O julgamento estava marcado para o dia a 26 de Janeiro mas a defesa do arguido solicitou o adiamento com a fundamentação de que Carlos São Vicente apenas foi notificado oito dias antes, pelo que o tribunal aceitou e remarcou para esta sexta-feira a primeira sessão.
O empresário vai ser julgado no Tribunal de Luanda, na 3ª secção criminal, num julgamento que tem como chamariz de relevo o facto de, por exemplo, o ex-Presidente da República e antigo PCA da Sonangol, Manuel Vicente, ter sido uma das pessoas ouvidas pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
São Vicente vai ser julgado no Tribunal de Luanda, na 3ª secção criminal, num julgamento que tem como chamariz de relevo o facto de, por exemplo, o ex-Presidente da República e antigo PCA da Sonangol, Manuel Vicente, ter sido uma das pessoas ouvidas pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
O fio dos acontecimentos
Foi a 28 de Janeiro de 2021 que a PGR ouviu ex-vice-Presidente da República e antigo PCA da Sonangol, Manuel Vicente, a propósito do caso de alegada corrupção e branqueamento de capitais que tem como figura central o empresário Carlos de São Vicente.
Manuel Vicente foi ouvido na condição de declarante e na Assembleia Nacional porque o estatuto dos ex-vice-Presidentes lhe permite escolher o local para o efeito.
O também deputado foi ouvido como declarante por ser presidente do Conselho de Administração da petrolífera nacional na altura dos factos que levaram Carlos de São Vicente à condição de arguido e depois a detido preventivamente por fortes suspeitas de corrupção e branqueamento de capitais que têm como génese uma transferência alegadamente ilegal de 900 milhões USD para um banco suíço.
Da acusação consta Carlos São Vicente, detido, como o Novo Jornal noticiou na ocasião, preventivamente desde 22 de Setembro de 2020, criou "um esquema ilegal" que lhe permitiu extrair à Sonangol mais de 900 milhões de dólares.
O empresário angolano, que entre 2000 e 2016 desempenhou, em simultâneo, as funções de director de gestão de riscos da Sonangol e de presidente do conselho de administração da companhia AAA Seguros, sociedade em que a petrolífera angolana era inicialmente única accionista, terá levado a cabo naquele período "um esquema de apropriação ilegal de participações sociais" da seguradora e de "rendimento e lucros produzidos pelo sistema" de seguros e resseguros no sector petrolífero em Angola, graças ao monopólio da companhia.
Desta forma, Carlos São Vicente passou a ser o "detentor maioritário das participações nas AAA Seguros, com 89,89%, em detrimento da Sonangol, que viu as suas participações sociais drasticamente reduzidas em 10% [a 10%], num prejuízo estimado em mais de USD 900.000.000,00 [cerca de 763,6 milhões de euros ao câmbio actual]", não tendo a petrolífera "recebido qualquer benefício", em contrapartida, adianta-se no documento.
De acordo com o despacho, o arguido terá referido que as cedências de participação foram feitas "com base num acordo informal" entre ele, enquanto representante da AAA Seguros, e o então presidente do conselho de administração da Sonangol, e mais tarde vice-presidente de Angola, Manuel Vicente.
Ainda de acordo com o despacho transcrito, "grande parte do Activos das AAA Seguros, SA, que já cessou a actividade, pertencem a outras empresas do mesmo grupo detidas/controladas pelo arguido Carlos Manuel de São Vicente", através de "um processo fraudulento em prejuízo do Estado angolano". Perante o exposto, o documento conclui "não restarem dúvidas, dos suficientes indícios de estar o arguido Carlos Manuel de São Vicente, incurso na prática dos crimes de peculato (...), recebimento indevido de vantagens (...), corrupção (...), participação económica em negócio (...) tráfico de influências".
O AAA, liderado por Carlos São Vicente, é um dos maiores grupos empresariais angolanos, operando na área de seguros e da hotelaria.
Entretanto, soube-se que a família do empresário, aproveitando a sua condição de luso-angolano, pediu ao primeiro-ministro português, António Costa, como foi noticiado em Maio do ano passado, para o Estado português interceder diplomaticamente tendo em conta a fragilidade da sua saúde.
Numa carta enviada ao chefe do Governo de Lisboa, a família do homem de negócios, que é casado com a filha do primeiro PR angolano, Agostinho Neto, Irene Neto, destacando a "saúde cada vez mais precária" do empresário, defende que estava na altura de "o Estado português se manifestar diplomaticamente ao mais alto nível sobre uma situação que está a ser seguida em todo o mundo e envolve um cidadão seu, inocente e perseguido, indevidamente preso desde 22 de Setembro de 2020".
Depois desta carta, Costa e o Presidente João Lourenço já estiveram juntos por mais de uma vez mas não há registo de que o assunto tenha sido abordado.
Recorde-se que, como o Novo Jornal noticiou na altura, decorria o ano de 2020, foi devido a uma notícia divulgada nos media suíços que este caso começou a ganhar dimensão, tendo evoluído, desde então, para um dos mais mediáticos em anos,
Um dos momentos mais salientes ocorreu quando, em Outubro de 2020, a PGR foi obrigada a explicar o envio de uma resposta às autoridades suíças de que não exista qualquer investigação a decorrer envolvendo o empresário.
Foi ainda alvo de grande destaque mediático o conjunto de bens apreendidos a Carlos São Vicente pelo Serviço Nacional de Recuperação de Activos da PGR.