A humanidade pode estar à beira do colapso devido às alterações climáticas, como o começam a deixar cada vez mais em evidência os fogos descontrolados que duram meses na Rússia ou nos Estados Unidos, na Amazónia ou nas pradarias africanas, as cheias como nunca se viu na Europa ou na Ásia e as secas cada vez mais prolongadas e intensas por todo o lado, mas com especial severidade em África, como é visível no sul de Angola e em toda a geografia austral do continente africano.
O último relatório do clima da ONU deixa pouco espaço para a dúvida de que é a acção humana e a emissão de gases com efeito de estufa, na sua esmagadora maioria resultante da queima de combustíveis fósseis, com o crude à cabeça, mas seguido de perto pelo carvão e pelo gás natural..., que estão a sufocar o Planeta Terra.
Há negacionistas, como foi disso exemplo o anterior Presidente dos EUA, Donald Trump, que apostou na retoma da produção de carvão e da respectiva indústria mineira porque ele e a sua equipa, sem ciência a apoiar tal tese, defendiam que as alterações climáticas são resultado dos ciclos naturais do planeta e não da acção do Homem. O Brasileiro Jair Bolsonaro também alinha por este diapasão, mas são cada vez menos aqueles que apoiam esta visão do problema.
O Secretário-Geral da ONU, o português António Guterres, é um dos que mais defende as evidências da mão do Homem no actual cenário mundial de proximidade à tragédia, tendo mesmo lançado, no seguimento da divulgação do relatório do clima das Nações Unidas, um "alerta vermelho" para ainda se tentar salvar a humanidade tal como a conhecemos.
E é isso que os lideres do mundo que vão estar em Glasgow, de 31 de Outubro a 12 de Novembro, quase todos os mais destacados Chefes de Estado e de Governo, desde logo dos EUA, o Presidente Joe Biden, a maior parte dos lideres europeus, Narendra Modi, da Índia, ou Xi JInping, o Presidente chinês que ainda não decidiu se vai estar mas que se espera que o faça à última da hora, e que integram o lote dos mais poluidores, vão querer fazer tudo para poderem ficar bem na fotografia.
O Presidente angolano, João Lourenço, também deverá estar presente nesta Cimeira Mundial do Clima, onde vai poder sentir o pulsar da comunidade internacional para com o petróleo e os seus principais produtores mundiais, como é o caso de Angola, que é o segundo maior exportador da matéra-prima no continente.
Esperam-se enunciados semelhantes aos que foram feitos na Cimeira de Paris, em 2015, onde a palavra-mestra foi "Acção". Mas acção é o que tarda a chegar, apesar de alguns sinais de que a vontade existe, como o demonstrou recentemente a China que tinha encerrado unidades de produção de energia eléctrica a carvão mas que a recente crise obrigou a reabrir porque, apesar dos biliões gastos ma instalação de unidades de produção de electricidade verde, eólica, hídrica, solar..., o país estava a ver a sua economia abrandar de tal modo que gerou mesmo pânico no resto do mundo.
O dilema
Se, por um lado, não há alternativa e a humanidade vai ter de se adaptar a uma economia sustentada em energias alternativas ao petróleo, sem emissão de gases com efeito de estufa, porque a sucessão de furacões, cheias, secas, incêndios sem controlo... mostram que isto é a sério e é preciso garantir que o planeta não aquece mais que 1,5 graus, em média, este século, com medidas drásticas a implementar até 2030, por outro lado, o mundo ainda não dispõe de tecnologia que permita o uso de energias verdes que substituam à altura o crude.
O velho exemplo de que ainda não há alternativa ao jet fuel para manter no ar um avião de passageiros, sequer dos mais pequenos, deve-se à impossibilidade de ter acesso a um combustível com a densidade energética (capacidade de propulsão) dos derivados do petróleo por não existir ainda, apesar dos avanços na área do hidrogénio ou das baterias de última geração, entre outras razões, capacidade de armazenamento suficiente.
Uma das vozes que tem alertado para esse problema é Dan Steffens, presidente do Energy Prospectus Group (EPG).
Apesar de o mundo procurar entusiasticamente uma alternativa ao petróleo, por questões ambientais, nada o substitui, para já, porque, adianta Dan Steffens, a densidade energética do gasóleo e da gasolina é insuperável e o mundo move-se a combustíveis com base nos hidrocarbonetos
E essa é a razão pela qual a procura mundial cresce todos os anos, como o mostram os gráficos que desenham a evolução da procura do "ouro negro" entre 1999 - 75 milhões de barris por dia - e 2019, onde esta é de 101 milhões de barris por dia em combustíveis líquidos produzidos a partir do petróleo, apesar dos problemas ambientais todos.
