Quando, em meados de Março, ajudou uma amiga que estava à procura de sugestões de livros escritos por mulheres, Cíntia Gonçalves estava longe de imaginar que, de uma simples conversa de Facebook, nasceria um projecto que pudesse contribuir para "maior visibilidade do género nas lides literárias".

Baptizada de Letra de Mulher, a iniciativa está, para já, apenas «confinada» às redes sociais, sendo uma página de Facebook que se dedica à disseminação e debate sobre a produção literária feminina em Angola e no resto do mundo.

De acordo com a planificação a que o Novo Jornal teve acesso, todos os meses, a «conversa» girará em torno da obra literária de uma figura feminina. Haverá também casos em que o autor a ser estudado não será necessariamente uma mulher, desde que, entretanto, o conteúdo da obra em análise tenha a mulher no centro das atenções.

Para a «inauguração da casa», foi escolhido o livro A cabeça de Salomé, uma colectânea de mais de 30 crónicas da autoria da historiadora e poetisa angolana Ana Paula Tavares. Por conseguinte, está disponível, na página de Facebook Letra de Mulher, um vídeo em que Cíntia Gonçalves surge a ler um texto escrito pela própria, em que a jovem resume a obra em destaque, dando a possibilidade de os internautas emitirem a sua opinião sobre A cabeça de Salomé.

Está, assim, aberto um debate, que vai durar até finais de Abril, em que os internautas seguidores da página podem interagir, dizendo o que pensam da autora e da respectiva obra, além de igualmente poderem rebater a análise feita por Cíntia Gonçalves.

A página também publica citações e excertos de poemas da autoria de escritoras como a portuguesa Sophia de Mello Breyner.

Universo «muito pobre»

Desafiando o empresariado nacional a apoiar o projecto, com a cedência, por exemplo, de livros e de um espaço para a realização de encontros e reuniões entre os membros do Letra de Mulher, Cíntia Gonçalves não coloca de fora a possibilidade de vir a publicar em livro os textos produzidos sobre as obras analisadas na página. "Seria uma espécie de livro de ensaios", explica.

Porém, enquanto não se chega à fase da compilação dos textos em livro, a jovem, de 24 anos, não esconde a desilusão por ser "muito pobre" o universo literário feminino em Angola. "Temos muito poucas mulheres a escrever", lamenta Cíntia Gonçalves, que entende que o registo de que se queixa é "consequência de factos históricos" por que o género feminino passou.

"As mulheres, durante muito tempo, não foram alfabetizadas e, por consequência do sistema patriarcal, muitas cresceram com o pensamento de que o seu lugar é na cozinha e que o mais importante é encontrarem um marido", comenta, acrescentando que todos estes aspectos contribuem para que as mulheres não vejam a escrita como meio de expressão, o que acaba por afastá-las do campo intelectual.

(Leia este artigo na íntegra na edição semanal do Novo Jornal, que, face ao período excepcional que o País atravessa, é disponibilizada gratuitamente aos seus leitores)

A direcção do Novo Jornal deseja a todos uma boa leitura em http://leitor.novavaga.co.ao/