Há muito que esta barragem, no Rio Dniepre, situada numa área da região de Kherson sob domínio russo, construída pela então União Soviética, na década de 1950, está a ser usada pelas duas partes em conflito, com russos e ucranianos a acusarem-se mutuamente de estarem a organizar a explosão da infra-estrutura como ferramenta de guerra.
A destruição parcial, na parte superior da estrutura, está a gerar um fluxo anormal de água para jusante mas não uma enxurrada descontrolada, gerando inundações mas não devastação generalizada como sucederia se o reservatório gigantesco fosse implodido totalmente, nas povoações ao longo do Rio Dniepre em direcção ao Mar Negro, onde desagua.
Moscovo acusa os ucranianos de terem estado por detrás da explosão das portas de controlo do fluxo de água do reservatório, enquanto Kiev acusa os russos de o terem feito. Ambos se têm acusado de terem essa intenção há largos meses, praticamente deste que a Rússia ocupou uma parte importante da região de Kherson.
Os analistas dividem-se quanto a quem teria, no contexto do conflito e na presença da conra-ofensiva ucraniana em curso,, mais a ganhar com as áreas inundadas a jusante da Barragem de Kakhovka, que fica próximo da cidade de Nova Kakhovka, especialmente quando a Ucrânia está a lançar uma contra-ofensiva que ainda é cedo para se saber se é a aguardada e definitiva ou apenas uma experimentação da capacidade de resposta das unidades de Moscovo.
Seja como for, como tem sucedido quase sempre, os media ocidentais, sem quaisquer provas, além das declarações dos responsáveis de Kiev, dizem que foram os russos que fizeram explodir a infra-estrutura, na maior parte dos casos sem sublinhar que se trata de danos parciais e não totais, enquanto os media russos apontam o dedo, citando responsáveis russos, aos ucranianos.
Nem um nem o outro lado apresentou provas mínimas das alegações que faz contra o outro lado das trincheiras. O que parece já mais ou menos provado é que os danos parciais na estrutura foram feitos, durante a madrugada de segunda-feira para hoje, terça-feira, 06, através de disparos de artilharia e não de cargas explosivas colocadas no local.
Citado pelo site da Russia Today, o administrador russo da região, Vladimir Leontyev, disse que esta situação pode levar a uma subida das águas a jusante da barragem na ordem dos 12 metros nalgumas zonas, de onde estão a ser evacuadas as pessoas mais expostas a riscos.
Disse ainda que estas inundações começarão, se não houver novos ataques, a voltar ao cadal normal do rio, em 72 horas, tempo que levará a levar o excesso de água libertado da represa até ao mar.
Entretanto, a Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA), que tem uma equipa alargada na Central Nuclear de Zaporizhia, sob controlo russo, já veio dizer que este atentado a infra-estrutura não põe em causa a segurança dos reactores e, para já, não há nada a temer quanto a esse aspecto.
As autoridades russas da parte de Kherson que está sob domínio de Moscovo, citadas pelo Sputnik News, media estatal russo, já vieram garantir que existe um dispositivo para evacuar as populações a jusante se houver novos ataques à infra-estrutura, mas que, por agora, isso não é necessário.
O mesmo entendimento não têm as autoridades leais a Kiev, que, segundo o britânico The Guardian, uma das vozes mais próximas do regime de Kiev nos media ocidentais, lançaram um apelo para a evacuação das populações a jusante da represa face ao "risco iminente de inundações catastróficas".
Nos vídeos que rapidamente surgiram online, especialmente nas redes sociais Telegram e Twitter, pode-se ver claramente que a água que corre agora com maior intensidade passa apenas pelo topo da estrutura de betão onde antes se encontravam as válvulas de descompressão em caso de excesso de carga na albufeira.
Este episódio está a ofuscar mediaticamente a contra-ofensiva ucraniana que foi lançada no Domingo mas que os russos dizem ter repelido na totalidade apesar desta ter sido lançada em vários pontos dos mais de 1.000 quilómetros da linha da frente.
Segundo alguns analistas, a resposta russa foi imediata ao avanço das brigadas ucranianas, com recurso a artilharia de longo alcance e aviação, obrigando as forças de Kiev a interromper os avanços.
Sobre a contra-ofensiva, Kiev não tem falado desde Domingo, apenas lançou um vídeo onde coloca vários militares a levar o dedo aos lábios significando silêncio total sobre essa mesma operação de larga escala para a qual a Ucrânia estava preparada como o próprio Presidente Zelensky veio garantir horas antes e anunciar que já havia uma data definida para o avanço sobre as posições defensivas de Moscovo.
Alguns analistas admitem que existe como cenário possível que a contra-ofensiva não tenha começado da melhor forma para a Urânia, embora esta ainda esteja apenas no início e, por isso, ser muito cedo para tirar conclusões, e que este "incidente" na barragem de Kakhovka serve para divergir as atenções dos media da linha da frente para a superfície das águas da represa.
No entanto, algumas evidências apontam para que a Rússia tenha mais a ganhar com esta situação (- mesmo que os ucranianos beneficiem da distracção da frente de batalha onde a contra-ofensiva não parece estar a correr da melhor maneira -), especialmente a jusante da barragem, onde cerca de uma dezena de olhas no Rio Dniepre, na região de Kherson, estavam ocupadas pelas unidades ucranianas que, face ao alagamento generalizado dessas ilhas, se viram forçados a retirar de urgência.
Ilhas estas que eram parte dos ganhos territoriais ucranianos conseguidos nos últimos meses, de onde afastaram algumas forças russas que para ali tinham retirado a partir da cidade de Kherson e de ouras localidades na margem direita do Rio Dniepre.
Por outro lado, é dificilmente explicável como é que os russos provocariam estes danos na represa sabendo que uma das consequências possíveis seria, como está a suceder, problemas sérios no canal de transvase do Rio Dniepre para a Península da Crimeia, que é a jóia da coroa dos territórios anexados por Moscovo e não tem praticamente mais nenhuma fonte de abastecimento de água doce.
Longe do lençol de água da barragem de Kakhovka, na linha da frente, o que se sabe é que as unidades especiais das forças ucranianas, integradas por russos que se opõem ao regime de Vladimir Putin, continuam a atacar a região de Belgorod, provocando um claro incómodo no Kremlin, a ponto de Putin já ter exigido aos seus chefes militares uma resposta decisiva a esta "ousadia", o que tem resultado no anúncio de centenas de baixas nas forças atacantes ao serviço de Kiev que Kiev nega estar por detrás.
Sabe-se também que os ucranianos anunciaram ganhos territoriais na zona de Bakhmut, de onde saíram as forças do Grupo Wagner há duas semanas após tomarem a cidade por inteiro.
Ainda que o Ministério da Defesa russo divulgou vídeos onde as suas forças, nomeadamente com armas antitanque e artilharia de precisão destroem dezenas de blindados ucranianos empenhados na contra-ofensiva na região de Donetsk.