Mas, mesmo que o petróleo dê mostras de ter o casco robusto para resistir às tempestades que se avizinham - basta lembrar a periclitante situação no Médio Oriente e na Ucrânia, sem esquecer que Donald Trump assume o poder nos EUA dentro de 18 dias -, 2024 foi ano de má memória.

No ano passado a matéria-prima perdeu mais de 3%, num ano que sucedeu a outro já negativo, como foi 2023, e os danos não foram mais severos porque a OPEP+, que agrega a OPEP à Rússia + nove produtores independentes, manteve o freio apertado na produção...

Porém, tanto a crise prolongada na Ucrânia, que continua a gerar motivos de preocupação, como foi a recente decisão de Kiev fechar a torneira ao gás que Moscovo enviava para a Europa ocidental pelo seu território, como as do Médio Oriente, podem ser "ventiladores" para o sufoco em que o negócio das energias fosseis se encontra face à emergência das alterações climáticas.

Para já, é na China que os analistas focam os seus binóculos optimistas porque o gigante asiático dá mostras de estar a sair de um prolongado semi-coma económico, aumentando as expectativas de mais consumo e mais incentivos estatais para revigorar a "fábrica do mundo".

E foi com este cenário em fundo que o barril de Brent, que serve de principal referência para as exportações angolanas, se estirou esta sexta-feira, 03, perto das 08:45, hora de Luanda, para os 75,92 USD, uma subida muito ligeira face ao fecho da sessão anterior.

E tudo porque o Presidente chinês, Xi Jinping, escolheu o optimismo como a força motriz do seu discurso de ano novo, anunciando, embora sem especificar, fortes medidas promover o crescimento económico, o que chega em cima dos dados mais recentes ferentes a Dezembro de 2024, onde foi notório um aumento da actividade fabril.

Há, no entanto, uma questão que pende sobre este optimismo como uma lâmina afiada mas mãos de uma criança, que é a ameaça do novo Presidente dos EUA, Donald Trump, desferir novos golpes na economia chinesa com o aumento das tarifas para as exportações da China.

Se, tal como está a prometer desde a campanha eleitoral, Trump abrir o seu segundo mandato com novas tarifas sobre o que vem da China para os EUA, então o barril de crude pode começar a esvaziar porque a China é o maior importador de crude do mundo.

Sendo imprevisível, Trump será um factor a ter em conta no que importa para antecipar o que vão ser os mercados petrolíferos nos próximos meses. Mas não só... também o balançar das placas tectónicas do Médio Oriente e do leste europeu terão um protagonismo claro nesse processo.

Todavia, para já, e no que diz respeito a Angola, que cumpre agora o seu primeiro ano desde 2007 fora da "board" da OPEP, estes valores de início do ano são positivos.

Como Luanda olha para este cenário global?

O actual cenário internacional, tanto na economia norte-americana, que segue lado a lado com notícias relativas à economia chinesa, tende a manter os preços ligeiramente acima do valor médio estimado no OGE 2025, que é de 70 USD.

Preços estes que ainda estão a grande distância dos que foram atingidos no pico do ano de 2024, que aconteceu em Abril, quando chegou perto dos 92 USD por barril, ou mesmo, mais recentemente, em Outubro, onde esteve nos 80 USD.

E Angola é um dos países mais atentos a estas oscilações, devido à sua conhecida dependência das receitas petrolíferas, e a importância que estas têm para lidar com a grave crise económica que atravessa, especialmente nas dimensões inflacionista e cambial.

No entanto, porque o OGE nacional elaborado para 2025 ter apostou nos 70 USD, o actual valor deixa as contas nacionais a balancear porque qualquer desequilíbrio pode afectar negativamente as contas nacionais.

Isto, porque o crude ainda responde por cerca de 90% das exportações angolanas, 35% do PIB nacional e 60% das receitas fiscais do país, o que faz deste sector não apenas importante mas estratégico para o Executivo.

O Governo deposita esperança, no curto e médio prazo, de conseguir o objectivo de aumentar a produção nacional, actualmente perto dos de 1,12 mbpd, gerando mais receita no sector de forma a, como, por exemplo, está a ser feito há anos em países como a Arábia Saudita ou os EAU, usar o dinheiro do petróleo para libertar a economia nacional da dependência do... petróleo.

O aumento da produção nacional não está a ser travada por falta de potencial, porque as reservas estimadas são de nove mil milhões de barris e já foi superior a 1,8 mbpd há pouco mais de uma década, o problema é claramente o desinvestimento das majors a operar no país.

Aliás, o Governo de João Lourenço tem ainda como motivo de preocupação uma continuada e prevista redução da produção de petróleo, que se estima que seja na ordem dos 20% na próxima década, estando actualmente pouco acima dos 1,1 milhões de barris por dia (mbpd), muito longe do seu máximo histórico de 1,8 mbpd em 2008.

Por detrás desta quebra, entre outros factores, o desinvestimento em toda a extensão do sector, deste a pesquisa à manutenção, quando se sabe que o offshore nacional, com os campos a funcionar, está em declínio há vários anos devido ao seu envelhecimento, ou seja, devido à sua perda de crude para extrair e as multinacionais não estão a demonstrar o interesse das últimas décadas em apostar no país.

A questão da urgente transição energética, devido às alterações climáticas, com os combustíveis fosseis a serem os maus da fita, é outro factor que está a esfumar a importância do sector petrolífero em Angola.