Com a vossa vénia, vou trocar a ordem das questões que o Novo Jornal nos põe. Primeiro reflectirei sobre as mensagens dos eleitores e só depois as lições e ilações. E quais são as mensagens que no meu entender os cidadãos eleitores quiseram transmitir à classe política, mormente ao MPLA, enquanto partido governante?
PRIMEIRO, que é o povo quem manda nos políticos não o contrário. SEGUNDO, que querem uma governação virada para a satisfação das necessidades imediatas das pessoas, famílias e comunidades. TERCEIRO, que querem que essa governação comunique e garanta a sua participação enquanto cidadãos. E QUARTO, querem uma classe política mais dialogante entre si, capaz de se unir nas grandes questões nacionais. Mais percebida como comprometida em volta dos elementos estruturantes da Nação: o combate à pobreza, a prosperidade das famílias, a salvaguarda e o uso racional do que é de todos, as liberdades, as garantias e os direitos das pessoas, a promoção e manutenção da paz e estabilidade, o prestígio internacional do País, entre outros.
Afirmaram esse poder sobre os políticos na forma como usaram o voto consciente e, principalmente, como mais de metade decidiu não votar. Com isso, manifestaram o seu desagrado com a governação do MPLA, mas também deixaram claro que não ficaram convencidos com as propostas da FPU/UNITA. As quatro mensagens elencadas resumem-se mais ou menos em uma: "têm mais uma oportunidade; ou vocês fazem o que e como desejamos, ou em 2027 saem". O povo é que saiu a ganhar nestas eleições. "Dividiu o Poder" pelos dois grandes partidos políticos, o MPLA e a UNITA, ao ponto que a cada um "soube a pouco". O que fará com que negociemos mais, debatamos mais, façamos mais concertação política, nos unamos mais em volta dos grandes temas da Nação.
Lições e ilações? Estar muito atento aos sinais dos tempos é forma de ser e estar do MPLA, está no seu gene. Foi assim em 1959 quando iniciou a gesta libertadora do jugo colonial, em 1961 quando decidiu pela Luta Armada e em 1975 quando fez a aliança estratégica com Cuba, que garantiu a manutenção da Independência e a integridade territorial. Também assim foi em 1988 quando abriu o País à economia de mercado e ao multipartidarismo; em 2002 quando liderou os angolanos na conquista da Paz, usando a magnanimidade em vez de banhos de sangue e em 2004 quando, contra a corrente das potências ocidentais recorreu à China para realizar a reconstrução do País rebentado por 27 anos de guerra e destruição. Em todas estas "metamorfoses", foi o próprio MPLA que encetou as mudanças, fruto dos seus processos de reflexão interna. É fiel a esta longa tradição que o partido, tão logo tomou conhecimento dos resultados eleitorais, remeteu-se em modo de reflexão.
O primeiro sinal veio de Rui Falcão, secretário para a Informação do BP. Na primeira intervenção a propósito, e comentando os resultados menos conseguidos em Luanda, o político disse que o MPLA iria analisar cuidadosamente estes resultados, estudá-los e agir em conformidade. O próprio presidente do Partido, no discurso de vitória, dias depois diria taxativamente que estava atento e iria acatar as mensagens que os eleitores, principalmente os jovens, tinham transmitido nas eleições que acabava de vencer.
É consensual no seio dos militantes do MPLA que os seus dirigentes e quadros deverão ser percebidamente menos arrogantes e mais próximos dos cidadãos e dos seus problemas. Mais dialogantes que permitam que os cidadãos participem mais nas estratégias da solução dos seus problemas. A fazer fé nos debates que vão rolando a todos os níveis, aqueles que demonstrem incapacidade de interagir com as bases serão denunciados "ab initio" pelos próprios militantes.
Outro elemento associado tem a ver com o impacto da governação na vida dos cidadãos. Cada governante terá de ser capaz de resolver os problemas da água, luz, escolas e hospitais condignos e funcionais. Tem de ser capaz de garantir que as famílias tenham comida na mesa e tecto para viver; tenham trabalho que os permita viver com dignidade. Numa palavra tem de fazer que as comunidades ao seu cuidado sejam felizes. As pessoas, principalmente os jovens, só estão interessadas nos factores macro-económicos, na medida que lhes resolvam esses problemas. É isso que o MPLA se apresta a "cobrar" dos dirigentes e quadros que venham a "executar" o programa de Governo que fez sufragar nas urnas.
O MPLA também está consciente de que, para além deste escrutínio cidadão, a Oposição tem muito mais capacidade de "fazer oposição". Pressionar ou, querendo, dificultar a governação. Para lidar com isso, o partido recorrerá ao pragmatismo e capacidade de negociação que tanto lhe valeram no passado. Com humildade, patriotismo e sentido de estado, o MPLA prepara-se para estender a mão ao grupo parlamentar oposto na busca dos consensos e - porque não? - aliança nos grandes assuntos da Nação. As autarquias locais, por exemplo: no programa do MPLA foram prometidas para daqui a dois anos. Na UNITA daqui a um ano. Sendo um tema comum que até já mereceu consenso interpartidário na elaboração do pacote legislativo no mandato passado, pode e irá certamente merecer um tratamento nesse âmbito.
A última e maior lição que os cidadãos quiseram passar à classe política é que estejam preparados para aceitar o seu veredicto, o qual pode não ser necessariamente aquele que cada partido deseja. Os 56% dos que não foram votar (não interessam agora os motivos) são certamente o sinal de reprovação ao facto que o pós-eleitoral é historicamente carregado de tensão, medo e violência. Eleição sim e eleição também! Depois da tristeza de 1992, foi assim em 2008, 2012, 2017 e agora em 2022: um dos concorrentes, sempre a UNITA, tem dificuldades em aceitar os resultados eleitorais. Mesmo participando plenamente em todo o processo, nunca reconhece formalmente a derrota e felicita o vencedor. Recorre sempre a alegações de fraude; ameaça, chantageia... e depois sorrateiramente ocupa os lugares na Assembleia Nacional. Isso tem que acabar! E, mais uma vez, os eleitores deram uma solução ao "problema".
Com os 43% de lugares na Assembleia Nacional (AN), a UNITA passa a indicar o 1.º vice-presidente da AN, os presidentes de quase metade das comissões parlamentares, dos juízes do Tribunal Supremo, do Constitucional, dos comissários da CNE e da ERCA. O presidente do Tribunal de Contas, o provedor de Justiça e o seu adjunto só poderão ser empossados com a sua anuência, pois se necessita de uma maioria de dois terços. Com isso, a UNITA pode, efectivamente, influenciar todo o processo das eleições gerais, desde a preparação ao contencioso. Portanto, não poderá dizer mais como faz agora que o MPLA domina estas instituições, por isso tem sido sistematicamente injustiçada. Esperamos, por isso, que a UNITA, como o MPLA, está a fazer, se submeta de uma vez por todas ao veredicto do Soberano Povo, ocupe os seus lugares na Assembleia Nacional e faça a oposição séria e responsável que a Nação a incumbiu e os cidadãos dela esperam.