Falhando a família nuclear e a escola primária, na adolescência, entrariam em acção outros familiares, amigos e colegas com os quais inevitavelmente aprenderia a distinguir o bem do mal (moral) e como se comportar (ética) na sociedade em que nasceu, cresceu e se fez homem.
Se tudo isso, atrás exposto, tiver falhado, quando entrou para a vida política, já adulto, objectivamente, terá aprendido que ao político, mais do que ao comum dos cidadãos, não é permitido fazer tudo o que lhe dá na real gana e que os actos políticos devem ser bem pensados, porque têm consequências para milhares ou milhões de pessoas.
No entanto, parece pouco provável que, ao receber a chave do poder das mãos de José Eduardo dos Santos, seu antecessor, o Sr. Presidente tenha estado disposto a ouvir avisos dizendo que ser chefe de Estado implica trabalhar para a imagem actual e futura do País, em vez de dar prioridade aos caprichos e vaidades pessoais.
No ambiente de crispação política entre sucessor e antecessor, no período de transição 2017-2018, dos Santos dificilmente terá tido condições para ajudar o Sr. Presidente a compreender que, segundo provérbio Yorubá, "aquele que admite suas faltas não as paga por muito tempo".
E também para o advertir que ser Presidente de um país africano da dimensão e com a História de Angola, é muito mais que beneficiar dos despesistas luxos presidenciais. É sobretudo africanizar-se ou reafricanizar-se, porque não há Angola de prosperidade fora de África.
Reafricanizar-se é o oposto de assumir a liderança da União Africana com uma agenda que, indo ao encontro dos desejos de Emmanuel Macron, defende a ostracização de líderes africanos que, através de golpes de Estado, derrubaram as amarras do neocolonialismo francês.
É também não equiparar ao terrorismo esses processos a que chama de "mudanças inconstitucionais", porque a "democracia requer muito mais que o voto universal e não floresce na miséria", citando Julius Nyerere, num notável artigo, publicado em Fevereiro de 1993 na Revista Cadernos do Terceiro Mundo.
Reafricanização, Sr. Presidente, é ainda evitar actos que envergonham o País, como impedir a entrada em território angolano de políticos africanos com ideias diferentes das suas, convidados pela UNITA para uma conferência em Benguela, como aconteceu no já tristemente célebre 13 de Março último, data que a socióloga Cesaltina Abreu apelidou de "Dia da Vergonha Internacional de Angola".
Diferente do que aconteceu nesse escândalo, reafricanizar é não proibir, sem justificação cabal, a entrada em território nacional de opositores políticos de Moçambique e do Quénia, designadamente Venâncio Mondlane e Edwin Sifuna.
É igualmente não destratar e evitar actos de torturas, tais como, fechar numa sala do Aeroporto Internacional 4 de Fevereiro, durante oito (longas) horas, sem beber nem comer nada, políticos africanos de vários países, entre os quais o Presidente Ian Khama (72 anos) do Botswana.
Esta atitude desumana, o maior e mais vergonhoso escândalo diplomático dos 50 anos de Independência do País, leva-nos de volta às torturas infligidas pela da PIDE-DGS, polícia política do colonialismo português, aos presos políticos em Angola e não só.
Nga ku diondo, por favor, senhor Presidente, peça desculpas aos milhões de cidadãos nacionais que, como africanos, subscrevem os princípios da UA e da SADC de defesa da unidade e integração de África, livre circulação de pessoas e bens no continente, respeito pela dignidade da pessoa humana e solidariedade africana, traço essencial das culturas do continente.
Desculpas dirigidas em particular aos povos dos países dos políticos destratados no aeroporto de Luanda, nomeadamente, Colômbia, Quénia, Tanzânia, Moçambique, Botswana, Uganda, África do Sul, RDC, Lesotho, Sudão e Eswatini, e de África em geral, que defendem a diversidade e a pluralidade cultural e de ideias, como riqueza e não motivo de exclusão e ostracização.
