fazer o abate desordenado de árvores para sobreviver (por via da venda do carvão vegetal), melhoria na formação das pessoas, principalmente jovens e crianças, com a redução da transumância e a fixação de pessoas nas suas comunidades de origem, e melhoria da qualidade de saúde dos habitantes, pois estariam mais bem alimentadas e, por conseguinte, menos expostas a doenças.

É, contudo, recomendável que não se espere pela conclusão dos projectos para a preparação dos programas que deverão fazer o aproveitamento das infra-estruturas e do potencial hídrico que delas resultar, engajando as comunidades e autoridades locais.

A segurança alimentar é fundamental para garantir de forma transversal um desenvolvimento sustentável e equilibrado da província, através do fomento dos sectores produtivos primários, da melhoria da qualidade de vida das comunidades e de um melhor aproveitamento do potencial dos recursos em todas as áreas. n

*Governador da Província do Namibe