Mañanera é um termo que, em Espanhol, designa uma pessoa que madruga, que se levanta muito cedo. Mañanera é como são conhecidas as conferências de imprensa que o Presidente mexicano, André Manuel López Obrador, dá de segunda a sexta-feira. AMLO, como é chamado, marca a agenda mediática do dia, sozinho em palco ou convidando ministros ou outros responsáveis para apresentarem qualquer plano de governo, mas aproveita também para responder a críticas e falar com os eleitores. Só nos primeiros 250 dias de governação, AMLO terá dado 148 conferências de imprensa matinais, terá respondido a cerca de 2.500 perguntas e esteve mais de 170 ocasiões diante de jornalistas, segundo o jornal Excelsior.

A imprensa local diz que, apesar de as conferências serem às 07h30m, os jornalistas começam a fazer fila no exterior do Palácio Nacional a partir das 05h30m, para garantir um lugar na primeira fila da sala, onde têm mais probabilidade de poder fazer uma pergunta ao Presidente. Angola não é o México e João Lourenço não é López Obrador. Quatro conferências de imprensa em cinco anos de governação, obviamente, é pouco para as expectativas dos jornalistas e dos cidadãos, mas é significativo e relevante para um País onde não havia, durante décadas, a cultura de o Presidente da República falar aos jornalistas. Os últimos cinco anos de governação deram a João Lourenço um grande estatuto e dimensão política, uma aprimorada capacidade de análise e de abordagem, melhorou bastante a sua postura (ainda lhe faltam alguns ajustes), já tem uma relação muito mais coordenada com os profissionais de imagem. Neste último encontro com os jornalistas, estando na sala, pude apreciar ao pormenor que João Lourenço faz trabalho de casa, estuda e domina os dossiês, fala de números, de projectos, com precisão.

A experiência militar transferiu método, rigor e disciplina ao político. Percebe-se nas suas explicações e argumentações que existe uma visão de futuro e uma ideia de Nação que muitas vezes esbarram ou encontram dificuldades na sua materialização. É também um processo com uma certa sensibilidade, responsabilidade e também de uma certa afirmação para os jornalistas. Estão a ser avaliados e escrutinados pelos cidadãos por aquilo que perguntam e como perguntam. É também importante clarificar que este não é um exercício com que o PR vai ridicularizar ou intimidar jornalistas e nem onde estes o vão procurar colocar entre a espada e a parede ou o deixar desconfortável. Isto não é uma disputa, não é uma competição mas sim um exercício aberto, democrático e relevante. É a comunicação social que dá a conhecer aos cidadãos grande parte do trabalho e da agenda que implementa e é através deles que o PR "presta contas" aos cidadãos sobre o trabalho desenvolvido. Este é um modelo de work in progress que infelizmente na maior parte das vezes não permite réplicas e que não dá espaço para um contacto mais informal e solto entre o entrevistado e os entrevistadores que ele próprio convida.


Depois de uma directa de fecho do Novo Jornal, estar naquela conferência foi uma verdadeira mañanera na Cidade Alta que eu e o Faustino Diogo (Expansão) fizemos naquele dia para lá estarmos a hora indicada pelos respectivos serviços de apoio do Palácio Presidencial, que foi às 7h00 da manhã, e uma vez que o evento começou pontualmente às 9h00. E a pergunta do Novo Jornal é ligada ao nosso sector, é bastante actual, relevante e pertinente. No início do seu mandato, notou-se um PR que pugnava por uma maior abertura dos órgãos de comunicação públicos na transmissão do chamado "País Real" nos seus serviços noticiosos, mas acabamos por perceber que foi sol de pouca dura.

O Estado recuperou órgãos de comunicação privados e tem hoje o monopólio da comunicação social. O Executivo de João Lourenço faz muitas vezes ouvidos de mercador às críticas de instrumentalização e manipulação da imprensa pública, de uso contínuo da mídia estatal para fins e interesses meramente políticos. São situações que ferem a pluralidade, a liberdade e a isenção que se pretendem que sejam uma marca na comunicação social. Este é um desafio que João Lourenço terá de priorizar caso seja eleito para um novo mandato. Vamos escrutinar e, obviamente, vamos voltar a interpelá-lo numa próxima e possível mañanera na Cidade Alta.