Angop - Que balanço faz do ano que está prestes a terminar?
Ministra - Falar em jeito de balanço de 2013, para o Ministério da Família da Promoção da Mulher, foi um ano de muito trabalho em termos de elaboração de documentos reitores para toda actividade no âmbito da família e promoção da mulher e igualdade do género.
Conseguimos com base nesses documentos aprovar o regulamento da Lei da Violência Doméstica, aprovamos o programa do Plano Executivo da Violência Doméstica, aprovamos também a Política Nacional para Igualdade e equidade do género.
No entanto, são documentos fundamentais que vão orientar toda acção do governo quer a nível central quer a nível das províncias e também a nível do sector privado e de ONGs e, isto quer dizer que entraremos em 2014 com um processo de harmonização da nossa sociedade, harmonização das relações de género, primar pela promoção económica, social e política das mulheres, para que até 2017 tenhamos um quadro diferente em termos de participação política e pública das mulheres quer em órgãos de decisão quer como beneficiárias dos projectos e programas socioeconómicos.
Angop - De modo geral como caracteriza a situação da família em Angola?
Ministra - As famílias angolanas ainda apresentam e são vítimas de muitos problemas.
Ainda não é aquela situação que nós desejaríamos, porque há dois problemas fundamentais que interferem na valorização da família e da sua dignificação.
A violência doméstica, sobretudo, para além de outros casos de violência na sociedade que de forma directa ou indirecta afectam as famílias, e também o índice elevado de pobreza também interfere na situação de renda das famílias, impossibilitando-as de exercer e desempenhar o seu papel como primeira instituição da sociedade como tal, com um papel fundamental na socialização e na formação da personalidade dos comportamentos e das mentes dos seus cidadãos.
Angop - Como o Ministério da Família e Promoção da Mulher tem feito a sensibilização contra a violência na mulher e rapariga?
Ministra - Nós temos vários níveis de intervenção, como através dos aconselhamentos junto dos Centros de Acolhimento, também através de palestras que fazemos a vários níveis e trabalhamos em parceria com as ONGs e as igrejas que possam complementar a acção do Executivo no âmbito das suas actividades.
Temos outro tipo de intervenção no que diz respeito ao aconselhamento onde primamos, por um lado, para dar a conhecer aos homens e mulheres que recorrem aos nossos serviços quais são os nossos direitos, como devem agir face aos conflitos e se realmente houver violência nós fizemos o trabalho junto dos tribunais e da DINC, para que haja tratamento adequado.
O nosso trabalho será muito mais eficaz quando começarmos a implementar na íntegra o regulamento da violência, porque neste documento está estatuído às novas formas de actuação, quer junto dos Centros de Aconselhamento como das Casas de abrigo, onde se prima por mais dignidade e humanização dos serviços, quer em termos dos recursos humanos, materiais e financeiros, sobretudo materiais.
Neste momento, estamos a nível de todo o país a fazer um refrescamento aos conselheiros familiares e agentes que intervém nesta acção, de prevenir e apoiar as vítimas da violência, também a nível do Ministério Público e outras instituições para que todos tenhamos a mesma linguagem e postura em relação ao atendimento às vítimas de violência.
Por outro lado, estamos a preparar uma delegação inter-ministerial onde farão parte outros ministérios e sociedade civil, para uma maior actuação junto dos nossos beneficiários, em termo de violência.
Angop - Que apoio o vosso sector tem dado às vítimas de violência, visto que o Ministério esteve a criar ou construir abrigos para essas vítimas?
Ministra - Já algumas províncias têm Centros de Abrigo, mas, como eu me referi, estes Centros não estão a trabalhar devidamente por falta de algumas condições, sobretudo no domínio logístico, por isso, é que estamos a dar mais atenção aos Centros de Aconselhamento.
Estamos actuar mais no sentido da prevenção, porque os Centros de Aconselhamento têm que ser o último recurso para o apoio das vítimas, onde se verifique que a integridade física do cidadão ou da cidadã esteja em risco.
Também temos que rever a forma como as pessoas ficam e como vão parar aos Centros de Acolhimento, porque muitas vezes as vítimas vão lá e depois por outras razões ou por falta de habitação, sobretudo, muitas das vezes não querem deixar os Centros de Acolhimento, o que causa muitos transtornos às instituições que estiverem a lidar com esta questão.
Daí que, no âmbito do regulamento da Lei da Violência, teremos necessariamente de rever esta situação, uma vez que ao abrigo do regulamento, quer os Centros de Aconselhamento quer as Casas de Abrigo terão mais ou menos um funcionamento como instituto público.
Então, temos que trabalhar, porque é uma matéria que começamos já a tratar agora em 2014.
