A OMM, agência da ONU para as questões meteorológicas, criada em 1950 e que reúne alguns dos mais respeitados meteorologistas dos 191 países que a compõem, analisou os dados actuais do clima planetário e conclui existir uma probabilidade de 70 por cento para que as consequências do El Niño se voltem a fazer sentir este ano.

O El Niño é resultado do aquecimento das águas do Oceano Pacífico que, por sua vez, geram correntes quentes que se dirigem para vários pontos do globo, alterando a direcção dos ventos e gerando, na sua passagem, fenómenos localizados de intensas secas, como é, usualmente, o caso da África Austral, mas também de chuvas intensas, com cheias e tempestades destruidoras.

Em alguns países do sul do continente africano, este fenómeno meteorológico produziu uma das mais dramáticas secas em mais de um século, como é o caso da África do Sul, com a destruição da agricultura local, a falta de água em cidades como Cape Town, mas também nos vizinhos Namíbia, Botsuana, Moçambique e no sul de Angola, obrigando os governos respectivos a criar programas de ajuda extraordinários ou a declarar o estado de emergência.

No sul de Angola, como o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação dos Assuntos Humanitários, também por causa das alterações climáticas e, muto em especial, do El Niño, tem divulgado, existem mais de 750 mil pessoas com carências alimentares, de água potável ou por causa de doenças favorecidas por situações de penúria, com cerca de 400 mil crianças a necessitar de ajuda permanente, incluindo dezenas de milhar em situação de emergência.

Apesar de nos últimos meses a situação ter melhorado em toda a extensão sul do continente africano, de acordo com o mais recente estudo da OMM, a partir de Outubro existe 70 por cento de possibilidades de se assistir a um novo agravamento da situação.

Recorde-se que entre 2015 e 2016 o mundo assistiu a uma das mais intensas e impactantes "viagens" do El Niño, produzindo catástrofes em série, sejam secas no continente africano, sejam tempestades em algumas regiões da Ásia e das Américas.

Segundo Petteri Taalas, secretário-geral da OMM, este regresso do El Niño não deverá ser de intensidade semelhante ao que ocorreu há três anos, mas "ainda assim irá provocar um impacto considerável".

Este responsável adiantou, citado pelas agências, que as alterações climáticas como um todo estão a provocar alterações ao comportamento do El Niño, mas também no fenómeno "primo" denominado La Niña, cujas dinâmicas são agora mais imprevisíveis e, nesse seguimento, também os seus resultados e impactos nas vidas das pessoas.

O La Niña opõe-se ao El Niño pela forma como evolui, resultando, não do aumento mas sim da diminuição da temperatura das águas do Pacífico, provocando, todavia, alterações em todo o mundo igualmente graves, nomeadamente nos padrões da pluviosidade e na temperatura de vastas áreas do planeta e que, segundo a OMM já está a suceder este ano.

Um dos riscos das alterações climáticas continuarem sem travão, por causa da poluição, nomeadamente dos gases com efeito de estufa e da queima de hidrocarbonetos (petróleo e gás), é que tanto O La Niña como El Niño deixem de ser fenómenos sazonais para emergirem como situações permanentes, com consequências catastróficas para a humanidade.

SADC lança alerta e pede decisões rápidas e eficazes

Face a estes riscos, recorde-se, e no que mais importa especificamente para Angola, a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral, através do seu Departamento de Alimentação, Agricultura e Recursos Naturais, lançou um alerta onde pede aos países membros para providenciarem no sentido de criar stocks alimentares para ocorrer a emergências criadas pela estiagem na estão das chuvas que se aproxima, e por causa dos esperados efeitos na produção agrícola.

Domingos Gove, o moçambicano que dirige este departamento da SADC, (FANR, na sigla em inglês) desde Abril deste ano, lembrou, numa conferência de imprensa em Windoek, capital da Namíbia, que a próxima estação das chuvas deverá ser, mais uma vez, escassa para as necessidades agrícolas.

A África Austral vive há vários anos uma situação de prolongada seca, com picos de seca extrema em vários países, onde, por exemplo, na Namíbia ou na África do Sul, levou os respectivos governos a tomarem medidas extremas para controlar os efeitos nefastos da falta de chuva, declarando situações de calamidade e impondo regras restritivas ao consumo de água.

Por isso, Domingos Gove, no início do passado mês de Agosto, apelou aos agricultores da África Austral para que procurem encontrar forma de manter em stock parte das colheitas da última campanha agrícola, não vendendo a sua produção, como forma de fazer frente às dificuldades que se avizinham, perspectivadas pelas análises dos especialistas à evolução do El Nino e da La Nina.

Este alerta foi lançado numa conferência realizada na capital da Namíbia dedicada ao tema da segurança alimentar na região austral do continente, onde Gove afirmou que os efeitos negativos da seca sobre as colheitas já são um facto há vários anos, sublinhando, no entanto, que se prevê um agravamento da situação para a próxima estação das chuvas.

Só a título de exemplo, Gove lembrou que na última colheita, os grandes produtores de milho austrais, como a Zâmbia e a África do Sul, registaram uma acentuada diminuição da produção, entre 23 e 34 por cento, respectivamente.

Apesar de considerar que actualmente a situação da segurança alimentar não suscita grandes preocupações, Domingos Gove admitiu que nas regiões de maior exposição aos efeitos de La Nina, como a Namíbia, o Zimbabué, Zâmbia, Lesoto, Malawi ou Moçambique, devem ser tomadas sérias medidas preventivas urgentes.