Benjamim Netanyhau não quer negociar nada até destruir totalmente a organização palestiniana e, para isso, pediu mais armas aos amigos americanos, a quem lançou ainda a escada para ver se Washington lhe faz o favor de declarar guerra ao Irão.

Comparando-se ao antigo primeiro-ministro britânico Winston Churchill, que liderou o esforço de guerra aliado contra a Alemanha nazi na II Guerra Mundial, Benjamin Netanyhau disse, já na noite de quarta-feira, 25, perante o Congresso norte-americano, que o seu trabalho é destruir o Hamas.

E quantas mais armas lhe forem entregues pelos EUA mais depressa terminará esse trabalho, no qual juntou ainda o Hezbollah, o grupo xiita que controla o sul do Líbano e é apoiado pelo Irão, mantendo sob fogo o norte de Israel.

Isto, porque, recorrendo a um velho truque que, ao que parece, os norte-americanos são muito sensíveis, visto que tem funcionado com outros, por exemplo o Presidente ucraniano, alertou que, tal como a Rússia, se não for travada na Ucrânia, avançara, segundo Volodymyr Zelensky, pela Europa Ocidental, também o Irão marchará sobre os Estados Unidos se Israel não o travar no Médio Oriente.

E, para travar os ímpetos expansionistas do Irão, que são, desde a Revolução de 1979, lembrou Netanyhau perante um Congresso que o aplaudia em pé repetidamente, levar a revolução islâmica a todo o planeta, os EUA devem, defendeu, municiar o seu mais importante aliado no Médio Oriente, ou seja... Israel, com as armas necessárias para "fazer o trabalho".

Que é, desde logo derrotar o Hamas na actual guerra em Gaza, que já dura há mais de nove meses, e que, apesar do apoio ilimitado em armas e dinheiro americano, o mais poderoso exército do Médio Oriente e um dos mais robustos e modernos do mundo, não conseguiu ainda extinguir o Hamas, que conta apenas com armas ligeiras e roquetes caseiros.

Dos três objectivos enunciados por Benjamin Netanyhau logo após o 07 de Outubro, quando lançou a operação militar em Gaza, que eram destruir o Hamas, libertar todos os reféns e fazer deste território um lugar seguro para Israel, nenhum foi ainda conseguido.

Isto, dispondo de uma máquina militar com mais de 350 mil soldados, centenas de blindados, dezenas de aviões de guerra e milhares de peças de artilharia, em terra e no mar,, sendo um dos mais modernos, melhor equipados e maiores exércitos do mundo, contra cerca de 70 mil combatentes do Hamas, equipados apenas com armas ligeiras e roquetes caseiros.

O coelho na cartola de "Bibi"

Mas Netanyhau, conhecido nos EUA por "Bibi", foi ainda mais surpreendente durante este longo discurso no Congresso americano, o 4º que faz, ultrapassando mesmo os três de Winston Churchill, ao expor perante a assistência um grupo de familiares de reféns com histórias de vida comoventes, de forma a melhor sensibilizar os congressistas, num acto de mau gosto que está a ser fortemente criticado, mesmo internamente.

Lembrando o 07 de Outubro, data em que, no ano passado, um grupo de combatentes do Hamas e outros grupos palestinianos que combatem a ocupação israelita da Palestina, invadiu o sul de Israel, Benjamin Netanyahu enfatizou os cerca de 1.200 mortos, entre israelitas e estrangeiros, nesse dia, sublinhando a selvajaria dos atacantes mas nada dizendo sobre o que é hoje facto confirmado, que uma boa parte destas vítimas foram mortas pelas forças israelitas durante os combates.

E sobre os quase 40 mil palestinianos massacrados pelo Exército israelita nestes nove meses de conflito em Gaza, sendo que, destes, mais de 20 mil são crianças, e quase 15 mil mulheres e idosos, de acordo com dados da ONU, o primeiro-ministro israelita defendeu que se trata de uma mentira alimentada pelos media amigos dos terroristas.

Isto, porque, na versão que "Bibi" procurou vender aos amigos americanos, graças à "competência extraordinária" dos militares israelitas, "os mortos entre palestinianos civis são praticamente nenhuns".