De resto, fizemos o cruzamento com outros programas do governo e onde for possível recorremos aos programas da habitação social para apoiar as vítimas.
Com relação aos programas de combate à pobreza também existe uma articulação com no sentido de apoiar aquelas vítimas que têm dificuldade de inserção económica.
Angop - Quantos Abrigos e Centros de Aconselhamento temos no país?
Ministra - Abrigos são muito poucos. Temos uma média de 10 Casas de Abrigo pelas províncias e Centros de aconselhamentos temos 27 e quase 20 salas de atendimento, que são diferentes dos Centros de Aconselhamento.
O nosso ideal seria que, pelo menos, em cada município houvesse um Centro de Aconselhamento para atendimento às vítimas. Esperamos que até ao fim do mandato de 2017 possamos investir seriamente nesta área de prevenção à violência doméstica.
Angop - Sobre o apoio a mulher rural, o que é que o Ministério tem feito?
Ministra - Nós estamos a rever agora o Plano de acção de apoio à mulher rural que já caducou no mês de Junho e realizamos a bem pouco tempo o fórum da mulher rural onde foram abordados muitos temas.
Há recomendações pertinentes que saíram do fórum que vamos agora incluir no programa, mas também estas são acções transversais que fazem parte outros sectores, sobretudo o Ministério da Agricultura.
Neste domínio estamos a apoiar a agricultura familiar. Temos agora um outro projecto de hortas familiares, no âmbito da atribuição do Ministério que orienta a promoção de programas de qualidade de vida através de processamento alimentar e nutricional.
Temos um programa ambicioso de alfabetização inserido no programa de desenvolvimento comunitário. Este programa também implica habitabilidade básica, onde as pessoas são formadas e preparadas, no domínio do saneamento básico da gestão propriamente dita dos seus lares, em termos de higiene, e da comunidade, suficiente para prevenir doenças e dar dignidade às famílias.
Estamos também, agora, a dar inicio a um projecto com uma empresa brasileira, no sentido de formarmos mulheres camponesas para o processamento alimentar, quer de frutas, legumes e tubérculos, no sentido de melhorar a dieta alimentar.
Essas acções são completas em termos nutricionais, tendo em conta que temos um índice elevado de anemia nutricional, quer nas mulheres grávidas e crianças. No entanto temos uma componente de informação acentuada.
Também estamos a apoiar o Ministério da Agricultura na formação e assistência técnica, para que as mulheres possam melhorar a sua produtividade, e daí fizemos uma parceria com a FAO para podermos ter mais rendimentos em termos de processamento, desde a produção até à comercialização dos produtos.
Mas o nosso grande trabalho mais visível na mulher rural tem a ver com o apoio à mulher parteira, com acções de formação, em parceria com o Ministério da Saúde no fornecimento de kits às parteiras tradicionais.
Estas mulheres também são enquadradas em acções de produção. Tendo em conta o despacho do Presidente da República, vamos agora harmonizar todos programas que o Ministério da família tem, com os programas municipais integrais rurais, no combate à pobreza, para de forma mais coesa e eficiente possamos abranger mais famílias no meio rural e na periferia.
Também está contemplado o apoio à juventude, porque também temos a orientação no sentido de promover o associativismo juvenil - feminino e também apoiar nos programas de saúde reprodutiva e sexual, tendo em conta os altos níveis de gravidezes precoces que nos temos e que já está a preocupar. Também já temos uma incidência muito grande no meio rural.
Angop - Quanto à alfabetização que parceria tem com o Ministério da Educação?
Ministra -Temos uma parceria que já vem desde o programa de desenvolvimento rural, do Ministério da Agricultura, que foi transferido para aqui, e fizemos esta parceria com o Ministério da Educação e a Agência ADPP é a implementadora.
Neste momento, está quase em todas as províncias, não ainda em municípios, mas já estamos com média de 42 mil alfabetizando nos dois primeiros módulos. Ainda não tenho dados em relação ao terceiro porque começamos a pouco tempo.
Angop - Sobre as políticas públicas para as camadas mais vulneráveis, por exemplo, as viúvas, as portadoras do HIV/Sida e deficientes, o que tem sido feito?
Ministra - Em relação às portadoras do VIH/Sida ainda não temos um programa específico para apoiar esta camada, mas estamos a fazer um levantamento, ou basicamente um estudo com Ministério da Saúde.
Com as parcerias que faremos com a União Europeia, elaboraremos alguns projectos que não vão abranger só as vítimas de violências, mas também queremos trabalhar com as senhoras e jovens que se dedicam à prostituição e inseri-las no mercado do trabalho, pois já houve uma pequena abordagem com INAPEM para a formação das senhoras que farão parte da futura associação ou cooperativa.
