Em consequência disso, durante 27 anos andámos a ceifar vidas e a legar um fardo pesadíssimo ao país, que ainda hoje se vai ressentindo do tempo perdido e das oportunidades que foram sempre desaproveitadas, por se ter faltado ao diálogo, por um lado, e, por outro, porque a velha máxima de que tudo que nasce torto torno assim será fez lei e continua a seguir-nos em oposição à luz que se acende ao redor do país.
Ainda hoje, 44 anos depois, o 11 de Novembro continua a ser uma data que não reúne os angolanos ao redor da mesma mesa, pelo facto de esta data representar a vitória de uns e a derrota de outros. Mas este é apenas uma parte da questão; a outra é que a parte tida como vencedora não faz qualquer questão de abrir uma porta ao diálogo no sentido de se abordar a independência como um ganho para todos os angolanos.
A independência, e é bastante notável sempre que chegamos a Novembro, acaba por se reflectir em alguns órgãos de comunicação social como uma pedra de arremesso político que visa exaltar os feitos de um único actor, ou de um único protagonista.
Do outro lado, nota-se um claro desinteresse por parte de outros protagonistas que, além de politicamente não se reverem no "feito" de um único actor da história de Angola, também não esboçam qualquer vontade de virem a constituir uma plataforma de diálogo que possa ultrapassar essas diferenças e virmos a celebrar uma data da independência de Angola como um país unido.
Infelizmente, todo esse processo que vai culminar na independência nunca foi inclusivo, porque teve sempre no centro das atenções a necessidade de se querer ser o primeiro e o derradeiro ao mesmo tempo. Principalmente aqueles que tiveram armas em mãos quiseram sempre chegar-se à frente como os únicos e legítimos defensores da causa angolana.
E a agravar a situação, Portugal, quando decidiu dialogar viu apenas três interlocutores, ignorando a sociedade civil e intelectual que era igualmente protagonista do combate político de afirmação que se vai travar dentro do território angolano, com os meios e actores que não sabiam nem nunca pensaram pegar em armas.
Ao se ter transferido o protagonismo da independência de Angola ao poder das armas, quebrou-se toda e qualquer ponte que pudesse aproximar os actores políticos angolanos. E fez ainda pior: permitiu que qualquer um deles encontrasse legitimidade para se defender e atacar quando assim o entendesse. É assim que, pelo mesmo poder das armas, se viu nascer um país e se viu ressurgir depois um conflito armado que alimenta ainda até hoje grandes diferenças.
Prova de que esta situação da independência em Angola é ainda uma vitória de uns e a derrota de outros é que não houve ainda quem com maturidade política chamasse a atenção do país de que não houve um único actor, mas sim actores, e nem todos eles tiveram de ir às matas pegar em armas. E não é de todo correcto que se queira apenas exaltar os feitos da guerrilha e pôr de parte a clandestinidade e a luta que já se tratava no plano cívico-intelectual, ainda que os resultados não tivessem sido aqueles que muitos viram quando decidiram pegar em armas.
Agora é nosso entendimento que esta ainda não é de facto a independência que os angolanos almejam ter em seus corações. Talvez um dia seja necessária reflectir sobre esta data que continua a dividir-nos e, com inteligência e espírito de abertura, pensar-se se não é chegada a hora de pensarmos numa independência de facto. Uma independência que não seja apenas aquela proclamada por um único actor. Mas uma independência que reflicta as nossas aspirações como um corpo comum.
Angola precisa de se fazer à estrada do desenvolvimento diluindo ao máximo as diferenças políticas que a condenaram ao fracasso durante 27 anos. É preciso que acordemos para o amanhã e façamos da nossa terra um poleiro para a vida!