Perante a evidência de que em muitos países africanos, com escassas excepções, como a África do Sul e certos países do Norte, como o Egipto ou Marrocos, cujo número de infecções se manteve alto, os investigadores viram-se perante a necessidade de encontrar outra abordagem a este problema e concluíram que existe uma forte possibilidade de as populações destas regiões apresentam uma imunidade natural ao SARS CoV-2 devido à exposição prolongada a outras infecções virais.

O novo coronavírus está claramente a comportar-se de forma muito diferente em relação ao que a OMS e outros organismos internacionais perspectivavam para África, sendo que alguns dos factores até aqui apontados, como a juventude da maioria da população, em muitos casos com médias abaixo dos 20 anos, ou as condições climáticas específicas nalguns países, paecem não ser suficientes para explicar a fraca penetração da pandemia no continente.

Um dos elementos que conduziu à estranheza é que em várias partes de África, a pandemia atingiu o seu pico muito mais cedo que o esperado, como explicou ao The Guardian Francesco Checchi, professor na London School of Hygiene and Tropical Medicine - Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres -, que apontou o Quénia, a Tanzânia e o Sudão como exemplos onde a Covid-19 não progrediu como era esperado pela ciência.

"Estamos a verificar um comportamento que nos confunde um bom bocado", disse este investigador no âmbito de um inquérito internacional realizado pelo Comité para o Desenvolvimento do parlamento britânico, como é disso um bom exemplo o Quénia, onde os modelos pré-existentes foram claramente ofuscados pela realidade pandémica.

O mesmo, curiosamente, sucedeu no Iémen, uma país que atravessa uma severa crise humanitária, onde, como sucede em muitos países africanos, o SARS CoV-2 se mostrou muito "temeroso" na sua progressão apesar de as péssimas condições sanitárias e que vivem milhões de pessoas, como a OMS realçou no início da pandemia, fazerem prever o contrário e sem medidas de prevenção, sendo que no Iémen elas são 100% ausentes e o pico ocorreu em Maio e não voltou a haver enchentes nos hospitais que ainda funcionam.

O facto é que faltam explicações com base científica para esta realidade bizarra em termos que podem ser considerados normais na Europa, na Ásia ou mesmo em algumas áreas de África.

Uma das formas utilizadas para detectar o avanço da infecção é o controlo da dimensão dos cemitérios no Iémen através de imagens de satélite, o que pode ser feito igualmente em África, ou ainda de locais de sepultura de pessoas fora de áreas confinadas, como ocorre em algumas culturas africanas, e esses dados confirmam, ou podem vir a confirmar, que ocorreu um pico em determinada altura mas que, depois, esse volume de mortes foi estancado, contrariando o que se esperava.

Números da pandemia em África

África registou até hoje pouco mais de 33 mil mortos para um total de casos confirmados de 1.365.689, segundo dados recentes do Centro de Controlo e Prevenção de Doenças da União Africana (África CDC).

A África do sul, segundo dados divulgados hoje pela Lusa, continua com o maior número de casos, com 651.521 casos e 15.641 mortos.

O Egipto é o segundo país africano mais 5.679 mortos e 101.340 infectados, e Marrocos passou a Argélia e tornou-se já o terceiro com mais mortos, 1.648, passando também os 90 mil casos, 90.324. A Argélia tem 1.632 mortos e 48.737 casos.

Entre os países africanos que têm o português como língua oficial, Angola lidera em número de mortos e Moçambique em número de casos.

Angola, que nas últimas 24 horas, referentes a terça-feira, bateu o recorde de casos diários, com 130, regista 139 mortos e 3.569 casos, seguindo-se a Guiné Equatorial (83 mortos e 5.000 casos), Cabo Verde (46 mortos e 4.904 casos), Guiné-Bissau (39 mortos e 2.303 casos), Moçambique (37 mortos e 5.713 casos) e São Tomé e Príncipe (15 mortos e 906 casos).