Foi no dia 15 que as fileiras leais ao chefe do Conselho Soberano do Sudão, general Abdel al-Burhan e as RSF afectas ao general Mohamed Hamdane Daglo iniciaram confrontos de grande envergadura, com recurso a artilharia pesada e a aviões de guerra (ver links em baixo nesta página).

Por detrás desta quase guerra-civil estão desentendimentos sobre o processo de integração dos paramilitares nas Forças Armadas do Sudão - há quem diga que a real causa é a luta pelo acesso às minas de ouro do Darfur - entre os dois homens que lideraram o golpe de Estado que acabou com o reinado de quase 30 anos de Omar al-Bashir, em 2019, e, depois, em 2021 voltaram a alterar as regras, para interromper o processo de transição democrática que estava prometida.

Burhan era o chefe do Conselho e Dagalo o seu número dois, conhecem-se bem e há muitos anos, e, quando tudo apontava para que esta fosse uma luta sem quartel, depois de mais de 500 mortos e mais de 4 mil feridos, além de milhares de refugiados e com a comunidade civil e diplomática internacional a fugir do país, incluindo angolanos, eis que os Estados Unidos entram em cena e convencem os dois lados a abrir umas tréguas humanitárias de 72 horas.

Depois deste sucesso, que chegou após várias tentativas falhadas de cessar-fogo temporário, Washington conseguiu ir ainda mais longe e convenceu os dois generais a iniciar conversações de forma a chegar a um entendimento que permita acabar com aquilo que tem potencial mais que suficiente para se transformar numa das mais trágicas guerras civis do continente em muitos anos.

E é neste contexto que o Exército de al-Burhan e as RSF de Dagalo aceitaram prolongar por ais 72 horas a as tréguas, numa altura em que os analistas internacionais mostram dificuldades em explicar claramente a génese deste conflito.

As hipóteses mais em destaque são a disputa pelo acesso aos recursos naturais do país, especialmente às minas de ouro do Darfur descobertas há apenas 12 anos, aos diamantes e ao petróleo, ou ainda o acordo de criação de uma base naval russa em Porto Sudão, uma cidade portuária nas margens do Mar Vermelho, que está por arrancar há vários anos.

No que diz respeito à base russa, uma das teses em voga é que as reticências mostradas por al-Burhan, com ligações de forte proximidade - viveu nos EUA muitos anos - aos norte-americanos estaria a entravar o cumprimento do acordo com Moscovo e, com apoio do Grupo Wagner, através da Líbia, Dagalo e as suas Forças de Reacção Rápida, estariam a procurar reverter este processo tomando o poder pela força.

Nenhuma destas teses foi demonstrada de forma cabal, mas o facto é que se os russos conseguirem concretizar o acordo de criação da base naval em Porto Sudão, ficam com uma posição estratégica de grande relevo no Mar Vermelho, cuja geografia é por demais conhecida, com a Arábia Saudita na outra costa e directamente sobre o acesso marítimo ao Canal do Suez, uma das mais importantes e estratégicas rotas do comércio marítimo mundial.

O exército do Sudão concordou em estender por mais 72 horas a trégua acordada com as Forças de Apoio Rápido (RSF, na sigla em inglês) e em reunir-se com um representante do grupo paramilitar.