A África do Sul veio a público lamentar o encerramento de muitas fronteiras aos seus cidadãos e viajantes, argumentando que a detecção da nova variante de covid-19, Ómicron, "graças à excelência das equipas científicas do país", não deveria resultar nesse "castigo".
"Esta última vaga de proibições de viagens equivale a punir a África do Sul por ter sequenciado o genoma e pela capacidade de detectar novas variantes mais rapidamente. A excelência científica deve ser aplaudida, não punida", disse o Governo sul-africano num comunicado, dois dias depois de ter anunciado a descoberta.
"Também notamos que há novas variantes detectadas noutros países. Cada um desses casos não tem uma ligação recente com a África Austral. Deve notar-se que a reação a esses países é radicalmente diferente e, relação aos casos na África Austral", afirmou o Ministério dos Negócios Estrangeiros sul-africano, citado pelas agências internacionais de notícias.
O Governo sul-africano destacou que a Organização Mundial da Saúde (OMS) desaconselhou tais medidas para já, a fim de favorecer uma "abordagem científica baseada no risco", razão pela qual o executivo sul-africano está "alinhado" com esta posição.
"Alguns líderes estão a procurar bodes expiatórios para resolver um problema que é global", segundo o Governo sul-africano.
A Organização Mundial da Saúde diz o mesmo, mas de forma diferente, voltando a alertar para a necessidade de uma melhor distribuição das vacinas para evitar mutações perigosas, como a variante Ómicron, detectada na África do Sul, onde a taxa de vacinação é de apenas 25%.
O surgimento da variante Ómicron do coronavírus "prova que temos que acelerar a igualdade da distribuição de vacinas o mais rápido possível e proteger os mais vulneráveis em todos países", afirmou o director-geral da organização, Tedros Adhanom Ghebreyesus, na sua conta oficial no "Twitter".
Classificada na sexta-feira pela OMS como uma "variante de preocupação" que exige um acompanhamento especial na sua evolução, a Ómicron "recorda que quanto maior a desigualdade na distribuição das vacinas maior a oportunidade de o vírus ser transmitido, e com isso mudar a sua estrutura", sublinha o director-geral da OMS.
Também o director executivo (CEO) da "GAVI Vaccine Alliance", Seth Berkley, referiu, em comunicado, que apesar de ainda existir pouco conhecimento sobre a Ómicron, "o que sabemos é que, embora grandes partes da população mundial não sejam vacinadas, as variantes continuarão a aparecer e a pandemia continuará".
"Só impediremos o surgimento de novas variantes se formos capazes de proteger toda a população mundial, não apenas os países mais prósperos", concluiu.
A especialista Ayoade Olatunbosun-Alakija, representante da African Vaccine Delivery Alliance da União Africana, numa entrevista à televisão britânica BBC, lembra mesmo que a vacina não existiria se a doença tivesse ficado contida no continente africano, sem afectar o resto do mundo.
A União Europeia decidiu, depois de uma reunião de emergência do grupo de trabalho que se dedica a dar resposta integrada a crises, restringir temporariamente os voos a partir da África do Sul, Botsuana, Suazilândia, Lesotho, Moçambique, Namíbia e Zimbabué, e introduzir testes, rastreamentos de contactos e quarentenas aos passageiros da África Austral, devido à variante Ómicron.
O primeiro a reagir, mesmo antes de a União Europeia ter tomado qualquer decisão, foi o Reino Unido, que decidiu introduzir novas restrições às viagens de e para seis países africanos, incluindo a África do Sul, devido à crescente preocupação com a mutação do vírus recém-descoberta. Na tarde de sábado juntou também Angola à lista vermelha.
Também a Alemanha, a Itália e a Holanda anunciaram logo restrições a viagens de e para a África Austral. E, na noite de sexta-feira, chegou a notícia de que Portugal, onde ainda não foi registado nenhum caso desta variante, passa a obrigar os passageiros da África do Sul, Botsuana, Swazilândia, Lesoto, Namíbia e Zimbabué a ficarem em quarentena durante 14 dias. A partir das 00:00 de segunda-feira, 29 de Novembro, os voos de e para Moçambique vão ser suspensos.
Entretanto a companhia Qatar Airways já incluiu Angola na lista vermelha, impedindo os voos de e para Luanda.
Por sua vez, Angola anunciou este sábado que vai encerrar fronteiras com sete países africanos - África do Sul, Botsuana, Suazilândia, Malawi, Moçambique, Namíbia e Zimbabué - a partir de 01 de Dezembro. O objectivo é tentar conter a propagação da nova variante do vírus da covid-19, Ómicron.
Mas a Ómicron chegou também à Europa, onde foram já detectados vários casos, dando razão a todas a vozes que se têm levantado para defender uma campanha de vacinação mundial.
Sobre a nova variante, os estudos em curso dirão se é mais ou menos letal do que a Delta, que é a que actualmente mais mortes e contágios provoca em todo o mundo, e ainda se se trata efectivamente de uma variante com alta mobilidade.
O outro ponto em interrogação é se se trata de uma variante capaz de iludir as vacinas ou se é susceptível de ser controlada por elas.
Os cientistas citados pelos media especializados referem que o facto de surgirem novas variantes por si só não é nada de especial, porque sucede habitualmente, acabando por desaparecer naturalmente quando são de menor transmissibilidade que a ou as dominantes nessa geografia.
Esta decisão da União Europeia pode voltar a encerrar a porta a quem queira sair de Angola tendo como destino a Europa, mas Portugal, principal destino europeu dos angolanos e onde reside e trabalha uma grande comunidade portuguesa, descarta, para já, essa hipótese.
Mas a Ómicron pode ser uma dor de cabeça para Angola, pois, com perto de 34 milhões de habitantes, o País mantém, de acordo com o registo da Universidade Johns Hopkins, um dos registos mais baixos do mundo de vacinação - embora neste caso não exista falha de vacinas, estando mesmo os postos criados para o efeito com pouca frequência, e, se o País for invadido por uma estirpe com elevado grau de letalidade e transmissibilidade, com maior capacidade patogénica sobre a população mais jovem, avizinha-se uma tragédia, como advertem os especialistas da Organização Mundial de Saúde, que têm vindo a afirmar e a reafirmar que a imunização é mesmo a melhor forma de prever tal cenário.