Um mentiroso sem freio, acusa o Hamas

Na reacção a este discurso, os dirigentes do Hamas consideraram já que se tratou de um discurso repleto de enganos, sublinhando em comunicado que o que Netanyhau disse no Congresso mostra que, afinal, os seus esforços para negociar a libertação dos israelitas cativos em Gaza são "puras mentiras para enganar os cidadãos israelitas, os americanos e a opinião pública global".

O Hamas considera que Benjamin Netanyhau só pensa em lavar a sua imagem quando já todos perceberam que conduz uma guerra que visa "o extermínio dos palestinianos em Gaza", violando todas as leis internacionais de protecção de civis no decurso de conflitos armados.

"O Congresso dos EUA esteve a ouvir um criminoso de guerra, que ali levou a propaganda e as mentiras que anda a repetir já há nove meses", diz ainda o Hamas, acrescentando que é claro que é ele que anda há meses a detonar todos os esforços para acabar com este conflito.

O mesmo, alias, pensam as largas centenas de manifestantes que se apresentaram nas imediações do Congresso para protestar contra a sua presença, tendo mesmo um elemento da Câmara dos Representantes empunhado uma placa com a inscrição "culpado por genocídio" e "criminoso de guerra", como o demonstra o mandado de captura apresentados pelo procurador internacional do Tribunal Penal Internacional (TPI) contra ele e contra o seu ministro da Defesa, YOav Gallant, além de três dirigentes do Hamas.

Um grupo alargado de congressistas, na sua maioria democratas, optou mesmo por deixar as suas cadeiras vazias durante o discurso de "Bibi" em protesto e discordância por este ter sido de novo convidado a vir inundar os EUA com a propaganda israelita sobre a guerra em Gaza.

Aos manifestantes, dentro e fora do Capitólio, Benjamin Netanyhau respondeu acusando-os de serem, sem excepção, instrumentos na mão do Irão, a quem este país paga para lhe criar problemas nos EUA e na Europa Ocidental.

Considerou que se trata de pessoas com raízes anti-semitas e inimigos de Israel e da sua luta pela liberdade, pela democracia e pelos valores comuns com os norte-americanos e restantes aliados ocidentais.

E ripostou ainda pedindo aos norte-americanos, de ambos os partidos, republicanos e democratas, que não se deixem enganar pelos amigos do Irão, porque "nos maus e nos bons momentos, Israel será sempre o mais leal e útil amigo dos Estados Unidos".

Elogiou fortemente o ainda Presidente Joe Biden por "todo o apoio" que deu a Israel nestes nove meses de guerra com o Hamas em Gaza, destacou o papel do ex-Presidente Donald Trump no seu inequívoco apoio a Telavive... mas nem uma palavra para Kamala Harris, que substitui Biden na corrida à Casa Branca nas eleições de 05 de Novembro próximo.

E no seu discurso, longo e elaborado para apelar à sensibilidade epidérmica que os norte-americanos demonstram perante a ideia de que são eles os líderes do mundo livre, Netanyahu considerou os EUA "o país mais poderoso do mundo", recebendo nova ovação em pé, sugerindo ainda que em quase todo o planeta onde existe democracia, isso deve-se aos bons ofícios de Washington.

"É um confronto global entre os que glorificam a morte (o Irão e os seus grupos) e os que santificam a vida (Israel, os EUA e os seus aliados). E para que as forças da civilização triunfem, América e Israel têm de se manter juntos, porque quando ficamos juntos, nós ganhamos e eles perdem", disse "Bibi" ao Congresso.

E, indo ao que ali o levou em última instância, Netanyhau disse aos congressistas que "quanto mais armas americanas e mais rapidamente estas chegarem a Israel, mais depressa acabará a guerra em Gaza e mais facilmente impedirá uma guerra mais vasta no Médio Oriente".

Parafraseando Winston Churchill, "bibi" disse: "Dêem-nos as ferramentas mais depressa para que possamos acabar a tarefa mais depressa".

Foi face a esta ideia que o Hamas considerou ser a demonstração cabal de que as propostas de cessar-fogo feitas por Israel em conjunto com os EUA, no âmbito dos vários périplos que o chefe da diplomacia norte-americana, Antony Blinken, fez à região, são "afinal, pura mentira" e uma "farsa".