Nos últimos dias, os bancos de urgência dos hospitais públicos de Luanda registam um elevado número de pacientes à procura de assistência médica devido à malária, dengue e chikungunya, que são as principais causas de morte de milhares de angolanos.
A unidade de cuidados intensivos é a designação dada a uma sala ou estrutura hospitalar que se caracteriza como unidade complexa dotada de sistema de monitorização contínua que admite pacientes potencialmente graves ou com descompensação de um ou mais sistemas orgânicos e que com o suporte e tratamento intensivos tenham possibilidade de se recuperar.
Ao Novo Jornal, familiares e técnicos de saúde dos hospitais Josina Machel, Américo Boavida e do Pediátrico David Bernardino, confidenciaram que o tempo de espera que muitos pacientes enfrentam para darem entrada nos cuidados intensivos é longo, o que faz com que os familiares com condições financeiras transfiram os seus parentes para as unidades privadas. Os doentes cujas famílias não têm condições para a sua transferência permanecem à espera de uma vaga, mas há aqueles que acabam por falecer antes que essa vaga chegue.
Alguns técnicos de saúde dos hospitais referenciados, que solicitaram anonimato, contaram que nos últimos dias têm constatado a existência de "pacientes, cujo quadro é crítico, e que necessitavam de ser internados nas unidades de cuidados intensivos, e por não existirem vagas, muitos vão a óbito".
"Infelizmente esse é o quadro actual, há pacientes que já estão críticos e ainda ficam semanas à espera. Os que têm sorte resistem, os que não têm, morrem", contou um técnico do Hospital Josina Machel, também conhecido como "Maria Pia".
Um médico do Hospital Américo Boavida contou que nos últimos tempos aquela unidade de saúde regista muitos doentes graves e na sua maioria com critérios para internamento nos cuidados intensivos.
O médico confidenciou que a maioria dos pacientes que ficam à espera de vaga acaba por morrer no banco de urgência.
No Hospital Pediátrico David Bernardino, uma enfermeira segredou que há muitos casos críticos de crianças que necessitam de internamento na UTI e que ficam dias nas urgências.
"A situação esta feia, temos dias em que só há vagas em caso de um dos pacientes ir a óbito. No banco de urgência a situação ultrapassa- nos. Infelizmente há médicos que choram ao ver essa triste realidade que ninguém pode mostrar", narrou.
Uma mulher de 42 anos, cujo nome preferimos ocultar, e que se encontra internada no Hospital Américo Boavida há vários dias, disse que viu morrer duas jovens que necessitavam urgentemente de ser transferidas para os cuidados intensivos.
"A tia Filó e Márcia morreram na semana passada, o estado delas se agravou e não tinha vagas na UTI. Faleceram mesmo aqui", descreveu a mulher, em lágrimas.
Um cidadão cujo familiar teve um acidente de viação contou ao Novo Jornal que este faleceu por não ir a tempo para a sala de cuidados intensivos.
"Há muita gente a morrer por falta de assistência médica oportuna. O meu cunhado só morreu porque precisava de ser entubado nos cuidados intensivos, segundo a médica que o atendeu, mas como não havia espaço não resistiu ao tratamento na urgência e faleceu", explicou.
Ao Novo Jornal, o presidente do Sindicato Nacional dos Médicos de Angola, Adriano Manuel, referiu que a situação é grave e lamentou o facto de as autoridades competentes não acautelarem esse pormenor.
"Infelizmente as pessoas não estavam preparados para situação que vivemos. O pior é que as unidades de cuidados intensivos em Luanda quase não têm médicos especializados, imaginem nas províncias? As pessoas morrem. Nesta fase em que estamos com os hospitais abarrotados não há dúvida nenhuma dessa situação", descreveu.
Direcções dos hospitais contrariam a versão e negam inexistência de vagas
O director-geral do Hospitais Josina Machel "Maria Pia", Carlos Zeca, garantiu ao Novo Jornal não ser verdade que na sua unidade há lista de doente à espera de irem para os cuidados intensivos, mas reconheceu que das 13 camas existentes, todas se encontram preenchidas em função do "Maria Pia" receber doentes de quase todo o País.
"Esta unidade recebe muitos doentes, e quando as vemos cheias é sinal de que trabalhamos. Por isso é que ficam cheias, o que para nós é normal, pois os cuidados intensivos de hoje já têm outra realidade", salientou.
Segundo o responsável, não há registo no banco de urgência do Josina Machel de doentes críticos à espera por uma vaga para os cuidados intensivos ou de doentes que faleceram enquanto esperavam por uma vaga.
Francisco Domingos, director-geral do Hospital Pediátrico David Bernardino, negou a inexistência de vagas para atender doentes críticos a necessitar de cuidados intensivos e assegurou que o quadro é similar aos outros.
"É falso que o Hospital Pediátrico David Bernardino não tem vagas para atender aos doentes críticos, nos cuidados intensivos. A única verdade é que o hospital tem sobrelotação como os outros", disse.
"Não há filas de doentes críticos para ir para os cuidados intensivos. Como responsável posso afirmar ser mentira. Há má-fé destas pessoas que reclamaram, acusou.
"Se a unidade dos cuidados intensivos estivesse cheia, e a não atender os doentes críticos como dizem estar, teríamos um aumento exponencial do número de óbitos e não é essa a realidade", explicou. E acrescentou: "A nossa unidade funciona e tem tido vagas".
No Hospital Américo Boavida, o Novo Jornal tentou ouvir a direcção, mas sem êxito.