A desistência do 1.º de Agosto das competições de voleibol significa, em termos práticos, o começo da morte de mais uma modalidade. Por isso mesmo é que o presidente da respectiva federação, o antigo "internacional" Domingos Valentim, ele que por sinal defendeu as cores do campeoníssimo 1.º de Agosto, tentou demover o líder "agostino" da decisão já tomada e anunciada publicamente, em carta datada de 20 de Setembro de 2020. Saindo do cenário competitivo o clube do Rio Seco, é como se o comboio perdesse a sua locomotiva e ficasse apenas com os vagões, que no caso concreto do voleibol angolano já são muito poucos. Sem locomotiva ou uma unidade automotora, o comboio não vai a lado nenhum. Não consegue deslocar-se!

O fecho das portas do 1.º de Agosto (competia com duas formações em seniores masculinos) ao voleibol é um sinal muito preocupante, que se soma a um outro ocorrido há poucos anos. Trata-se do abandono da formação do Instituto Médio de Economia de Luanda (IMEL), que já teve a suprema honra de erguer a taça de campeão nacional em femininos. Desse modo, em Luanda sobram apenas Petro-Atlético de Luanda, Blu VC e Dom Bosco. Além da capital do País, só há mais duas províncias, designadamente Huíla e Namibe com competição de seniores. Felizmente no Sul do País o voleibol está em mãos de trabalho de impressionante qualidade, sendo o Atlético do Namibe um exemplo de se lhe tirar o chapéu.

Com o abandono do 1.º de Agosto a competição interna sofre um rude golpe. Não apenas pelo facto de o "rubro-negro" contender com duas equipas, que passam agora a contar a menos, mas, sobretudo, porque a competitividade vai seguramente baixar. É que o voleibol nacional perde duas turmas de primeira linha. Os jogadores ora dispensados podem até migrar para outros clubes, mas a perda de duas equipas é dura demais e pode ter efeito dominó. Ou seja, se o clube do Rio Seco que nada em dinheiro - comparativamente aos seus concorrentes nacionais, é claro - desistiu, é claro que agremiações cujos atletas jogam por uma bolsa de estudo ou muito menos, podem mais facilmente capitular.

Do modo como está o cenário do voleibol nacional, outras colectividades desportivas podem também bater com a porta. Afinal, o que impele os clubes a entrarem em provas é a competitividade, o desafio de defrontar os melhores, a ambição de vencer a concorrência. Por consequência, os espectadores acompanham preferencialmente disputas nas quais a incerteza no resultado está sempre presente, sendo também este o leitmotiv que atrai anunciantes, os quais ajudam qualquer modalidade ou competição a crescer. Mesmo em Angola, onde a generalidade dos dirigentes desportivos pouco ou nada entende de marketing, merchandising e outras acções que proporcionam ingressos financeiros razoáveis, a tendência é igualmente esta.

Obviamente que "futurologia" não é "ciência" que dominamos. Mas, num cenário económico adverso, não espanta nada que daqui por mais uns meses um ou outro emblema diga também adeus à modalidade. Atentemos, por exemplo, ao caso do Blue VC. Ao que se diz, o seu surgimento tem essencialmente que ver com o facto de uma alta figura da empresa que sustenta o clube ter uma forte afinidade com a modalidade, algo que deve merecer o aplauso de todos os verdadeiros desportistas. De sorte que a marca angolana de refrigerantes Blue é patrocinadora de um dos principais emblemas do voleibol português, a Fonte do Bastardo, dos Açores. Sendo a mola impulsionadora de todo esse movimento alguém expatriado, quando acabar a sua missão e regressar a terra, provavelmente esta colectividade surgida no voleibol nacional nos últimos anos desaparecerá. Principalmente se a actual aposta não radica numa decisão estratégica da empresa na busca da publicidade da sua marca.

Desde que há sensivelmente duas décadas o Governo entendeu sustentar apenas um punhado de clubes, deixando a maioria ao Deus dará, o voleibol transformou num comboio que vem perdendo vagões. Atentemos. No Uíje, que foi potência escolar, a modalidade desapareceu, assim como em Benguela, que forneceu emblemas campeões nacionais em ambas as classes. Os "militares", que marcavam presença regular nos torneios do Comité Desportivo dos Exércitos Amigos (SKDA) deixaram de o fazer, assim como durante muito tempo não se fizeram presentes numa competição africana de clubes, algo banal na década de 1980. Naquela altura, o País até tinha muito mais dificuldades, num contexto histórico peculiar durante o qual até a alimentação era racionada. Nada era comparável com o actual momento. As próprias Selecções Nacionais, quase já não se fazem à quadra para provas continentais. O que quer dizer que a maior parte dos clubes joga para quase nada, joga apenas para o campeonato Nacional - no voleibol de praia o cenário é ligeiramente diferente para melhor.

Depois de haver perdido todas essas carruagens, eis que agora o comboio do voleibol nacional perde a locomotiva. Isto não pressagia futuro airoso. Antes pelo contrário, indicia períodos negros para a modalidade. É óbvio que com excelente trabalho que vem fazendo, o Atlético do Namibe até pode alcandorar-se à condição de locomotiva, o que seria uma lufada de ar fresco no desporto angolano, que gira à volta de Luanda. Mas sem a capacidade financeira do 1.º de Agosto provavelmente não irá tão longe e pode não aguentar-se muito tempo. E se assim for, é o voleibol que corre o risco de desaparecer do mapa desportivo angolano.

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