Decorridos que foram 45 anos desde uma alegada tentativa de golpe de Estado, a 27 de Maio de 1977, o País regista hoje notória viragem sobre aqueles trágicos e marcantes acontecimentos que assinalaram a época, que desembocaram numa onda de impiedosas perseguições, detenções e vidas sacrificadas (mortes)_de triste memória.

Eram assim vividos os momentos mais dramáticos na existência de milhares de famílias angolanas que viram partir para o além muitos dos seus melhores filhos, quando por um lado o Governo de então acusara o então ministro da Administração Interna, Alves Bernardo Baptista "Nito Alves", de liderar uma intentona golpista que veio a eclodir num conflito interno que resultou em mortes, parte a parte, de vários governantes, dirigentes, militares e civis. Foi precisamente a 27 de Maio de 1977, numa operação aparentemente liderada por Nito Alves que ficou no cargo de ministro da Administração Interna desde a proclamação da Independência, a 11 de Novembro de 1975, até Outubro de 1976. Esta acção foi reprimida pelo Governo de então, presidido por António Agostinho Neto.

Dias antes, isto a 21 de Maio, o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) expulsou Nito Alves da cúpula do movimento, levando com que o antigo ministro do Interior e os seus apoiantes invadissem uma cadeia de Luanda para libertar outros simpatizantes, tendo assumido, ao mesmo tempo, o controlo dos estúdios centrais da Rádio Nacional de Angola, que sinalizou com o programa de resistência "Kudibanguela", levantamento que as forças leais a Neto, apoiadas por militares cubanos, vulgo internacionalistas, acabaram por conter, quando os rebeldes, acompanhados de centenas de populares, se dirigiam ao então Palácio do Povo, reestabelecendo assim a ordem, com a prisão dos revoltosos, a quem se rotulou de "fraccionistas".

Daí que se seguiu a purga, com a eliminação dos elementos ligados ao denominado fraccionismo, ou quem tivesse ligações com os ideais de Nito Alves.

Assim, um pouco por toda Angola os efeitos nefastos da alegada intentona golpista se fizeram sentir, porquanto sucessivas perseguições eram executadas, ao mesmo tempo que os testemunhos ainda vivos acabavam moribundos em diferentes presídios, quer do ex-Nicolau (Bentiaba), no Kuando-Kubango, no Moxico ou no Peú-Péu (Cunene). Outros tantos ainda sucumbiram diante do olhar silencioso de uma população intimidada.

Foi como se de uma autêntica travessia no deserto se tratasse, com um saldo de mortes; muitas vozes até hoje divergem nas estimativas que ditam terem sido mais de 30 mil mortes e 100 mil desaparecidos, mas se reflecte numa estatística jamais confirmada pelas autoridades, embora um levantamento avulso da Associação 27 de Maio dá como certa a veracidade destas cifras.

Entre a busca da verdade dos factos e a defesa de interesses do Estado, um hiato parece ter emergido durante vários anos, até que mais recentemente com o intuito de se dar solução ao litígio que durava mais de 40 anos, de forma a sarar as feridas decorrentes de um conflito que o advento da Paz não conseguia transpor a partir de Fevereiro de 2002, foi institucionalizada a Comissão para a Implementação em Memória das Vítimas dos Conflitos Políticos (CIVICOP), que ocorreram em Angola entre 11 de Novembro de 1975 a 04 de Abril de 2002.

(Leia este artigo na íntegra na edição semanal do Novo Jornal, nas bancas, ou através de assinatura digital, disponível aqui https://leitor.novavaga.co.ao e pagável no Multicaixa)