Com isto, enfatiza, pode-se concluir que todos os anos - é esse o ritmo que o ciclo de 1999 a 2019 demonstra - a procura vai crescer 1,3 milhões de barris por dia e não há nada que indique que se possa estar perto do pico máximo dessa mesma procura.
Mesmo com a pandemia da Covid-19 de permeio, em 2020, o ano de 2021, onde as questões ambientais estão na linha da frente das prioridades globais e a ONU mais declarações fiez, especialmente através do seu Secretário-Geral, as palavras de Steffens voltam a fazer sentido se se olhar para as perspectivas da recuperação do consumo e produção previstos pela Agência Internacional de Energia (AIE), da OPEP+ ou de outros organismos que divulgam dados sobre o sector.
Pouco, muito pouco...
Desde 1995, ano em que ocorreu, em Berlim, Alemanha, a COP1, que o mundo se sobressalta a cada realização destas cimeiras mundiais do clima, que coincidem com o crescendo dos fenómenos meteorológicos cada vez mais devastadores, e com o dedo apontado em sucessivos estudos assinados por centenas de renomados cientistas ao aquecimento global alimentado pela queima de combustíveis fósseis, queimadas, substituição de florestas por áreas agrícolas intensivas.
Ano após ano, os líderes mundiais procuram soluções, juram e acordam formas de reduzir as emissões de gases poluentes, em aumentar os investimentos nas tecnologias inovadoras que tardam a surgir, mas a verdade é que, como o tem sublinhado António Guterres, e cada vez mais cientistas o apoiam, não está garantido, nem de perto, que o planeta não aqueça além da meta definida de 1,5 graus centígrados até ao final deste século. Mas 2"30 está ao virar da esquina e essa é a data limite para agir de forma definitiva.
Activistas fartos de bla, bla, bla...
Os apelos da sociedade civil "motorizada" pela jovem activista sueca Greta Thunberg, que se destacou nos últimos anos na defesa e na exigência de acção por parte dos lideres mundiais, sucedem-se e são cada vez mais pungentes.
Greta Thunberg, numa intervenção sobre este problema, e sobre as expectativas em torno da COP26, voltou a surpreender e a empolgar os milhões de jovens que hoje estão empenhados em forçar soluções, dizendo que o mundo está cansado de "bla. Bla, bla..." sobre todo o que diz respeito ao clima.
"Economia verde... bla, bla, bla,bla. Emissões zero em 205 bla, bla, bla,bla...", disse Greta Thunberg numa conferência sobre clima para a juventude que antecipou a COP26, na cara dos dirigentes mundiais de quem se espera mais que... bla, bla, bla,bla..., acrescentando que os jovens já não aceitam mais "palavras vazias" atiradas para cima da sua "ambição e esperança"
Novamente a resposta tem sido promessas de acção revigorada, como foi disso exemplo o Presidente dos EUA, Joe Biden, que terraplanou a política trágica do seu antecessor, Donald Trump, com investimento acrescido nas energias verdes, em novas tecnologias e no fecho progressivo das indústrias mais poluentes. Embora tenha sido forçado a um volte-face devido à sucessão de crises energéticas por causa dos elevados preços do crude e do gás natural.
O mesmo sucedeu com a China - o maior poluidor do mundo e, ao mesmo empo, o que mais investe em renováveis - que, além dos muito significativos investimentos na área das energias verdes, entre os mais robustos do mundo, mesmo proporcionalmente, e que estava a seguir um programa de encerramento de unidades a carvão, viu-se obrigada a retomá-las porque vastas regiões industriais do país estavam a fechar, literalmente por falha de energia, sendo o sector automóvel um dos mais afectados.
E é neste compasso de espera que o mundo desespera por soluções à medida que os efeitos das alterações climáticas se fazem sentir cada vez mais próximo da porta das casas de cada um dos habitantes do planeta.
Mesmo o Acordo de Paris, que em 2015 foi visto como um passo decisivo é hoje mais um "bla, bla, bla,bla...", apesar de ter sido assinado por quase todos os países do mundo, na COP21, que teve lugar na capital francesa.
Este acordo, apesar de tudo, ainda em vigor, consubstancia o empenho do mundo em evitar uma tragédia global ao propor que a temperatura média do planeta não ultrapasse os 2 graus centígrados, acima da temperatura da era pré-indústrial, criando formas de o mundo corrigir a trajectória para um consumo menor de combustíveis fósseis até "zero" em 2050, redefinir o mapa económico-financeiro sem os hidrocarbonetos e desenvolvimento sustentável. O que, para já, parece ter sido mais do mesmo "bla, bla, bla,bla...".
