Ora, sensível a essa realidade e no intuito de reverter tal quadro, conferir maior dignidade e protecção e retirar da informalidade este género de trabalho, o legislador de 2016 introduziu, no ordenamento jurídico angolano, o Regime Jurídico do Trabalho Doméstico e de Protecção Social, através do Decreto Presidencial n.º 155/16, de 09 de Agosto. Segundo o art.º 2.º desse diploma, o trabalho doméstico é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar por outrem, com carácter regular, sob direcção e autoridade desta, actividades destinadas à satisfação das necessidades próprias ou específicas de um agregado familiar ou equiparado e dos respectivos membros, designadamente: (i) preparação e confecção de refeições, (ii) lavagem e tratamento de roupas, (iii) limpeza e arrumação da casa, (iv) vigilância e assistência a pessoas idosas, crianças e doentes ou (v) serviços de jardinagem e de apoio de transporte familiar.
No capítulo dos deveres do empregador, a lei impõe, entre outros, o dever (i) de tratar os trabalhadores com respeito, (ii) de proporcionar-lhes condições de trabalho favoráveis que garantam segurança e saúde no trabalho, (iii) de contribuir para o aumento da capacitação e qualificação profissional dos trabalhadores (formação dos trabalhadores), (iv) de pagar o salário no prazo indicado no contrato de trabalho e (v) de cumprir com as obrigações no âmbito da Protecção Social Obrigatória, isto é, inscrevê-los na Segurança Social, de forma a assegurar o rendimento mínimo do trabalhador na fase da reforma.
Além destes deveres, infere-se ainda, do exposto na alínea h) do art.º 4.º do diploma acima, o dever de os empregadores celebrarem um contrato de seguro de acidentes de trabalho a favor dos trabalhadores. Para muitos, o seguro é desnecessário. E a realidade parece demonstrar isso mesmo. Esse comportamento parece-nos resultar, essencialmente, da incipiente noção que muitos patrões têm relativamente aos riscos financeiros que emergem desta relação contratual e a que os mesmos estão objectivamente expostos.
Infelizmente, foge da razão de muitos, que, se durante a prestação do trabalho o trabalhador sofrer um acidente - no local do trabalho ou durante o percurso de ida e volta do trabalho para casa - o patrão, independentemente de culpa, ficará - por força da lei - obrigado a custear, nomeadamente, as despesas médicas ou fúnebres em caso de morte. Além disso, se o quadro clínico do trabalhador assim exigir, o patrão poderá ainda incorrer em custos com transporte até à alta hospitalar definitiva do mesmo, incluindo o pagamento dos salários correspondentes.
Como sabemos, os custos com tratamento médico e medicamentoso no nosso País ainda é muito oneroso, pelo que estar em situação de risco a descoberto, isto é, sem seguro, pode levar o empregador a ficar numa situação financeira bastante periclitante. Notamos, entretanto, que o valor a pagar por um seguro dessa natureza por trabalhador com um salário até Kz 100.000,00 (cem mil kwanzas) ronda, aproximadamente, Kz 17.000,00 (dezassete mil kwanzas) por ano.
Portanto, para evitar custos avultados e incerto na hipótese de uma das situações atrás referidas ocorrer - e num contexto de crise económica e financeira que assola gravemente o nosso País e também às famílias - parece-nos economicamente racional os patrões transferirem às consequências financeiras decorrentes de um eventual acidente de trabalho para uma entidade com disponibilidade financeira e vocação para o tratamento adequado dessas matérias (seguradora), mediante a celebração de um contrato de seguro. Nesta conformidade, o empregador não só confere maior dignidade e segurança aos seus trabalhadores bem como protege o seu próprio património e liberta-se de ter de poupar valores para satisfazer obrigações futuras dessa natureza. n

*Mestre em Direito e Gestão pela Universidade Católica de Portugal, Escola do Porto. Membro da AIDA -Associação Internacional de Direito dos Seguros.