João Lourenço passa esta terça-feira, 28, e amanhã, quarta-feira, em Madrid, depois de uma semana nos EUA, que terminou com a sua intervenção na 76ª Assembleia-Geral da ONU, cumprindo assim o marco simbólico de quatro anos de governação em trabalho fora de Angola.
O Presidente está em Espanha, a primeira visita e ste país de um Chefe de Estado angolano em 25 anos, com o azimute colocado naquilo que é o cerne da sua propalada diplomacia económica que foi, a par doo combate à corrupção, a sua grande proposta com que apresentou aos eleitores em 2017.
E é isso mesmo que, horas antes da sua chegada a Madrid, o seu ministro do Comércio, Victor Fernandes, disse aos media que integram a comitiva de João Lourenço, composta ainda por outros governantes e a primeira-dama Ana Dias Loirenço, formulando a ideia de que Luanda tem urgência em aumentar as trocas comerciais fora do sector petrolífero
O ministro do Comércio sublinhou em entrevista à RNA que a ideia passa por potenciar a experiência empresarial deste país através da diversificação da sua presença em Angola, tendo da importância do sector não-petrolífero".
Mas o que marca esta visita é o que foi perspectivado aquando da visita do primeiro-ministro espanhol (presidente do Governo), Pedro Sánchez, a Luanda, a 06 de Abril deste ano, e que deixou saliente a intenção bilateral de aumentar de forma substancial o investimento espanhol na economia angolana.
As trocas comerciais estão hoje num patamar pouco relevante e que se acomodam nuns escassos 629 milhões de euros, pendendo a balança para Angola, que exporta quase 550 milhões em crude para o pais europeu enquanto este coloca 81 milhões em bens diversos por cá.
Mas o que ambos os lados querem é muito mais, como ficou claro nas palavras de Pedro Sánchez em Luanda, onde esteve para dar corpo ao plano do seu Governo para África, denominado "Foco África 2023", e que foi desenhado com base nas relações com alguns países-farol no continente, incluindo Angola, mas também o Senegal, África do Sul e Etiópia, tendo como objectivo aumentar a presença espanhola nestas economias.
E isso deve ficar já em evidência nos encontros de hoje. Conforme a agenda desta visita que a João Lourenço tem um encontro com o Rei Filipe VI e ainda com o primeiro-ministro (presidente do Governo), Pedro Sánchez.
Neste primeiro dia, a comitiva angolana acompanha João Lourenço num almoço oferecido pelo Rei de Espanha.
No segundo e último dia desta estadia de pouco mais de 48 horas em Espanha, o Chefe de Estado angolano tem previsto a visita a diversas instituições públicas e privadas, antes de embarcar com destino a Luanda.
Esta passagem do PR por Espanha acontece num ciclo particularmente intenso no relacionamento entre os dois países, porque Madrid aposta claramente numa aproximação estratégica a Angola no contexto da sua diplomacia económica agressiva para o continente africano e porque Espanha precisa de "limpar" o histórico dos últimos anos, que foram marcados, também, por graves suspeitas de suborno e corrupção de altas figuras do poder em Luanda, desde logo na petrolífera nacional, a Sonangol, durante a governação de José Eduardo dos Santos.
E foi para isso que, a 06 de Abril, o primeiro-ministro espanhol chegou, ao final da tarde, a Luanda para algumas horas de intensa diplomacia económica onde lançou a âncora dos negócios das suas mais pujantes empresas nacionais.
É uma aposta de futuro com Angola na "proa" desta empreitada de Madrid a que chamou "Foco África 2023", com a qual Pedro Sánchez afirmava então querer "liderar a estratégia da União Europeia" para o continente.
Ao longo das últimas décadas, Madrid nunca deixou de olhar para o continente africano como uma oportunidade para expandir os seus interesses económicos e sempre que deu um passo nesse sentido, Angola nunca esteve fora do "mapa" de acção, com clara ambição de, como o próprio Pedro Sánchez afirmou, dias antes de embarcar, fazer desta década - 2020/2030 - "a década de Espanha em África".
O Governo espanhol criou mesmo um instrumento de acção denominado "Foco África 2023" consubstanciando um conjunto de etapas para levar a diplomacia de Madrid ao continente com o objectivo de firmar uma sólida aposta empresarial, virando totalmente o foco de forma a gerar algo parecido a uma parceria estratégica não com um país mas com o continente africano como um todo.
E este instrumento pode significar milhões em investimento espanhol na economia angolana, mais que nunca necessitada disso para sair do buraco em que se encontra há pelo menos cinco anos de recessão consecutivos.
Recorde-se ainda que aquando da visita de Sanchez a Luanda, os media espanhóis não se furtaram a sublinhar que o chefe do executivo espanhol tem como prioridade criar condições para um impulso nas relações "de todo o tipo", não só no que diz respeito ao "vínculos bilaterais" mas que permita ainda "proporcionar a Espanha liderar a estratégia da União Europeia com o continente africano".
Mas nem tudo são rosas no que toca a Angola...
Como o demonstra o histórico recente pouco abonatório para Madrid, tendo em conta os múltiplos escândalos de corrupção que estalaram na justiça espanhola, como pode ser recordado nestas notícias do Novo Jornal, aqui, aqui, aqui ou aqui.
Apesar destas questões ainda pendentes, algumas, pelo menos, o pragmatismo de Madrid e a definida e objectiva diplomacia económica da Presidência de João Lourenço, deverão fazer destes casos judiciais meras notas de rodapé naquilo que é essencial para Luanda e Madrid: intensificar as relações económicas e empresariais bilaterais.
Nessa ocasião, e sobre a visita agora a Luanda de Pedro Sánchez, o embaixador em Luanda do Reino de Espanha explicava que Espanha decidiu apostar de forma clara em África, com destaque para cinco países que considera estratégicos neste novo "mapa" de "conquista" de África por Castela.
E que passa pelo apoio ao desenvolvimento do continente com investimento espanhol nas mais diversas áreas, de acordo com um plano que foi elaborado e aprovado há dois anos, onde o continente surge destacado na acção da política externa de Espanha, que destaca, além de Angola, a Nigéria, o Senegal, a Etiópia e a África do Sul.
O diplomata recordava mesmo que este interesse de Madrid por Angola remonta ao início da independência, quando o então primeiro-ministro angolano, Lopo do Nascimento se encontrou em Madrid com o seu homólogo, Adolfo Suarez, em 1976, lançando ali as bases de um relacionamento que dura até hoje e foi sendo reanimado amiúde sem que nunca tenha ganhado a dimensão que, aparentemente, ambas as partes desejam e que agora Madrid que garantir que, finalmente, se vai concretizar.