Acção rápida e como nunca se viu
Ou seja: o que se espera do mundo, como reafirmou Painel Intergovernamental sobre as Alterações Climáticas de 2021, elaborado pela ONU, é que sejam tomadas medidas "como nunca se viram" sendo essa a única forma de garantir que a temperatura do planeta não vai além do 1,5 graus neste espaço temporal.
É preciso ter em conta que a diferença de 1 grau, ou até meio grau, em termos planetários, significa mais que o que pode, para um leigo, parecer, sendo hoje de ciência confirmada que isso levaria à impossibilidade da vida humana ser sustentável em vastas regiões do planeta, o mar subiria a ponto de "afogar" cidades com milhões de habitantes em todo o mundo, secas trágicas mais recorrentes, cheias, furacões...
Tudo isto quer dizer uma coisa: o modo de vida existente hoje nas sociedades mais desenvolvidas, tal como se conhece, não pode continuar. Ou se encontram novas fontes de energia ou são as sociedades que terão de aceitar reduzir dramaticamente o conforto em que vivem, a abundância de que dispõem e os superavits que ostentam.
Milhares de espécies da fauna e da flora estão a desaparecer a um ritmo nunca visto, os deslocados, nas populações humanas, são já na ordem das dezenas de milhões, especialmente em África, as pragas de gafanhotos e outros insectos sucedem-se em cada vez maior volume e voracidade...
E Angola?
Angola vive um drama comum a outros países, desde logo aqueles que têm economias mais dependentes das exportações de crude.
Se por um lado, é um dos países onde os efeitos das alterações climáticas são mais visíveis, como é o caso do sul do País, devido às cada vez mais prolongadas secas, com génese ancestral mas também por causa de fenómenos bem conhecidos como o El Nino e La Nina, que são consequências directas do aquecimento global.
Por outro lado, a produção de crude é ainda essencial para a sua economia, visto que o petróleo representa mais de 94% das exportações, 60% das despesas diárias do Estado e mais de 30% do PIB.
Apesar de a sua produção estar em forte declínio há anos, também pelo desinvestimento das "majors", forçado em parte pelo problema climático, o actual contexto mundial é propício a que a pronunciada escassez de crude nos mercados mantenha os preços em alta por mais tempo, beneficiando assim as contas nacionais e compense a diminuição da produção, que está actualmente próximo dos 1,1 milhões de barris por dia (mbps), quando ainda há cerca de uma década estava claramente acima de 1,7 mbpd.
Até porque, só este ano, o Governo, que elaborou o OGE 2021 tendo como preço médio de referência para o barril os 39 USD, conta actualmente, que este está a 86, com uma folga de 47 dólares norte-americanos.
O próprio Presidente da República está consciente de que o ambiente e a sua defesa precisam mais de acção que de palavras, até porque sobre isso, entende João Lourenço, "já se falou bastante".
"São precisas acções concretas, pequenas ou grandes", disse o Presidente da República em declarações aos jornalistas, que no Sábado esteve a plantar mangais junto a Luanda, numa acção de promoção ambiental, essencial para se "salvar a casa comum".
"Este é um problema global e é preciso que cada um contribua não perdermos a nossa casa comum, que é o planeta", disse ainda João Lourenço.
O Chefe de Estado angolano foi mesmo agraciado, na sua recente deslocação aos EUA, com um prémio internacional de defesa do ambiente atribuído durante a Gala anual da International Conservation Caucus Foundation (ICCF).
Petróleo e futuro são palavras que não rimam
Mas o futuro terá forçosamente de ser sem petróleo como principal combustível do "motor" que impulsiona a economia mundial e isso mesmo parece já ter sido percebido pelo Executivo de João Lourenço, que está a apostar também na criação de energia verde, especialmente através dos mega projectos hídricos mas também com a criação de parques importantes de produção de energia solar.
No futuro, que pode estar mais próximo do que aquilo que os comportamentos individuais e dos países permitem adivinhar, os sacrifícios que vão ser exigidos por ausência de alternativas, e por ser insustentável continuar a queimar perto de 100 milhões de barris de petróleo por dia, serão maiores ou menores em resultado do que for feito já hoje e Angola tem, ao mesmo tempo condições únicas para conseguir alternativas internas, estando a dar sinais contrários, como se depreende dos projectos simultâneos para a construção de três refinarias no País.