Entra governador, sai governador, o lixo mantém-se soberano em Luanda. Mas, afinal, o que corre assim tão mal na administração da capital? Em entrevista ao Novo Jornal, publicada na edição n.º 429, ainda nas bancas, Vladimir Russo lembra que "Luanda tem um terço da população, é o centro político e económico, há diversos interesses e pessoas procurando "um lugar ao sol". Por isso há mais competitividade e crítica".
Neste cenário, o ambientalista defende um modelo de gestão dos resíduos "o mais descentralizado possível", frisando, porém, que não se pode deitar fora a experiência acumulada. "A Elisal é a Sonangol dos resíduos e acumula muita experiência, pois esteve sempre associada ao processo de limpeza da cidade, tanto nos momentos maus como nos momentos melhores".
Para o também presidente da Fundação Kissama - vocacionada para a protecção da fauna e flora angolana -, é igualmente necessário considerar alguns dos avanços já realizados.
"Por exemplo, a pretensão de delegar aos municípios a responsabilidade pela gestão do processo de contratação das empresas de recolha de resíduos era uma luz no fundo do túnel. Ainda não compreendi como será feito neste novo modelo, mas um modelo baseado numa democracia participativa onde os fóruns municipais de auscultação e concertação social servem para auscultar e discutir, de forma conjunta, soluções pode ajudar a dirimir os problemas da cidade".
Lembrando que parte da nossa governação permanece alicerçada no exercício de uma liderança "do topo para a base", o ambientalista nota que "muita gente defende a implantação do modelo das autarquias o mais depressa possível, pois vêem nele a solução para grande parte dos problemas", advertindo: "Na realidade o que nos espera são grandes desafios".
Para começar, Vladimir sublinha que a "gestão participativa dos municípios e comunas pressupõe uma concertação entre governadores e governados". Por isso, "se por um lado as autarquias vão permitir uma maior descentralização dos serviços administrativos e da gestão da coisa pública, elas também vão exigir mais do cidadão e do político".
Segundo o presidente da Fundação Kissama, a "transição deverá ser preparada com cautela", porque as autarquias são "parte da solução e não "a solução"".
"O que é preciso é disciplina e acabar com a impunidade", assinala.
560 milhões USD para o lixo no OGE 2017
Já sobre a factura do lixo, Vladimir realça que a "gestão de resíduos é uma tarefa cara em qualquer parte do mundo", podendo, porém, ser aliviada, "se for feita uma gestão e não apenas o transporte de um contentor (nas nossas casas) para um contentor maior (o aterro)".
Os encargos, somados ao aumento do consumo na capital, tornam expectável que o Orçamento Geral do Estado continue e aumentar a verba destinada à gestão dos resíduos.
"Para o ano de 2012, o OGE previu um gasto de 406 milhões de dólares para a actividade de gestão dos resíduos sólidos, o que representa um aumento significativo (para o dobro) quando comparado com os 201 milhões de dólares gastos em 2011. E é expectável que para 2017 se necessitem de cerca de 560 milhões de dólares para todo o país e em 2025 perto do dobro desse valor".
As previsões antecipam também uma redução do esforço financeiro do Estado, a partir da comparticipação da população, com resultados, já visíveis, ainda que tímidos.
"Em Luanda, por exemplo, tem havido cobrança de taxas aos estabelecimentos do sector de comércio e serviços, tendo sido possível arrecadar anualmente cerca de 8 milhões de dólares. Um valor pequeno mas significativo e que pode aumentar se houver melhor fiscalização, mas também um serviço eficiente de recolha de resíduos por parte das operadoras de resíduos, incluindo a Elisal", nota Vladimir Russo, apelando à responsabilização. "Não se podem assinar contratos e não cumprir os termos acordados entre as partes".