Não sabemos como se chamaria ou que designação vamos dar, mas estão identificadas as áreas onde as senhoras poderão actuar e depois, no âmbito dos programas do Ministério da Economia, do Angola Investe, dos programas de combate à pobreza, termos então essas associações ou cooperativas para apoiar as senhoras.
Estamos a ter algumas dificuldade com as senhoras que se prostituem tendo em conta que elas acham que têm mais rendimento com a actual actividade do que estarem inseridas no mercado de trabalho.
No entanto, temos que trabalhar mais com a sua sensibilização, para elas próprias mudarem de mentalidade e aceitar uma nova condição.
Em relação as viúvas e as deficientes, não há discriminação por não haver um programa específico, mas elas estão inseridas nos programas que o Ministério tem em relação a promoção e empoderamento económico das mulheres e o grosso está no programa de apoio a mulher rural, porque este projecto abrange também as periferias.
Também temos um levantamento que a associação Afemea enviou para nós e vamos articular as acções para apoiarmos mais as mulheres empresárias.
Angop - Em linhas gerais quais são os grandes desafios do Ministério para o quinquénio 2013-2017 ?
Ministra - O desafio é bastante grande. Precisaremos, em primeira mão, continuar a trabalhar na capacidade institucional do Ministério, esperamos até no inicio do próximo mês mudar de edifício e também reforçar os nossos quadros, porque neste momento temos um défice muito grande em termos de quadros de especialidade ligados à famílias e promoção da mulher.
No âmbito do Plano de Desenvolvimento 2013- 2017 temos as cinco áreas definidas, cinco programas no âmbito da valorização da família e na valorização das questões de género, já elaboramos e foi aprovada a política.
Então, a partir de 2014 vamos começar a trabalhar com os sectores. Começamos a fazer a formação dos pontos focais para programação e implementação de projectos, o que quer dizer que todos os sectores quando começarem a elaborar os seus programas de orçamento tem que ter em conta que componente do género e daí é preciso também formarmos internamente, para podermos depois fazer o trabalho de monitorização junto dos sectores.
Esta questão vai ser abrangente, como atrás referi, vai também ao sector privado e também às Ongs, porque há problemas muito grandes em questão de género, não só na função pública mas também nas empresas privadas.
Em relação a promoção e empoderamento da mulher o nosso grande desafio vai ser nas zonas rurais e com apoio à mulher rural e às jovens.
Depois temos as questões de violência que acho ser a área bem encaminhada em termos de legislação, faltando agora ter uma implementação cada vez mais humanizante e cada vez mais eficiente para dar a nossa contribuição no que diz respeito à prevenção e redução dos índices de violência.
Angop - Sabe que o índice de fuga à paternidade no país é bastante elevado, que apelo faz ao país?
Ministra - O apelo é continuarmos a assumir a nossa responsabilidade enquanto pai. Realmente, nos dados estatísticos, a fuga à paternidade, aquilo que nós chamamos de violência económica, implica também as heranças e outras questões patrimoniais.
Mas no que diz respeito à fuga à paternidade, realmente, é uma constante que nos deve preocupar não só pela falta de prestação de alimento, mas o abandono que se dá às crianças, a negligência e os maus-tratos.
Ainda hoje ouvimos aquela informação que de um pai cortou os dedos de dois filhos, que por razões de violência doméstica, felizmente, as autoridades já estão a tomar conta do assunto.
No entanto, são acções que nos levam a aconselhar todos os dias e apelar a consciência das pessoas que as crianças não pediram para vir ao mundo, pois muitas vieram por forma voluntária e outras se calhar não, mas já estão aqui, são seres humanos, têm a sua dignidade e têm o direito à vida, pelo que continuamos a apelar as famílias a terem o grande cuidado para com as crianças, porque são as prioridades absolutas na legislação angolana que também diz que o Estado deve apoiar as famílias, mas esta também tem a sua parte como instituição cimeira na formação da personalidade de todos os seres humanos.
Então, é preciso que a família assuma por inteiro as suas responsabilidades.
Angop - Para finalizar, para quando o código de família?
Ministra - O código de família está a ser revisto. Não está estritamente dependente do Ministério da família, porque este processo está a ser liderado pela Comissão de Revisão do Sistema Judiciário, que está a cuidar não só do código das famílias, mas de todo o sistema judiciário do país.
Era nossa intenção que este documento estivesse pronto até fins deste ano, mas já sabemos que há questões um pouco mais polémicas e mais cuidadas que precisam de ter mais atenção e a comissão ainda não estão em condições de finalizar o trabalho este ano.
Angop