Eles só mobilizam a atenção mundial dos media quando alguma situação pontual envolva, por efeito do conflito e na sua decorrência, algo de inesperado e que em si mesmo seja notícia.

Foi o que se passou no dia 22 do passado mês de Fevereiro, quando o embaixador de Itália na República Democrática do Congo, Luca Attanasio, e o seu guarda-costas, o carabinieri Vittorio Lacovacci, foram mortos no Kivu-Norte, província congolesa.

Não sendo usual um embaixador acreditado e em funções num país, seja ele qual for, ser assassinado por efeito de um conflito sangrento, face às precauções que se tomam previamente, sobretudo em quadros político-militares difíceis, a notícia da morte fez arrastar a informação da guerra que se trava na província do Kivu-Norte.

Essa guerra, que tem estado esquecida, como outras que se travam no continente africano, assumiu proporções dantescas, não poupando quem, como o embaixador italiano, se integrava num comboio humanitário da própria força da ONU, no caso da Monusco.

Temos de recuar a 1994, concretamente há 27 anos, para se perceber a origem do que ocorre nesta província e que teve a ver inicialmente com o massacre étnico da minoria tutsi no Ruanda.

Uma parte da maioria hutu, ao refugiar-se na República Democrática do Congo, que faz fronteira com o Rwanda, formou aí uma alegada força libertadora desse país.

Um acordo estabelecido em 2003, sob a égide da ONU e a envolvência de vários países africanos, entre os quais Angola, garantiu a transição para um Governo congolês, não sem que tivessem sido, entretanto, massacrados milhões de refugiados e persistindo muitos outros deslocados.

A proliferação de grupos armados que, entretanto, se formaram é hoje contabilizada como superando a centena na província do Kivu-Norte, vivendo de toda a sorte de crimes que têm como suporte reservas minerais entre outras as que se destinam a baterias de equipamentos informáticos.

Todo o tipo de crimes é praticado no meio desta verdadeira carnificina, desde a inacreditável exploração da mão-de-obra dos mineiros ao recrutamento de crianças soldados, passando pela exploração sexual de menores.

Por ser assim, nem um comboio humanitário em que seguia um embaixador acreditado na República Democrática do Congo deixou de ser barbaramente atacado, apesar da comunicação e diligências prévias feitas junto de quem de direito. Contudo, não foram suficientes para lhe preservar a vida.

Tanto quanto os media noticiaram, este jovem embaixador italiano era uma personalidade muito solidária com África e com os africanos.

Ao menos que a sua morte sirva para trazer para primeiro plano dos noticiários a indiscutível brutalidade de conflitos da natureza dos que persistem, como o que se desenvolve na província de Kivu-Norte, em que as próprias leis da guerra são espezinhadas por grupos de verdadeiros bandidos e a consciência dos que aproveitam a exploração do comércio de minerais, prosseguida num quadro tão dantesco, como o que existe, lhes seja muito, muito pesado e sem perdão.

A guerra que se trava no Kivu-Norte, na República Democrática do Congo, é um sério desafio aos objectivos políticos de todo o mundo, a começar pelo continente africano.

Os avanços civilizacionais alcançados pela humanidade são incompatíveis com o que se passa nessa província.

Devem ser, por isso, concertados todos os esforços políticos, económicos e diplomáticos, para que no berço da Humanidade não floresçam e persistam guerras com a indiscutível desumanidade da que ocorre no coração de África.

É mesmo uma guerra desumana no berço da própria Humanidade, devo repito.

*Secretário-geral da UCCLA