Este alargamento trouxe quantidade, mas não qualidade, coesão e unidade. Este alargamento não agregou valor em termos de melhoria do debate interno. Na altura, critiquei, e ainda critico, este alargamento do CC, bem como tenho dito que a estratégia de João Lourenço não deve ser a de "quantificar", mas, sim, de "qualificar" as estruturas e os militantes. De que adianta ter muitos a fazer pouco, quando até há poucos que fazem muito e bem? Temos membros do CC que estão nem aí para o Partido, seus programas e acções. E o MPLA sabe disso.

Membros do CC que têm uma presença irregular e inconstante. Não pagam quotas, não estão nos Comités de Acção do Partido (CAP"s), não se propõem defender o líder e a bandeira. Para muitos deles, o líder está é a dar "bandeira". Fontes do NJ indicam que estão já sinalizados pelo MPLA pelo menos 80 membros do CC (de um total de 693) que andam espalhados por Portugal, Espanha, França, Alemanha, Países Baixos, Reino Unido, Luxemburgo e África do Sul. Uns não estão alinhados com a estratégia do Partido, chegaram ao CC por via da "cunha", do compadrio, por pura conveniência, nepotismo e privilégios de nascimento. Outros simplesmente andam desapontados com aquilo a que chamam falta de visão e de estratégia das lideranças do Partido, não concordam com o estado da actual governação e com a situação política, económica e social que se vive no País. Preferem afastar-se e acompanhar tudo à distância. Adoptaram a seguinte estratégia: nem tão perto, para não parecer muito próximo, e nem tão longe, para não parecer tão distante. São membros do CC que só estão em Angola quando há congressos do MPLA ou então em períodos de eleições gerais. O MPLA vai identificá-los e serão convocados para tratar destes e outros assuntos em sede própria.

João Lourenço é, muitas vezes, o militar que se sobrepõe ao político. Os militares são caracterizados pela disciplina e a hierarquia. Ele procura ser disciplinado, rigoroso e focado nos objectivos. É aquilo que se pode chamar teimoso, no verdadeiro sentido da palavra, não cede a pressões, gosta de impor a sua vontade e de parecer imprevisível. Uma postura, uma estratégia que, nalguns casos, lhe dá bons resultados. Não posso deixar de reconhecer o seu esforço e empenho na procura de uma solução pacífica no conflito RDC-Rwanda e o cessar-fogo recentemente alcançado. Os passos para a criação do Parlamento da SADC durante a presidência rotativa de Angola, os posicionamentos do País no tocante aos conflitos Rússia-Ucrânia e de Israel-Palestina; o investimento estrangeiro e estratégico no Corredor do Lobito, entre outras matérias.

Dizia eu que gosta de parecer imprevisível. João Lourenço, muitas vezes, avança quando devia recuar e, outras vezes, recua quando devia avançar, sendo que também há outros momentos em que faz os movimentos nos tempos certos. Também é, aqui, muitas vezes, o militar que se sobrepõe ao político, e também o militante que "abafa" o estadista. E, muitas vezes, é o estadista que faz resistência para vestir a camisola e assumir, de facto, as relevantes e importantes responsabilidades partidárias que tem. João Lourenço tem sido criticado por não estar mais tempo com os militantes e de não estar a acompanhar de perto os problemas do Partido, numa altura em que vão surgindo várias correntes e tendências no seio do MPLA. Precisa de estar mais próximo e atento.

A capacidade de o MPLA permanecer como um grande partido de Governo estará sempre na qualidade, na actualidade, na inteligência do seu discurso, na elevação e substância do debate que propõe à sociedade, na definição de uma agenda real, de uma estratégia de futuro e visão para identificar, discutir e solucionar os principais problemas dos cidadãos. O MPLA tem de procurar alargar os espaços de debate sobre a democracia e liberdade de expressão, os espaços de afirmação da democracia interna. O cartão do Partido não pode ser só um elemento de afirmação política, económica e social. O tempo tem mostrado que a estratégia de alargar para melhor governar não tem funcionado ao nível do CC do MPLA. No final, o MPLA acabou tendo uma estrutura bastante pesada, burocrática, pouco coesa e que quase não funciona. Se calhar, funciona na China e na Coreia do Norte, mas não em Angola.