Isso concorreu para a revisão constitucional de 2010, em que, para os cargos de Presidente e vice-Presidente da República, passassem a ser considerados eleitos os dois primeiros candidatos da lista mais votada apresentada a eleições legislativas.

As eleições de Agosto próximo são as terceiras que ocorrem após esta revisão constitucional.
Na generalidade dos países africanos, a média etária dos cidadãos é muito baixa, e Angola não constitui excepção.

Dos cerca de 30 milhões de habitantes, mais do quadruplo dos que se apuraram à data da independência foram inscritos nos cadernos eleitorais um pouco menos de metade, à volta de 14 milhões.

Isso faz, desde logo, evidenciar, independentemente de outras razões, que uma parte muito significativa da população não tem idade para votar.

Sucede que, dos recenseados, metade tem menos de 35 anos e a faixa etária prevalecente, nesta metade, é mesmo inferior a 25 anos.

Quer isto dizer que a maioria nasceu após a independência e uma parte muito significativa não viveu a guerra civil, que durou 27 anos (de 1975 a 2002).

As consequências da demografia nos registos eleitorais não devem deixar de ser ponderadas com a enorme mobilidade dos cidadãos a que a guerra deu lugar, fazendo concentrar, fortemente, a população nas cidades, resultado da fuga de zonas rurais para as zonas urbanas.

É também, por isso, necessário notar que dos registos eleitorais para o próximo acto eleitoral, só a província de Luanda representa cerca de 30% dos inscritos.

Esta realidade deve ainda ter presente que o facto de Angola ter as duas maiores etnias no interior do País, os Ovimbundu e os Ambundu, reforça uma singular identidade e unidade, tanto mais que a guerra teve, ainda, o português como instrumento de relação e que é, hoje, língua materna.

Independentemente também do juízo que se faça ou venha a fazer das políticas prosseguidas pelo ex-Presidente da República, José Eduardo dos Santos, nomeadamente nos domínios económico-financeiro e de transparência, é inequívoco que foi sua preocupação política, enquanto líder do partido maioritário, o MPLA, assegurar a reintegração dos membros dirigentes do partido beligerante vencido, a UNITA, numa lógica real de reconciliação nacional.
Esta questão não é uma questão menor e é um grande crédito a seu favor.

O quadro descrito, ou seja, a demografia, a mobilidade dos cidadãos por efeito da guerra, reforçando a unidade e a identidade da Nação e a política de reconciliação prosseguida permitem compreenderem-se melhor os resultados das últimas eleições, realizadas em 2017, bem como a sua singularidade.
É que, ao aprofundarmos a análise do que ocorreu em 2017, facilmente se compreendem as razões pelas quais no Bié, no Huambo, em Luanda e na Lunda Sul, a UNITA teve uma percentagem de votos sempre superior a 35%, muito para além da percentagem global que alcançou no sufrágio e que foi de 27%.

Isso significa que, nos grandes aglomerados populacionais, mercê da juventude dos eleitores e da forte mobilidade que houve das zonas rurais para as urbanas, o voto dos mais jovens, muito expressivo, não é influenciado pela guerra, porque eles, pura e simplesmente, não a viveram.
O voto é mobilizado por outras razões, o que é lógico e joga a favor do futuro de Angola.

A pandemia e a invasão da Ucrânia, ao espoletarem o agravamento das desigualdades em todos os países do mundo, para além dos azimutes em que se situam, fazem ressaltar as razões do voto dos mais jovens em Angola, já não influenciados pela consequência da guerra fratricida que o País viveu até 2002.
Estas razões são, seguramente, reconhecidas por todos os partidos concorrentes e devem-no ser, em particular, pelo MPLA e pela UNITA, que têm a responsabilidade de tudo fazerem para não colocarem o passado, ou seja, a guerra civil, no centro dos debates, durante a campanha eleitoral.
O voto da maioria da população é, hoje, centrado na recriação da esperança de um futuro em paz, assente no aprofundamento da reconciliação nacional e que atende a respostas como a sobrevivência digna e não já nas consequências da guerra.
*(Secretário-geral da UCCLA)