Retrate-se, Sr. Presidente, pela impossibilidade de conciliar a sua decisão de poupar os europeus da reparação pela escravatura e colonialismo, e a da União Africana que escolheu para lema de 2025 "justiça para os africanos e os afrodescendentes por meio de indemnizações".
Peça desculpas por, em contra-mão, pedir ajuda a outros países do continente para as suas acções de perseguição a cidadãos angolanos diaspóricos, no momento em que a UA eleva a Diáspora Africana à categoria de sexta região continental.
Nga ku diondo, como presidente da UA e medianeiro do conflito da RDC, desculpe-se por, nos últimos dois meses, ter faltado a seis cimeiras regionais de busca da paz para o Congo, incluindo as on line, e pelas reiteradas tentativas de boicotar a decisão da SADC-EAC de fundir os processos de mediação de Luanda e Nairobi.
Lembre-se, senhor Presidente, que pela sua localização geográfica, História e Cultura, Angola é medianeira natural do conflito do Congo Democrático, papel que não devia ser confundido com palco para a exibição da arrogância e propaganda presidenciais.
Recordando que, ainda segundo Nyerere, "a união não nos tornará ricos, mas pode fazer com que seja difícil para África e os seus povos serem desconsiderados e humilhados", desculpe-se dos seus comportamentos pró-ocidentais contra a unidade africana, que levam à sua qualquerização, e consequentemente, de Angola.
Se lesse os sinais e fosse mais humilde, talvez evitasse o seu despedimento tácito das funções de medianeiro do conflito da RDC, por justa causa e sem aviso prévio, feito pelos presidentes Paul Kagame, do Rwanda, e (até!) Felix Tshisekedi, do Congo, que trocaram Luanda e o "Campeão africano da Paz" por Doha e o Emir do Qatar.
Nga ku diondo, Sr. Presidente, peça desculpas aos países da África Austral que, como disse na sede da UA, "depositaram confiança em Angola para presidir neste ano de 2025 a União Africana", porque os seus actos desonram essa confiança e a generosidade dos seus colegas da região que acederam às suas pretensões de assumir esse lugar.
Peça também desculpas pela vergonha que os propagandistas dos media de capitais públicos nos fazem passar, quando fingem desconhecer que a liderança da UA não se deve a qualquer competência ou qualidade especial sua, mas sim a rotatividade da presidência, que este ano cabia à África Austral.
Reconheça o seu erro ao ter desiludido milhões de africanos quando, em Fevereiro, na UA, excluiu a dignidade e a integração dos povos africanos como os caminhos para a construção de uma África (Angola também) próspera, com educação, sem fome, nem miséria e onde os seus filhos se orgulhem de viver.
Como o Sr. Presidente não tem preguiça de viajar, nga ku diondo, vá até à Fundação Amílcar Cabral, em Cabo Verde, e converse com o comandante Pedro Pires, combatente da Liberdade, sobre a relação solidária dos seus antecessores (dos Santos e Agostinho Neto) com outros africanos, bem como com todos os povos oprimidos do Mundo.
Vá também ao Botswana, País sede da SADC, e visite em Lobatse, na companhia do Presidente Mokgweetsi Masisi, o Museu Samora Machel, para melhor compreender a importância e o papel decisivo da solidariedade africana para as causas continentais.
Aí perceberá os laços construídos entre os estados da região e a dimensão dos sacrifícios consentidos por Botswana, Angola, Tanzânia ou Moçambique, por causa do apoio à luta de outros povos-irmãos. Países estes que foram vítimas de bombardeamentos, sanções e chantagens políticas e económicas do regime de Apartheid da África do Sul e seus aliados ocidentais que se opunham à nossa emancipação.
Depois dessas vistas, estou certa de que compreenderá melhor a importância da solidariedade africana da Tanzânia, Botswana, Guiné Conackry, Argélia, Tunísia, Marrocos, Congos, Ghana, Nigéria e outros para a libertação de Angola.
Nga ku diondo, senhor Presidente, reconheça os seus erros e falhas, para que dentro de poucos anos, quando deixar a presidência e a política e for apenas uma nota de rodapé na História de Angola, esse pedido de desculpas passe a ser o seu cartão de visitas.