"O Governo da República de Angola acompanha com muita preocupação a degradação da situação política e de segurança na República do Sudão", lê-se numa nota do Ministério das Relações Exteriores.
O Ministério das Relações Exteriores informa ainda que cinco cidadãos nacionais que se encontravam a estudar na capital sudanesa, Cartum, estão a dirigir-se em direcção à fronteira terrestre entre o Sudão e a Etiópia, na localidade de Gallabat/Metema no Estado Regional de Amhara.
Outros cincos estão a caminho do Egipto, num processo de evacuação coordenado com o Departamento de Relações Internacionais e Cooperação da África do Sul.
O MIREX informa que estão em curso as diligências necessárias para que as missões diplomáticas de Angola no Cairo, Egipto, e em Adis Abeba, Etiópia, garantam o regresso voluntário a Luanda dos cidadãos nacionais que estavam ou ainda estão no Sudão.
A situação no Sudão é actualmente de guerra civil tendo em confronto as forças dos dois mais poderosos generais do país, Abdel al-Burhan e Mohammed Dagalo, que estavam juntos desde 2019, quando depuseram, através de um golpe militar, o ditador Omar al-Bashir, que governava este gigante da África oriental com mão-de-ferro desde 1989, e ainda depois de em 2021, terem subvertido de novo a ordem política com um segundo golpe que desencaminhou o processo de transição para a democracia prometido dois anos antes.
Depois de os dois generais se desentenderem sobre o formato da integração das Forças de Reacção Rápida (RSF, sigla em inglês), de Mohammed Dagalo, o número dois do Conselho Soberano do Sudão, uma junta militar criada em 2021 após um segundo golpe de Estado militar em três anos, liderada por Abdel al-Burhan, rapidamente a capital do país se transformou num campo de batalha, onde já morreram quase 500 pessoas (número provisório) e mais de 3.700 ficaram feridas, além do colapso das unidades hospitalares, a que se junta a fome e a sede, começarem igualmente a engrossar esta contagem trágica feita pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
O Sudão vive em permanente risco de implosão desde que em 2019, a junta militar liderada pelo actual chefe do Conselho Soberano e o seu número dois, os generais al-Burhan e Dagalo, destituiu o ditador Omar al-Bashir, que governava o país com mão de ferro desde 1989, dando início a um processo de transição até às eleições democráticas que deveriam ter lugar dois anos depois.
Como sucede normalmente nos mais complexos processos de transição política em África, também este descarrilou pouco antes de cumprido o prazo para a realização de eleições, com um segundo golpe de Estado militar, levado a cabo pelos mesmos que depuseram al-Bashir, colocando de novo o contador a zeros...
Só que, agora, depois de uma série de situações a carecer de explicações, porque a confusão instalou-se definitivamente, os dois homens-fortes do Sudão voltaram-se um contra o outro, alegadamente, dependendo das fontes, porque não se entenderam sobre a exploração de grandes jazidas de ouro e diamantes no país.
Mas a outra versão, colocada em foco por vários analistas, é que a anunciada criação de uma base naval russa na cidade de Porto Sudão, no Mar Vermelho, estrategicamente situada face à Arábia Saudita, no estreito que conduz ao Canal do Suez, terá feito soar as campainhas de alarme nos países ocidentais, especialmente nos EUA, levando Washington a pressionar Abdel al-Burhan a impedir o seu avanço.
Com isso, Moscovo, dizem as mesmas fontes, através do Grupo Wagner, com forte implementação na Líbia, apostou no apoio a Mohammed Dagalo, de forma a retirar o poder a al-Burhan - alegadamente apoiado pelos EUA através do Egipto -, podendo, assim, limpar o caminho para a criação da base em Porto Sudão, mas também nas disputadas minas de ouro e diamantes do país, até aqui, e ainda, em grande medida a serem exploradas pela Rússia, o que estava a deixar com os nervos à flor da pele o ocidente num contexto de crise densa por causa da guerra na Ucrânia e das sanções aplicadas por EUA e União Europeia à Federação Russa.
E, com este cenário em pano de fundo, aquilo que começou por ser, no dia 15 de Abril, uma troca esporádica de tiros no centro da capital, embora já mais intensa nas bases militares espalhadas pelo país, rapidamente evoluiu para um conflito intenso, com recurso, inclusive, a aviões de guerra de um e do outro lado a massacrar as posições adversárias, além de artilharia pesada, com milhares de civis sem escapatória, e com a água e os alimentos a rapidamente desaparecerem de circulação.
Face a este contexto, logo nos primeiros dias, especialmente os países europeus e os EUA, deram início a plano de contingência ara extrair os seus nacionais de Cartum, tendo esse processo ganhado maior urgência depois de três funcionários das Nações Unidas terem sido mortos numa troca de tiros que não se sabe ao certo se foi intencional ou danos colaterais.
Os primeiros a agir foram os EUA, com uma cena de "filme", com unidades de forças especiais oriundas do Djibuti, onde têm numa gigantesca base militar, com milhares de militares - a projectada base russa, em Porto Sudão, embora na mesma margem do Mar Vermelho, terá (teria?) apenas quatro navios e 300 militares - a entrarem por terra no Sudão, procurando extrair os elementos do corpo diplomático e as suas famílias.
Esse processo não foi fácil, porque, segundo algumas fontes, foi necessário a articulação entre unidades terrestres e a força aérea, tal a intensidade dos combates, bem como a dimensão do país, sendo necessário percorrer largas centenas de quilómetros para qualquer um dos países vizinhos seguros.
A Itália anunciou igualmente a retirada de quase 140 pessoas de Cartum, incluindo nacionais de países da União Europeia, para o Djibuti, incluindo portugueses, australianos, gregos, britânicos e suecos.
Também a Espanha anunciou que retirou para Djibuti uma centena de pessoas do Sudão, incluindo de outras nacionalidades.
A China, o Reino Unido e a França estão igualmente a tentar criar corredores aéreos seguros para retirar os seus cidadãos de pontos estratégicos criados dentro e fora das cidades mais afectadas pelo conflito.
Mas, sendo o Sudão um país de grandes dimensões e importante, com dezenas e multinacionais a operar no seu território, especialmente no sector extractivo, são dezenas de milhares os cidadãos estrangeiros que procuram sair nesta altura, sendo já claro que não vai ser possível de um momento para o outro.
Por essa razão, os EUA, mesmo sendo o país com mais meios na região para abrir caminho, emitiram um alerta para os norte-americanos no país apelando a que estes criem forma de se protegerem em abrigos seguros por ser impossível e muito arriscado proceder à sua evacuação devido à ferocidade dos combates.
Devido à intensidade dos combates, todos os países estão a implementar as medidas mais severas de contingência, estando a acontecer, além dos tiroteios e explosões de todo o tipo, pilhagens a casas de estrangeiros, assaltos e ocupações de, inclusive, divisões consulares e diplomáticas.
Com o aeroporto encerrado desde o início dos combates e as estradas cortadas ou sobre bloqueios e postos de controlo sem o mínimo de segurança formal, a vida de centenas de milhares de pessoas está actualmente à mercê da sorte, porque as duas tentativas de cessar-fogo para operações humanitárias não tiveram sucesso, com as partes a aproveitar esses momentos para ganhar vantagem sobre o adversário.