O Prof. Boaventura de Sousa Santos referia-se aos direitos humanos como o paradigma do limite do exercício da política, ou seja, os direitos humanos constituem a noção socialmente aceite sobre os limites as quais é permitido o exercício da politica.

Vários momentos na história da humanidade são referidos como cruciais no triunfo inequívoco das doutrinas do humanismo.

A magna carta de João das Regras do Sec. XIII, a carta dos direitos do homem e do cidadão que remonta ao tempo da revolução francesa, os princípios provenientes das convenções de Genebra sobre a égide da cruz vermelha internacional sobre os direitos dos prisioneiros e dos feridos nos conflitos armados no final do sec XIX e inicio do séc XX . Podemos referir três grandes gerações de direitos humanos: a primeira geração diz respeito aos direitos civis e políticos, a segunda geração diz respeito aos direitos económicos sociais e culturais e por fim a terceira geração diz respeito aos direitos da comunidade.

No entanto, antes de falarmos sobre os direitos humanos conforme os interpretamos na realidade, um longo caminho foi percorrido para que hoje os direitos humanos fossem praticamente incontestados. No entanto, hoje podemos afirmar que os direitos da pessoa humana à sua dignidade, à sua felicidade e à sua realização são inalienáveis e constituem paradigma na relação entre os homens.

Quando percorremos a linha do tempo das vitórias dos direitos sobre a barbárie raramente verificamos o contributo de alguns processos históricos fora da Europa tiveram na construção dos direitos humanos.

Quando em 1215 o Rei João de Inglaterra foi forçado pelos seus lordes a assinar a Magna carta com o princípio de que os homens livres devem ser julgados pelos seus pares e que a soberania não está acima da lei, no Mali, 7 anos depois, em 1222 o imperador Sunjata Keita proclamava a Carta do Mandé. Carta essa que nos foi trazida até aos dias de hoje pela confraria dos caçadores do Mali constituiu-se como um dos primeiros instrumentos de direitos humanos com traços de uma modernidade que ainda hoje são actuais. Composta por 7 artigos, a carta aborda temas como o direito supremo pelo respeito à vida, o direito a não causar dano à pessoa humana, o dever de respeitar o próximo, de respeitar os mais velhos e os progenitores, o dever de educar toda a população, o dever de combater a fome, o dever de proteger os escravos, os direitos das mulheres, a interdição de bater, entre outros aspectos que constituíram sem dúvida um avanço civilizacional sem precedentes no sistema mundo e que ainda hoje se encontram fora das abordagens tradicionais do processo de construção dos direitos humanos. Esta carta, alicerçada com a carta de Kurukan Fuga de 1235, que estabelecia a divisão social do império do Mali, representam um avanço sem paralelo no respeito pelos direitos liberdades e garantias.

Durante muitos séculos Africa foi vista como parente pobre das conquistas do mundo civilizado. Tidos como povos bárbaros, os africanos foram excluídos da sua autodeterminação e da sua participação efectiva do concerto das nações. Mas não é só a questão relativa ao reconhecimento do direito à autodeterminação ou à existência de estados africanos que verificamos a menorização dos Africanos na sua generalidade. A questão que hoje se coloca, ou para ser mais preciso, a questão determinante é a forma como a historiografia trata a contribuição inegável dos povos africanos para a construção do mundo que hoje temos.

Falar sobre esta contribuição inegável constitui uma ruptura total com os preconceitos estabelecidos sobre o papel dos africanos e do seu inesgotável contributo para a marcha triunfal do progresso da humanidade. Quando falamos de África não podemos esquecer as suas sementes que assentam raízes na sua diáspora.

Martin Luther King, o pastor negro americano que no seu famoso discurso de Washington proclamou o seu sonho, a experiência do Indiano Mahatma Ghandi que exerceu advocacia na Africa do Sul e foi vitima do racismo sul Africano, tornando- -se posteriormente porta-voz dos mais pobres e dos intocáveis, e o nosso insubstituível Nelson Mandela, que tive oportunidade de escrever sobre ele no meu ultimo artigo de opinião, tornam Africa e os seus discípulos, dignos herdeiros da tradição do império do Mali e de Sundjata keita, tornando-se exemplos vivos do que constituiu a carta dos direitos africanos e dos povos, assinada em Banjul em 1982, representando estes actores humanos sociais e políticos mais do que uma carta proclamatória, um exemplo na terra da batalha dos justos sobre os injustos, do bem contra o mal e da afirmação de um mundo melhor com igualdade de oportunidades para todos. Para terminar não poderia deixar de citar um provérbio africano que já em anteriores artigos tive oportunidade de citar o homem só é o maior caçador da história porque o leão não tem historiadores. Se fizermos uma na análise sobre a prática dos direitos humanos com base no método do exemplo verificamos que temos uma melhor humanidade pela contribuição que estes três homens tiveram para o mundo melhor que temos hoje.

Hoje chegou o tempo de honrarmos e nos orgulharmos desta contribuição, chegou a hora dos Africanos viajarem sobre as suas raízes e introduzirem uma nova tópica na construção da historiografia universal. Chegou também a hora de África sair da periferia da construção dos paradigmas de produção do conhecimento, estou certo que esta alteração de paradigmas nos tornará um continente com mais auto-estima e com mais reconhecimento.