O chefe da diplomacia russa, citado pelos media do seu país, que tem aqui o seu primeiro encontro com o homólogo chinês, Wang Yi, desde que começou a guerra na Ucrânia, com a invasão do país pelas forças russas, a 24 de Fevereiro, aproveitou para manter o conflito em evidência mediática afirmando que os dois países buscam como objectivo comum alterar a actual ordem mundial, que está assente em instituições criadas no pós II Guerra Mundial e onde os países ocidentais, especialmente os EUA, "ditam as regras", como a ONU, o FMI ou o Banco Mundial, entre outras.

A Russian Today, o canal internacional de televisão russo, lembra hoje, 30, a propósito deste encontro entre Yi e Lavrov, que a China não condenou a invasão russa da Ucrânia e não alinhou nas sanções ocidentais a Moscovo, tendo mesmo afirmado o fortalecimento da parceria com a Rússia já decorria a grave crise no leste europeu.

Lavrov, assim que chegou à cidade de Tunxi, na província de Anhui, frisou esse objectivo comum entre os dois países vizinhos, Rússia e China, de trabalharem para criar uma ordem mundial "justa, multipolar, e democrática".

Da parte chinesa, segundo a agência TASS, Wang Yi disse, na mesma ocasião, que, "apesar dos novos desafios" para as relações entre Moscovo e Pequim, "a vontade dos dois dias é a de desenvolver relações ainda mais fortes que as actuais".

Recorde-se que um dos episódios mais quentes na diplomacia mundial desde o começo da guerra na Ucrânia foi a longa conversa entre os Presidentes dos EUA, Joe Biden, e da China, Xi Jinping, onde o primeiro procurou afastar o segundo da Rússia, no seu esforço por isolar Moscovo na comunidade internacional, tendo mesmo ameaçado a China com represálias económicas se mantivesse as estreitas relações comerciais com os russos.

Essa pretensão dos norte-americanos não foi aceite pela China, que, pelo contrário, reafirmou, como Yi repete agora neste encontro com Lavrov, que os dois países estão a reforçar essas relações, tendo, já este mês o chefe da diplomacia chinesa afirmado que as duas capitais têm uma relação de aço.

A referida nova ordem mundial de Lavrov tem como contraparte a actual ordem mundial, que pode ser definida pelas suas instituições alegadamente controladas pelos países ocidentais, especialmente os da União Europeia, dos EUA, da Austrália, Japão ou Coreia do Sul, mas que alguns analistas sublinham ser errado este conceito geográfico, preferindo uma divisão entre democracias plenas e as autocracias ou regimes autoritários, onde estão países como a China, que vive uma ditadura do Partido Comunista, ou a Rússia, uma autocracia, onde o poder está claramente concentrado num só homem, o Presidente, mas também a Índia ou a maior parte dos países africanos e alguns latino-americanos.

A paz à mesa...

Entretanto, na Turquia a Rússia anunciou uma retirada substantiva das forças russas posicionadas nos arredores de Kiev e CHernihiv, entre de outras cidades no norte do país, para, segundo as agências de notícias russas, "criar uma mais sólida confiança mútua" no decurso das negociações de forma a facilitar a assinatura de um acordo o mais rápido possível com a Ucrânia.

Também o chefe da delegação russa em Istambul, Vladimir Medinsky, aferiu este reposicionamento de Moscovo, sublinhando que o seu país deu passos fundamentais para "reduzir a conflitualidade" na Ucrânia

Medinsky acrescentou que do lado ucraniano foram acolhidas propostas clarificadoras da sua posição para que seja possível assinar um acordo de paz, que serão agora dadas a conhecerão Presidente Putin e, depois, será dada uma resposta concreta à parte ucraniana, no ar a ideia, agora mais consistente, de que um encontro entre Zelensky e Putin é possível em breve e que este pode coincidir com a assinatura de uma acordo de paz.

Do lado ucraniano, segundo o chefe da delegação na capital turca, Mykhailo Podolyak, um dos pontos considerados essenciais é que a segurança da Ucrânia seja assegurada por terceiros num formato semelhante ao definido pelo Artº 5 da NATO; que é de resposta militar imediata perante uma agressão externa.

Podolyak, que também é um dos principais conselheiros de Zelensky, adicionou que Kiev exige que os terceiros a garantir a segurança ucraniana devem ser os EUA, Reino Unido, Turquia, França e Alemanha, sendo este respaldado por um referendo nacional.

Embora dificilmente a Rússia possa vir a aceitar esta condição, nomeadamente a inserção neste grupo de segurança dos Estados Unidos, depois das palavras ditas pelo Presidente Joe Biden sobre o Presidente russo, Vladimir Putin, a quem considerou um assassino", um "carniceiro" e sobre quem disse que devia "ser afastado do poder" em Moscovo, ou ainda a estrutura dos artigos que permitem apertar o gatilho, este passo é visto pelos analistas como "de extrema importância" por colocar as partes nos "carris da paz" e não no caminho da escalada bélica.

Contexto

A 24 de Fevereiro, depois de semanas de impaciente expectativa, as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação especial", sublinhando que o objectivo não é a ocupação do país vizinho mas sim a sua desmilitarização e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional, criticando fortemente o avanço desta organização de defesa para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS.

Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de KIev da soberania russa da Península da Crimeia, integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro.

Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1992, com o colapso da União Soviética.

Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país.

Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%.

Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios...

Milhares de mortos e feridos e mais de 4 milhões de refugiados nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.

O histórico recente desta crise no leste europeu pode ser revisitado nos links colocados em baixo, nesta página.